Resposta: O número de separações durante a quarentena aumentou muito. Pelo menos é o que a mídia noticia. Por que será que isso ocorre? Vamos tentar levantar alguns pontos que nos ajudem a entender por que um convívio mais próximo por muito tempo pode ser comparado ao remédio que cura quando aplicado na medida certa, mas mata quando aplicado em dosagem muito alta.
Casais, em geral, acostumam-se a uma vida em que convivem apenas numa pequena parte do dia. Na maior parte do tempo estão fora de suas casas, nos seus ambientes de trabalho, convivendo com várias pessoas, tendo suas vitórias e suas derrotas pessoais e voltando para casa com suas vivências que dividirão, em parte, com o parceiro(a).
A convivência 24 horas por dia acaba sendo algo que funciona como uma overdose. Qualquer problema que surja será fatalmente compartilhado com o cônjuge, assim como a insegurança do que virá depois dessa fase de pandemia. O clima pesará. E os casais que não estavam tão bem estruturados se fartarão e construirão uma fantasia de que vale a pena arriscar uma vida diferente da que têm vivido; o “lá fora” tomará uma dimensão idealizada e atrairá pessoas como um canto de sereia; estar livre passará a ser o desejo mais comum. Livre para sair à rua, livre de problemas e livre do cônjuge que foi escolhido para compartilhar um tipo de vida diferente da que a pandemia obriga a compartilhar.
Mas será que essas separações se concretizarão mesmo em longo prazo?
Será que chegarão ao término do processo do divórcio? Difícil responder neste momento. Os casais que optam pela separação na quarentena imaginam um “lá fora” que ainda não sabem se corresponderá ao “lá fora” de antes; ficarão sozinhos por um tempo e terão a possibilidade de avaliar se gostam ou não de viver sem uma companhia. Aqueles cônjuges que ficarem sozinhos com os filhos terão a oportunidade de entender como é criar filhos sem a presença cotidiana de uma ajuda. Enfim, é possível que muitos se sintam bem separados, mas muitos entenderão que a “liberdade” é diferente na teoria e na prática. E poderão rever suas posições.
Certamente qualquer casal que resolve se separar na pandemia deveria rever seus conflitos conjugais e tentar entender se a separação é mesmo uma solução. Mesmo com desavenças e fragilidades preexistentes, tomar decisões impulsivas em momento de crise nunca foi e nunca será o melhor a ser feito. Talvez, antes de largar um vínculo que se sustentava, bem ou mal, até alguns meses atrás, o casal poderia tentar conversar mais e, se for o caso, recorrer à ajuda profissional de um terapeuta.
Afinal, se a pandemia não tivesse acontecido, talvez o casal tivesse tempo de amadurecer seu entendimento sobre o que é realidade e o que é sonho num casamento. E poderia optar com mais critérios, mais segurança e mais convicção sobre sua escolha de ficar ou não numa relação. Afinal, toda relação tem seus momentos de desgaste e de reconstrução. Com ou sem pandemia.