por Roberto Goldkorn
O Juca wp_posts contava a seguinte piada no seu show nos anos 70.
"Um programa do governo militar estabelecia um prêmio para quem denunciasse comunistas. Era assim: se você conhecesse um comunista ganhava um fusca de prêmio pela denúncia. Se conhecesse dois ganhava dois fuscas, se conhecesse três, três fuscas, se conhecesse quatro, quatro fuscas, se conhecesse cinco … bem … aí você ia em cana porque conhecia comunistas demais."
Todos riam e alguns por conhecerem comunistas demais riam de nervoso porque sabiam que o bicho pegava naqueles tempos.
Mas não quero falar de política, nem de coisas passadas e acontecidas. Quero falar de padrões perversos, de esclerose psicológica, mas antes preciso contar outra história essa infelizmente bem real.
Um velho conhecido me ligou recentemente. Já vendo o seu número no identificador me arrepiei todo, sabendo que algo de sinistro viria por aí. Ele fez alguns rodeios até que chegou onde queria. Disse que seu irmão o havia roubado. Senão como explicar o fato dele estar de carro importado? Como explicar esse mistério se o irmão ganhava apenas um salário? Jurei para mim mesmo que nunca mais retrucaria, ou tentaria mostrar-lhe a dimensão do seu delírio com fatos. Isso sempre se mostrou inútil. Pensei em dizer-lhe que durante todos esses anos que nos conhecemos praticamente TODOS que passaram pela vida dele, o roubaram!
Pensei pela quinquagésima vez em tentar chamá-lo à razão, mostrar esse padrão cristalizado e inflexível, que não poderia ter nenhuma base de verdade, e se tivesse a coisa seria bem mais grave. Mas no último instante freei esse jorro de “presta atenção” inútil.
Por que as pessoas são prisioneiras de um script perverso e com ele acabam se casando?
Por que não conseguem perceber, tomar consciência de que estão repetindo um padrão?
E por que alguns ao perceberem, mesmo assim não conseguem entender o que essa linguagem quer dizer, para então desfazer seu enunciado?
São muitas as possibilidades de resposta. No fim das contas que sempre terminam em dízima, resta a pergunta: por que as pessoas não conseguem mudar?
Um das possíveis respostas é: não mudam porque a sua solidão e isolamento não permitem que haja uma “oxigenação” de seus padrões mentais. E quando são poderosas, não mudam porque conseguem impor aos outros a sua cultura engessada e assim não há estímulo para mudar. Nesse ponto existe uma infeliz convergência: tanto o sucesso quanto o fracasso sistemático, realimentam o congelamento desses programas mentais, emocionais.
Crença negativa se realimenta e ganha cada vez mais força
O escritor Alan Deutschman em seu excelente livro Mude ou Morra (Ed. Best Seller) coloca a questão de forma simples e brilhante:
“Pegamos os fatos e os encaixamos nas estruturas mentais que já possuímos. Quando não se encaixam tendemos a questionar se realmente são fatos, ou a desconsiderar as informações e, de algum modo insistir naquilo em que queremos acreditar”. Isso isola o indivíduo, e dentro desse isolamento ele se realimenta daquilo que produz, e produz mais desse material, convencendo-se assim de que: “Assim é porque assim me parece”
Mas isso não ocorre apenas com o meu conhecido psicótico, paranoico, tem muita gente boa marchando nesse passo. Conheço médicos que se negam a acreditar em outras possibilidades terapêuticas (novamente aqui recomendo o Mude ou Morra para esses, embora com pouca esperança de que venham a se arriscar a lê-lo). A sua crença absoluta nos cânones da medicina ocidental é tão absoluta que nada que dissermos poderá dissuadi-los ou persuadi-los a admitir outras possibilidades.
O psicólogo Carl Rogers deu um nome a isso, chamou os arraigados de etnocêntricos – pessoas enraizadas como árvores em suas próprias crenças a ponto de se tornarem imobilizadas. Em geral esse tipo de atitude diante da vida é punido com uma espécie de autoenvenenamento. O padrão adotado e projetado acaba se voltando contra o indivíduo, como um bumerangue que retorna e atinge o seu lançador na cabeça.
A grande ironia desse enigma da esfinge é que a única maneira de derrubar padrões nefastos é substituí-los por outros padrões mais saudáveis, mas ainda assim padrões. Meu antigo mestre dizia: “Todos os hábitos são ruins inclusive os bons”. Mas então o que fazer, já que se é hábito é ruim? Abrir a cabeça e o coração (como disse um autor, abra o seu coração antes que um cardiologista o faça). Assim poderemos ir adaptando nossos hábitos às sempre mutantes manifestações da vida.
Mas buscar decifrar os padrões que se repetem em nossa vida ou por que o bumerangue que atiramos insiste em nos atingir na cabeça (e na mesma região) também é uma alavanca de mudança.
Há um velho ditado que diz: se alguma coisa acontecer a você uma só vez, há uma boa chance de que nunca mais volte a acontecer, mas se acontecer a segunda vez, certamente vai se repetir três, quatro, cinco, etc.
Recentemente bati o carro. Foi a terceira vez em três anos. Exatamente a mesma batida. O carro da frente parado num cruzamento em T. Ele arranca e eu olhando para o outro lado arranco atrás. Ele para. Eu não consigo. O estrago é mais ou menos o mesmo, tanto no meu quanto no do outro carro, e as dificuldades idem. Além de pagar a conta, preciso entender a linguagem do que o padrão quer dizer, para poder mudá-la. Você aí tem alguma ideia?