por Renato Miranda
Já escrevi anteriormente sobre fracasso e derrota, mas uma entrevista me fez voltar ao assunto. No dia 13 de abril de 2010 em uma sabatina jornalística o ex-jogador de futebol Zico queixava-se com aquilo que ele chamou de “condenação” por ter perdido um pênalti na Copa do Mundo de 1986. Para muitos a perda daquela cobrança foi determinante para a eliminação do Brasil diante da França, adversário naquela ocasião de nossa seleção.
Zico disse também que o mesmo se passou com o ex-goleiro Barbosa que foi “acusado” de ser o responsável pela derrota do Brasil diante o Uruguai na Copa de 1950.
De fato a Copa do Mundo por ser uma competição que acontece somente a cada quatro anos, é um verdadeiro drama com consequências que marcam a carreira de qualquer jogador de futebol. Portanto, um atleta ser um herói ou vilão basta um lance decisivo. No entanto, penso que o atleta pode ser educado (treinado) para absorver melhor as decepções, embora muitas vezes seja difícil.
Como a avaliação do atleta é pública e reverberada pela mídia de forma intensa, é natural que atletas sofram demasiadamente diante de um fracasso. Assim sendo, é preciso desde a iniciação esportiva preparar as pessoas para assimilar, entender e tirar proveito das derrotas.
A formação de um atleta com elementos que o preparam para enfrentar situações frustrantes, contém basicamente a compreensão da vida: de uma maneira geral é como uma montanha russa; por vezes nós estamos no alto, em outros momentos estaremos embaixo. A metáfora acima pode parecer muito simplista, mas de fato não é, pois atualmente, sobretudo, é propagado pelos vários cantos do mundo que vencer é a única coisa que nos resta. Em consequência, assimilar derrotas virou uma tarefa quase impossível.
A ideia no esporte de associar as derrotas ao fracasso gera um sentimento muito negativo e uma excessiva ansiedade. No entanto, todos nós sabemos que o fracasso faz parte de nossas vidas. Afinal às vezes, mesmo os melhores, cometem erros.
Gosto de um provérbio que diz: “A flecha que atinge o alvo é resultado de cem erros.” Nesse sentido, dois autores chamados *Al Huang e **Lynch nos dão uma grande lição ao citarem o exemplo do comportamento das crianças: “Quando adultos sofrem reveses sérios geralmente consideram-nos motivo suficiente para desistir (…), mas as crianças vão em frente, aprendendo a cada erro. O fracasso é seu mestre.”.
Na verdade o grande desafio de líderes (professores, técnicos etc.) é preparar o atleta para que o mesmo se conscientize que não há nada mais natural do que aceitar o fracasso e aprender com ele a fim de preparar a vitória futura, pois quando encaramos o fracasso como um aprendizado nós remobilizamos nossa energia psicofísica e seguimos em frente.
O paradoxo disso tudo consiste na adaptação positiva daqueles que encaram os possíveis fracassos como algo provável e natural. É nisso que reside a providência de uma mente tranquila perante os desafios e adversidades. Em consequência, o atleta preparado atua com mais harmonia interior e sem medo de errar, portanto com grandes chances de tudo dar certo.
Quando a criança é orientada a não vibrar demais com o sucesso e não ser elogiada em excesso, estamos preparando esse futuro atleta a ser realmente forte e vitorioso. Muitas vezes crianças com grande potencial esportivo sucumbem ainda na tenra idade, pois simplesmente não aprenderam a perder. É preciso amenizar o impacto daquela consagrada expressão que considera o segundo lugar como o primeiro dos perdedores.
A vida esportiva mostra justamente o contrário, na medida em que o tempo passa. Veja quantos atletas olímpicos se orgulham de suas medalhas de prata ou de bronze ao longo do tempo. Costumo dizer que a medalha de prata que fez muita gente sofrer um dia será tirada do armário e mostrada com orgulho.
Todos querem ganhar, mas aqueles que só admitem a vitória irão perder cada vez mais, porque não aprendem a redirecionar sua energia. Tive um professor de psicologia e filosofia que sempre dizia: “O atleta que não sabe perder é um atleta com pés de barro. Pode ser até muito bom, porém fácil de ser derrotado, pois não admite a adversidade.”.
Para finalizar, se nós ensinarmos os jovens a ganhar e perder e, além disso, os mesmos enfrentarem seus sucessos e fracassos com naturalidade, eles perceberão que o esporte não é maior do que a vida. E lá na frente depois da carreira esportiva, perceberão que o mais importante é poder dizer, tal como Johann Cruyff (um dos maiores jogadores de futebol de todos os tempos, que não foi campeão mundial): “Me divertir muito!”.
*Al Huang é um notável filósofo, dançarino, artista performático
**Jerry Lynch: Conhecido especialista internacional no domínio da aplicação da psicologia do esporte e dos últimos 30 anos e psicólogo do esporte para as equipes de universidades como Duke, Maryland, estado de Oregon, e Stanford."