Por Renato Miranda – professor da Faculdade de Educação Física da UFJF
No texto anterior (veja aqui) escrevemos a primeira parte sobre a importância do preparo psicológico dos atletas nas diferentes dimensões e exigências do esporte.
É evidente o impacto das habilidades psicológicas no desempenho dos atletas nos diversos níveis de atuação. Seja no âmbito amador ou no nível profissional, as atribuições psicológicas são determinantes quanto às de ordem física.
Em continuação a respeito de minha proposta para uma diretriz de reflexão do treinamento psicológico no desempenho atlético sigo minha orientação com base nas quatro anteriores:
5) O especialista deve ter conhecimento sobre o esporte que ele atua:
Em minha experiência com atletas amadores e profissionais percebo aquilo que mais irrita um atleta; no momento em que ele é submetido a algum treinamento pretensamente dito psicológico o mesmo atleta percebe que aquele profissional que o orienta (ou desorienta?) não entende o mínimo do esporte em questão.
O profissional que orienta o treinamento psicológico deve ter conhecimento especial sobre a modalidade esportiva do atleta a ser treinado.
Em exemplo, em um treinamento psicológico para tenistas é fundamental se ter conhecimento sobre as características técnicas dos golpes, táticas, regras e tudo aquilo que envolve o jogo. Somente assim é possível criar um diálogo e ambiente favorável para a eficácia do treinamento psicológico. Imagine um atleta de tênis descobrir que o treinador psicológico não sabe o que é um “split step”? – aquele pequeno “saltito” (como um “passo dividido” antes da execução de golpes).
6) O especialista deve ter conhecimento sobre treinamento desportivo:
De uma maneira geral o especialista em treinamento psicológico deve ter conhecimento sobre treinamento desportivo, a fim de entender como agir nos diferentes ritmos e fases de treinamento assim como nos diversos períodos de treinamento. Ou seja, ao entender melhor a organização do controle de cargas do treinamento (periodização do treinamento) é possível escolher melhor as estratégias e modelos de treinamento. Por exemplo, em uma semana de treinamento de “microciclo de choque” em que atletas são exigidos ao máximo de suas habilidades é oportuno o treinamento psicológico autógeno de relaxamento, como por exemplo, mindfullness (atenção plena ou profunda para relaxar!).
7) Ampliar o treinamento psicológico aos técnicos e estimular o treinamento autógeno (treino em que o próprio atleta administra e controla seu treinamento) para os atletas:
Ao possibilitar o treinamento das habilidades psicológicas aos técnicos das equipes as chances para se obter um melhor pensar e comportamento dos técnicos aumentam consideravelmente. Afinal, um técnico que mantém, por exemplo, o controle da ansiedade, fica menos aflito e com isso consegue manter em melhor nível os pensamentos para as escolhas táticas. Além disso, quando se estimula o treinamento autógeno, o atleta – antes, durante e depois da competição, por exemplo – facilita seu controle psicoemocional, mobilização e recuperação psicofísica.
8) Habilidades psicológicas melhoram com os demais tipos de treinamento:
O treinamento psicológico é um importante elemento da preparação do atleta. No entanto, sem um bom condicionamento físico, habilidades técnicas desenvolvidas e um preparo tático promissor, o impacto positivo do treinamento psicológico é altamente prejudicado.
Costumo “brincar” com atletas e psicólogos que pretendem trabalhar com esporte ao dizer que o treinamento físico é um excelente treinamento psicológico. E claro, a recíproca é verdadeira! Isso porque para toda experiência física há uma consequência psicológica da mesma forma, para toda experiência psicológica há uma simultânea consequência física. Em exemplo, observe um atleta quando está muito bem preparado fisicamente como o seu nível de motivação é oportuno!
9) Treinamento psicológico faz parte do planejamento da preparação do atleta:
Da mesma forma que um atleta deve ser preparado fisicamente desde o início de um programa de treinamento (fase da preparação do atleta), o mesmo deve ter treinamento psicológico à sua disposição. Portanto, planejamento de preparação do atleta deve conter treino psicológico desde o início da jornada de uma temporada. Da mesma maneira que um treinamento físico para ter êxito precisa de um período considerável de trabalho, considera-se o mesmo para a preparação psicológica.
10) Treinamento psicológico desde a iniciação esportiva:
Avalie a seguinte questão: Como um atleta obtém um ótimo nível técnico? Resposta objetiva: treinando os fundamentos técnicos desde a iniciação esportiva. Assim acontece com as habilidades psicológicas. Quando um atleta treina as habilidades psicológicas desde a infância, suas chances de controlar a mente, administrar o estresse e ansiedade e harmonizar suas emoções, entre outras habilidades serão bem mais promissoras.
Finalmente, podemos dizer que não há fórmula mágica no treinamento psicológico para um melhor desempenho de atletas: conhecimento, dedicação e muito treinamento fazem as coisas acontecerem!