por Jocelem Salgado
Importantes estudos científicos têm apontado diversos componentes bioativos e nutrientes presentes em alguns alimentos, com propriedades para reduzir o risco de certas doenças e melhorar a qualidade de vida das pessoas.
As pesquisas demonstram que o consumo regular de fibras, antioxidantes, ácidos graxos ômega-3, entre outras substâncias, associado a uma dieta balanceada, com baixo teor de gorduras e calorias, é capaz de manter o peso adequado e prevenir contra doenças cardiovasculares, diabetes e até mesmo o câncer.
Dentre os alimentos que estão sendo investigados, a linhaça tem se destacado por apresentar várias evidências científicas acerca de seus benefícios para a saúde.
A semente de linhaça (Linun usitatissinum) pertence à família das Lináceas e é obtida a partir do linho, uma das plantas mais antigas da humanidade. Apesar de seu consumo ser relativamente novo na atualidade, existe indícios de sua utilização desde 5.000 A.C. na Mesopotâmia.
Hoje, o Canadá lidera a produção mundial dessa semente, sendo responsável por 80% das cerca de 2 milhões de toneladas lançadas anualmente no mercado. A China e os Estados Unidos vêm em seguida, enquanto que o Brasil apresenta uma produção ainda pequena.
Semente de linhaça dourada e marrom
Existem dois tipos de semente de linhaça: a dourada e a marrom. Não existem diferenças na composição dos dois tipos, já que as duas são compostas pelos mesmos nutrientes e mantêm o mesmo potencial funcional. Contudo, acredita-se que a variedade marrom, cultivada principalmente em regiões de clima quente e úmido como no Brasil, apresente uma casca mais resistente que a variedade dourada, plantada em regiões frias como no Canadá. Além disso, a forma de cultivo pode ser fator de diferenciação: enquanto a dourada geralmente é cultivada de forma orgânica e apresenta um sabor geralmente mais suave, a variedade marrom frequentemente exige o uso de agrotóxicos e apresenta sabor mais forte.
Presença de nutrientes funcionais
A semente de linhaça tem se destacado como um alimento funcional, uma vez que apresenta alguns nutrientes específicos que podem trazer diversos benefícios à saúde. Fonte de ácidos graxos ômega 3 e 6, a linhaça também é rica em minerais, vitaminas, fibras e lignanas, compostos associados às fibras.
A semente contém cerca de 37 a 42% de gordura em sua composição, sendo que aproximadamente 70% são do tipo poliinsaturada, composta especialmente pelos ácidos graxos ômega 3 e 6, dois tipos de gorduras essenciais que não podem ser produzidas pelo organismo.
Cerca de 57% do conteúdo de ácidos graxos da semente é composto pelo ácido alfa-linolênico (ALA), um ácido graxo ômega 3 que é essencial para o funcionamento das células. Os estudos mostram que esse ácido graxo auxilia no controle dos níveis de triglicérides e colesterol, além de favorecer a diminuição da inflamação e reduzir a agregação plaquetária, tornando o sangue mais fluído e evitando a formação de trombos. Dessa forma, o consumo regular de linhaça contribuiria para a prevenção de doenças cardiovasculares e a melhora da qualidade de vida das pessoas em geral.
Rica em carboidratos complexos, a presença das fibras (27g para cada 100g) é outro ponto positivo da semente, que apresenta baixo índice glicêmico. A excelente quantidade e a boa proporção entre as frações de fibras solúveis e insolúveis, auxiliam na diminuição do colesterol, no controle da glicemia e no bom funcionamento do intestino. Além disso, as fibras em geral têm sido associadas a outras funções no organismo, como a promoção da saciedade e controle da ingestão alimentar.
Finalmente, um outro componente importante da linhaça são as lignanas, compostos que dão origem no trato intestinal a duas lignanas mamíferas: o enterodiol e seu produto oxidado, a enterolactona. Essas duas substâncias, que se formam da ação bacteriana sobre a lignana vegetal da linhaça, são estruturalmente similares tanto aos estrogênios sintéticos como aos de ocorrência natural e parecem possuir atividades estrogênicas fracas e antiestrogênicas, podendo desempenhar resultados positivos para constipação, no tratamento da tensão pré-menstrual, na menopausa e na prevenção de cânceres dependentes de estrogênios. Contudo, mais estudos nessa área são necessários para se comprovar esses efeitos.
Estudos clínicos na área cardiovascular
Como vimos, a linhaça é uma rica fonte de compostos com grande potencial para modular o risco cardiovascular. Vários estudos têm sido conduzidos com o objetivo de avaliar os efeitos do consumo desse alimento sobre marcadores de risco em pessoas hipercolesterolêmicas e a conclusão de grande parte deles é que o alimento, preferencialmente moído, em forma de farinha, reduz o risco de doenças cardiovasculares, principalmente por diminuir os níveis de LDL-colesterol, colesterol total e marcadores de inflamação como a proteína C reativa (PCR).
