Por Jocelem Salgado
Chineses e egípcios antigos já conheciam os benefícios terapêuticos do cogumelo. Dizia-se que essa planta, sem raiz nem clorofila, “afinava o sangue”, reduzia infecções e até agia como afrodisíaco. Nas últimas décadas, várias pesquisas estão confirmando essas crenças e já se sabe que há pelo menos 30 variedades de cogumelos que teriam benefícios medicinais.
Entre eles, os mais conhecidos, pesquisados e cultivados entre nós são o shiitake e o Agaricus blazei. Carnudos, fritos, bem temperados com azeite, acompanhando carnes, peixes ou massas, ou simplesmente como aperitivo, os cogumelos são de dar água na boca. São dessas iguarias de paladar delicado, que enriquecem qualquer prato e que merecem ser degustadas devagar.
Utilizados como alimentos em todas as eras e culturas, os cogumelos apresentam elevado teor protéico (19 – 35%) e baixo teor de gorduras; contém ainda grandes quantidades de carboidratos e fibras, variando de 51 – 88% e de 4 – 20% (peso seco), respectivamente, para as principais espécies cultivadas. Além disso, o alimento contém quantidades significativas de vitaminas, principalmente tiamina, riboflavina, ácido ascórbico, vitamina D2 , bem como de minerais.
O cogumelo já mereceria aplausos apenas pelo seu sabor e seu valor nutricional, o que já não é pouco. Mas já há muitas pesquisas revelando que o alimento contém substâncias capazes de prevenir e reduzir o risco de certas doenças. Estudos tem demonstrado que certos cogumelos podem agir sobre o sistema imunológico de indivíduos saudáveis e enfermos, trazendo benefícios potenciais para doenças como o câncer, cardiovasculares, infecções e doenças autoimunes como a artrite reumatóide e o lúpus.
Por tudo isso, recentemente os cogumelos têm se tornado atrativos como alimentos funcionais e como uma fonte para o desenvolvimento de medicamentos. O cogumelo Agaricus blazei Murill, por exemplo, tem sido tradicionalmente usado como uma fonte de alimento funcional no Brasil para a prevenção de câncer, diabetes, hiperlipidemias, arteriosclerose e hepatite crônica.
Cogumelos: características gerais
Conhecido entre nós como champignon. O cogumelo é um vegetal que não tem raiz, nem talo, nem folhas, nem clorofila, e que se alimenta de matéria orgânica já existente. É mais frequentemente encontrado aderido à madeira, ao esterco, ao humus.
Conhecido desde tempos primitivos, algumas espécies de cogumelo são venenosas, outras alucinógenas. A grande maioria das espécies são comestíveis, mas as variedades saborosas não passam de 20. Por essas razões, nunca se aventure a recolher cogumelos na natureza, os chamados cogumelos silvestres ou selvagens, a menos que você seja um conhecedor.
É possível comprar os cogumelos frescos, congelados, secos ou em conservas. Quando frescos, algumas variedades podem ser consumidas cruas, mas a grande maioria exige ou fica mais saborosa com o cozimento. A grande vantagem do cogumelo é que ele absorve o sabor dos pratos aos quais é adicionado, o que o torna um ingrediente muito valorizado em diferentes receitas. Vai bem com pratos tão variados como mariscos e pizzas.
Cogumelos: propriedades terapêuticas
Há uma extensa literatura falando dos benefícios desses fungos, especialmente o shiitake, ou Lentinus edodes, e o Agaricus.
O shiitake também é conhecido no ocidente simplesmente como champignon, termo que também é empregado para designar todos os cogumelos comestíveis.
Essa espécie é citada pelos pesquisadores como capaz de reduzir o colesterol, ao lado de uma lista de alimentos que inclui a cevada, o farelo de arroz, a alga marinha, o leite magro e os chás, tanto o verde como o preto.
Essa mesma capacidade também é atribuída ao cogumelo preto asiático, conhecido como mo-er ou “ouvido da árvore”. Essa variedade teria uma grande capacidade de “afinar o sangue”, afastando os coágulos. Entre os orientais, esse cogumelo é conhecido como “tônico da longevidade”. Dale Hammerschmidt, hematologista da Escola de Medicina da Universidade de Minnesota, diz que chegou a observar mudanças importantes nas plaquetas do sangue depois de comer um prato desse cogumelo preto.
Segundo pesquisadores, esse champignon contém vários componentes que “afinam o sangue”, inclusive a adenosina, presente também no alho e na cebola. O médico Hammerschmidt acredita que o grande consumo pelos chineses de alho, cebola, cogumelo preto e gengibre explicaria em parte os baixos índices de doenças coronarianas entre eles.
Mas voltemos ao shiitake, que é um dos cogumelos mais consumidos entre nós. Sua principal propriedade seria uma substância descoberta e batizada de lentinan, e que seria um “modificador para melhor da resposta biológica”. Alguns estudos teriam demonstrado que essa substância aumenta a atividade imunológica contra o câncer.
O lentinan, segundo algumas publicações, teria sido isolado em 1960 pelo dr. Keneth Cochran, da Universidade de Michigan. Seus estudos provaram que o lentinan exibia uma forte atividade estimulante do sistema imunológico.
A partir daí, uma série de estudos vem considerando o lentinan do shiitake uma substância eficaz para aumentar a imunidade do organismo. O lentinan seria capaz de estimular o funcionamento dos macrófagos, o que aumentaria a produção de interleucina 1, uma substância que combate os tumores.
