por Roberto Goldkorn
Há alguns dias os noticiários ganharam um prato cheio – um piloto da American Airlines, contrariado por ter de se identificar para as autoridades de um paiszinho (quem esse guys estão pensando que são, americanos?), fez um gesto obsceno! O mesmo gesto repetido milhares de vezes pelos nossos motoristas, e até jogadores de futebol, com o dedo médio em riste, cheio de significados ofensivos, ocultos mas bem compreendidos.
Uma nação inteira se indignou por causa daquele dedo, que nem era muito grosso, nem dedo de pianista, mas um dedo é sempre um dedo, principalmente se ele for de um yanque. Mas e se tivessem sido dois dedos num V de vitória? Ou um punho fechado como os atletas negros no pódio numa Olimpíada do milênio passado? Ou o antebraço flexionado contra o outro, no que nós chamamos de "banana"?
Os gestos são o que os lingüistas chamam de linguagem pré-verbal, e os místicos orientais de Mudras. Tanto para uns como para outros, os gestos estão revestidos de grande poder justamente por suas características pré-verbais e, portanto, universalizantes. Dizem os comunicólogos, baseados num ditado oriental, que uma imagem vale mais que mil palavras. O gesto por ser uma imagem produzida pela linguagem corporal, tem um poder que muitas vezes é absolutamente ignorado, como pôde comprovar o piloto americano.
Essa linguagem minimalizada, é poderosa porque é concentrada, compactada, efêmera, um flash de informação que precisa ser captada imediatamente, pois logo será desfeita. Na magia ritualística, há fórmulas para se caminhar no recinto em que os pés tentam reproduzir sinais, ou letras, os braços, as mãos e os dedos se posicionam fazendo desenhos de letras cabalísticas, ou símbolos herméticos.
Nas minhas orações, por exemplo, as palavras são acompanhadas por gestos correspondentes, para enfatizá-las e ampliar o seu alcance. Os Yogues indianos conhecem bem o poder dos gestos, e o Mudra Yoga, tem dezenas de posições feitas com a mão e os dedos, que são contrações de conceitos inteiros, de recados para o "astral" e para o próprio inconsciente. Mas em geral usamos mal, esse potencial gestual, parecemos crianças deslumbradas com a nossa língua tão flexível quanto afiada, que esquecemos que temos outras "línguas".
Parecemos crianças que aprendem a falar palavrões em línguas estrangeiras, mas paramos nisso. Nossa linguagem corporal está cheia de gestos involuntários que expressam sentimentos e emoções, mas são poucos os gestos de força, voluntariamente "desenhados" para expressar ou reforçar nossas vontades conscientes. Mas há um baú de fantásticas possibilidades.
Fazer o gesto de adeus com as mãos, para "despedir" pessoas que não queremos por perto, ou ao contrário, fazer o gesto de chamamento para pessoas que queremos junto de nós. Estender a mão espalmada para frente, naquele famoso gesto de "vade retro satanás" para deter ou paralisar alguém. Imaginar as pessoas a quem se ama, sendo abraçadas (e protegidas) reforçando com o gesto do abraço envolvente, ou fazer o gesto de pisar e repisar as pessoas que nos querem mal, esmagando-as com a sola do nosso sapato contra o chão aonde elas devem ficar, também é poderoso.
Os gestos são movimentos arquetípicos, muito antigos, e em sua maioria universais. As variações culturais nem sempre são tão particularizadas que não possam ser entendidas por culturas diferentes. Quando vimos pela TV os iraquianos, dando chineladas nas estátuas de Sadan Hussein, sorrimos, mas mesmo não tendo esse gesto "mágico" em nosso acervo, compreendemos perfeitamente o seu significado.
Dizem que as "palavras o vento leva", (na verdade leva e espalha, divulga, dissemina), mas os gestos são fotografias, instantâneos, levados a velocidade da luz para outras mentes e corações.