Uma pesquisa1 com 62 pessoas com LDL-colesterol entre 130-200 mg/dl avaliou o consumo de linhaça moída sobre alguns marcadores de risco cardiovascular durante dez semanas. O grupo que consumiu 40g de linhaça todos os dias teve o LDL-colesterol reduzido em 13% na quinta semana do estudo e 7% no final das dez semanas. Houve também uma redução da lipoproteína A (14%) e da taxa de resistência à insulina (23,7%).
Resultado semelhante ocorreu em um outro estudo2 com 55 mulheres na menopausa. A suplementação com linhaça diminuiu o colesterol total e o LDL- colesterol em aproximadamente 7 e 10%, respectivamente.
O consumo de linhaça já foi comparado também com o uso de estatinas. Uma pesquisa3 com 40 pessoas com colesterol plasmático maior que 240mg/dl comparou 3 tipos de tratamentos: o primeiro era composto de uma dieta equilibrada, adequada para pessoas com hiperlipidemia; o segundo envolvia dieta + estatinas; o terceiro tratamento empregou dieta + 20g de linhaça moída por dia. Após dois meses de estudo, os autores concluíram que o grupo que utilizou linhaça apresentou resultados semelhantes ao grupo com estatinas. Houve reduções significantes para o colesterol (17,2%), LDL-colesterol (3,9%), triglicérides (36,3%) e taxa de colesterol/ HDL (33,5%).
Para finalizar, no Brasil, um estudo conduzido no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP4, avaliou o consumo de linhaça em um grupo de 40 pacientes obesos com sinais laboratoriais de inflamação. O consumo de 30g de linhaça ao dia reduziu os valores de proteína C reativa (PCR) e seroamilóide A (SAA), dois marcadores de inflamação. Uma análise estatística revelou correlação significativa entre os valores iniciais desses dois marcadores e a contagem de leucócitos, assim como com colesterol total, triglicérides e outras frações lipídicas.
Quanto e como consumir
As pesquisas mostram que os benefícios da linhaça se potencializam quando a semente é moída ou triturada, pois como a casca da semente é muito dura, sua digestão é comprometida podendo passar direto pelo trato gastrointestinal, reduzindo a absorção de seus nutrientes. A semente moída (farinha) deve ser mantida sob refrigeração e longe da luz, para evitar a oxidação das gorduras.
Com relação à quantidade ideal de consumo, ainda não existe um consenso. Na maioria dos estudos avaliados, os benefícios foram alcançados com a ingestão média de uma a duas colheres (sopa) de farinha de linhaça ao dia. Para facilitar a adaptação e digestão, recomenda-se que a inclusão da linhaça na alimentação diária seja gradativa.
Por último, é importante ressaltar que algumas propriedades funcionais da linhaça são encontradas na casca e, portanto, não estão presentes quando somente o óleo na forma de cápsulas é ingerido.
Novidades do mercado
Atualmente é possível encontrar no mercado a linhaça sob várias formas. Além das variedades marrom e dourada e das diferentes formas de processamento, integral (semente) ou moída (farinha), a linhaça tem sido utilizada para enriquecer pães em geral, biscoitos, macarrão, barrinhas de cereais, cereais matinais, etc.
Uma boa sugestão é comprar a farinha para ser usada em pratos do dia a dia. Ela pode ser adicionada a saladas de frutas, sopas, mingaus, iogurtes, vitaminados ou usada para compor receitas de bolos, biscoitos, pães e barras de cereais.
Uma novidade recente do mercado e que vai agradar consumidores e médicos preocupados com a saúde do coração dos seus pacientes, é uma farinha dourada enriquecida com um complexo de vitaminas B6, B12 e ácido fólico (LinoMax®). Essas três vitaminas são indicadas para reduzir os níveis de homocisteína, um aminoácido produzido pelo próprio organismo (após a digestão de carnes ou laticínios), que em altos níveis no sangue pode provocar o aumento do risco de coágulos e entupimento das artérias, além de contribuir para a formação de depósitos de gordura nas paredes dos vasos sanguíneos, aumentando sua rigidez e dando origem à chamada aterosclerose.
Do nosso ponto de vista, a ação combinada do ácido alfa-linolênico (ômega 3) + fibras + lignanas + complexo B6, B12 e ácido fólico, presentes nesse alimento, é uma excelente arma de baixo custo na redução do risco das doenças cardiovasculares.
1. Bloedon LT, Balikai S, Chittams J et al. Flaxseed and cardiovascular risk factors: results from a double blind, randomized, controlled clinical trial. J Am Coll Nutr., v.27, n.1, p.65-74, 2008.
2. Patade A, Devareddy L, Lucas EA et al. Flaxseed reduces total and LDL cholesterol concentrations in Native American postmenopausal women. J Women Health., v.17, n. 3, p. 355-66, 2008.
3. Mandasescu S, Mocanu V, Dascalita AM et al. Flaxseed supplementation in hyperlipidemic patients. Rev Med Chir Soc Med Na Iasi., v.109, n3, p.502-6, 2005.
4. Faintuch J, Schmidt VD, Horie LM. Propriedades antiinflamatórias da farinha de linhaça em pacientes obesos. Rev Bras Nutr Clin, v.21, n.4, p.273-7, 2006.