por Roberto Goldkorn
Quando era bem mais jovem adorava escrever poemas. Meu tema preferido? O amor. Escrevia como quem produzia tijolos em série.
Um dia resolvi mostrar alguns dos meus poemas para minha professora, que era também minha mentora e musa: Samira Mesquita. Ela leu com a maior atenção, semblante sério demonstrando respeito para com a “produção literária” de um moleque de quinze anos. Quando acabou, ela disse com serenidade, mas com uma firmeza de rocha granítica: “Roberto como o amor é um tema universal e atemporal, e é um sentimento muito poderoso que gera outros sentimentos tão poderosos quanto, ele já foi tratado por milhares de poetas ao longo da História humana. Dificilmente alguém poderá expressar em poesia algo que ja não tenha sido dito. Portanto se quer originalidade, escolha temas menos visitados. Deixe o amor descansar um pouco até que você tenha mais maturidade técnica. Aí poderá fazer algo diferente, que não passe a sensação de que já lemos isso em algum lugar.”
Foi sem dúvida o melhor e mais sábio conselho que já recebi na minha vida e que guardo até hoje para aplicar em tudo sobre o que me debruço.
Toda essa introdução é para falar das cataratas de dicas, frases de efeito, conselhos, pitacos e coisas assim que lemos todos os dias nas redes sociais, sobre como é o amor ou o que deveria ser o amor. Desgraçadamente conheço algumas das pessoas que postam essas pérolas de almanaque nos Facebooks da vida, e posso garantir que a vida amorosa delas é desastrosa.
Você pode dizer em defesa dessas pessoas que talvez o que não sirva para elas pode ser útil para alguém, pode ser. O que eu acho é que copiar e colar frases lapidares sobre o amor, como ele deve ou não deve ser, justamente por quem está de costas para o amor é, além de hipócrita, perigoso para o autor dessas façanhas. Da mesma forma que muita gente vai ser terapeuta para poder tratar a sua neurose nos outros, os arautos de sites de relacionamento podem acabar tendo uma sensação absolutamente falsa de que estão no comando da arte de amar.
De tanto tentar “ensinar” ao respeitável público em conta-gotas, como se faz o verdadeiro amor, eles se alimentam de “calorias vazias”. Exatamente como as tartarugas que morrem de inanição no mar porque seu estômago manda uma mensagem para o cérebro dizendo que está saciado, só não diz que é de pedaços de plástico, isopor, madeira e outras porcarias que ela abocanha porque fazemos do mar nossa lixeira universal.
Capturar e postar frases de poetas, pensadores, cientistas ou chutadores sobre o amor é se alimentar de plástico. É tentar de alguma forma iludir uma necessidade real de buscar não só entender, mas principalmente, se abrir responsavelmente para esse sentimento universal e atemporal. É a mesma coisa que se reunir e, junto com um monte de gente bem intencionada abraçar, a Lagoa Rodrigo de Freitas no Rio num protesto “pacífico” contra a violência. Não só é absolutamente inócuo, improdutivo, como (pior dos males) leva as pessoas ativistas a irem para casa com a reconfortante sensação do dever cumprido.
Muitas dessas pessoas depois do ato militante, vão para as ruas e cometem pequenos pecados; esses sim podem alimentar a violência. Exatamente como nos postadores de textos da arte de amar.
Conheço um rapaz que vive postando esse tipo de “informação”, quem o vê de fora pode até achar que ele é um guru do amor, mas ele é o antiamor. Sofre de ciúme patológico, inseguro que beira à insanidade. Isso o leva a colocar programas espiões nos computadores de suas namoradas, escarafunchar seus celulares em busca de possíveis “traições” e a perder horas de sono bolando sistemas de defesa que o protegerão das desilusões amorosas. Mas de Vinícius de Moraes a Charles Chaplin, passando por Spinoza e Kant ele “sabe” tudo de amor.
Por que é tão difícil entender e escrever sobre o amor?
Porque o amor é uma ciência. Mas é também uma arte. É um sentimento universal. Mas também se desenha em cada coração amoroso, portanto é uma experiência única e intransferível da pessoalidade. Mandar na lata: “Siga o seu coração!” Pode soar muito poético e romântico, mas pode ser um desastre para a “Shirley” que precisa usar a mente/lucidez/raciocínio para descobrir que está prestes a dormir com o inimigo.
Escrever alguma coisa sobre o amor que não tenha a redundância medíocre das letras de pagode é uma tarefa para raros. Portanto, sugiro aos poetas e filósofos de terceira mão que se concentrem mais em pintar e aperfeiçoar o autorretrato de seu Coração Amoroso. Mais vale “arrumar a casa” para aguardar o grande amor do que ficar engarrafando fumaça falando dele.