Também seria capaz de ampliar nas células sua atividade citotóxica, de destruir as células cancerígenas. O cogumelo shiitake ainda teria a capacidade de estimular a proliferação de linfócitos T, células auxiliares especiais de proteção, aumentando também a produção de interleucina-2.
Pesquisas realizadas por cientistas da Universidade de Medicina Smmelweis, em Budapeste, Hungria, também consideram o lentinan capaz de modificar as células, aumentando sua resistência à colonização ou à disseminação de células pulmonares cancerosas. Partindo dessa informação, o shiitake pode ajudar o sistema imunológico a combater e prevenir o câncer. Por conta do lentinan, outros estudos mostraram que o shiitake é capaz de combater o vírus da gripe melhor que uma droga antiviral e antigripal.
Pelo mesmo princípio, e como qualquer alimento que estimule o sistema imunológico, o lentinan poderia ajudar no combate às infecções em geral, incluídas aquelas provocadas pelo HIV. Estudo citado em literatura diz que testes de laboratório conduzidos no Japão constataram que o shiitake é tão eficaz contra o HIV quanto o AZT, a primeira das drogas bem-sucedidas contra o Aids.
Tanto na medicina tradicional chinesa, como no resultado de alguns estudos, o shiitake aparece como sendo o tônico da longevidade, remédio para o coração, para o câncer, para a pressão arterial e para a redução das plaquetas sanguíneas aderentes. Na China, o lentinan é usado no tratamento da leucemia. Ingerido diariamente, o cogumelo shiitake fresco (85 gramas) ou seco (10 gramas) seria capaz de diminuir em 7% e 10% o nível de colesterol, respectivamente.
O cogumelo Agaricus blazei também possui a capacidade de melhorar as defesas do organismo. Vários estudos feitos com essa variedade, por pesquisadores japoneses e norte-americanos, encontraram no cogumelo Agaricus blazei componentes que estimulam a produção de novas células de defesa do organismo, tais como as células B, que produzem anticorpos (imunoglobulinas – imunidade humoral); as células T, que atacam as bactérias e vírus diretamente (imunidade celular) e as células natural killers (NK), que atacam qualquer invasão prejudicial, e representam 15% dos glóbulos brancos do sangue. Os principais componentes ativos presentes no fungo seriam os polissacarídeos Beta-D-glucana, o ácido ribonucléico, heteroglucana, xyloglucana, lecitina, etc. Introduzidos nos glóbulos brancos, esses elementos liberariam anticorpos que destroem ou impedem a proliferação de células cancerígenas A presença de esteróides naturais (ergosterol), também é relevante na ação anti-cancerígena.
Alguns estudos mostram também que cogumelos em geral, principalmente aqueles da variedade Agaricus blazei auxiliariam no controle da pressão arterial, do colesterol e da arteriosclerose pela sua riqueza em fibras e gorduras não saturadas. A espécie blazei também seria rica em vitaminas B1 e B2, além de apresentar grandes quantidades de ergosterol que pode ser convertido em vitamina D2 quando seco ao sol ou desidratado.
Cogumelos: últimas considerações
A busca por substâncias ou métodos que aumentem ou potencializem o sistema imunológico, de forma a induzir uma resistência sem causar efeitos colaterais deletérios ao organismo, tem sido uma das mais importantes buscas da ciência na cura contra o câncer e outras doenças debilitantes.
Diante dos possíveis efeitos benéficos proporcionados pelos cogumelos, especialmente as espécies Lentinus edodes (shiitake) e Agaricus blazei, fica evidenciado a importância de mais pesquisas experimentais e clínicas com esses alimentos, com o objetivo de elucidar de forma mais precisa o papel desses cogumelos como agentes preventivos e curativos.
A história do cogumelo
O cogumelo tem uma longa história. Alguns estudiosos registram vestígios desse fungo num período que vai de 3.000 a 7.000 anos atrás. Na América anterior à descoberta, “cogumelos mágicos” eram empregados em cerimônias religiosas, por suas propriedades alucinógenas.
Por sua capacidade de brotar rapidamente da madeira apodrecida ou do esterco dos animais, os antigos viam no cogumelo um sinal religioso. Os egípcios acreditavam que os cogumelos eram oferenda do Deus Osíris. Os romanos pensavam que os cogumelos eram resultados dos raios lançados sobre a terra por Júpiter, durante as tempestades, o que explicaria sua “aparição mágica”.
Entre os chineses, os cogumelos eram procurados nas matas para serem empregados com fins medicinais há 3.000 anos. Até 40 anos atrás, o consumo de cogumelo ainda se limitava à colheita das espécies silvestres. No mercado, custavam caro e só eram encontrados em casas especializadas.
Hoje é bem diferente. O número de plantadores cresceu muito, o preço ficou acessível e os cogumelos podem ser encontrados nas feiras e supermercados. Quem quiser aprender a cultivá-los, basta procurar sites na internet.
O aumento da produção e do consumo veio na esteira das pesquisas. Não por acaso, foram os japoneses que mais pesquisaram os cogumelos, e são eles os maiores consumidores e defensores dos seus benefícios. Estima-se que já existam mais de 30 tipos de cogumelos catalogados como tendo propriedades terapêuticas. As espécies mais consumidas e pesquisadas, e mais conhecidas entre nós são o shiitake, o Agaricus blazei e o reishi.