por Roberto Santos
Resposta: O ser humano é um animal social, como muitos outros que o antecederam na escala filogenética. Como nossos primos primatas, nós temos uma necessidade de afiliação. Ou seja, uma necessidade de fazer parte, de ser aceito nos inúmeros grupos que participamos desde nossa mais tenra idade.
O sentimento de pertencer à família parece ser o mais óbvio (excetuando-se as “ovelhas negras”), seguem a essa, a escola, a comunidade, a igreja e, um dia, o ambiente de trabalho.
Também somos, alguns mais do que outros, motivados a buscar o destaque nos grupos que participamos. Disputamos com nossos irmãos, a atenção de nossos pais e a liderança da turminha da escola ou do futebol. Finalmente, encontramos nas imensas pirâmides corporativas o teste final de nossa capacidade de escalar até o topo, por meio de nosso trabalho e, às vezes, outros elementos de natureza menos clara ou tangível.
A forma como nos equipamos ao longo de nossas histórias individuais, com nosso aparato cognitivo e nossa personalidade, vai determinar, em boa parte, nossa capacidade de assimilar conhecimentos, aprender e aplicar novas habilidades e demonstrar atitudes alinhadas às competências definidas pelas organizações como o padrão do que será considerado sucesso.
Não apenas nossas competências técnicas e funcionais, e não apenas as competências relacionadas aos negócios são importantes. As competências interpessoais, como nossa capacidade de trabalhar em equipe, de influenciar, negociar, ouvir, usar de tato e empatia, bem como as competências intrapessoais, como o controle emocional, a capacidade de criar e inovar, o respeito a regras, são alguns dos critérios para outorgar a patente de liderança – o primeiro cargo de chefia é a grande realização daquela necessidade de se destacar dos demais.
Infelizmente, muitos ganham essa promoção mais pela competência técnica, ou por suas habilidades interpessoais do que pelo real potencial de delegar responsabilidades, inspirar e motivar outros a uma visão, dar feedback e coaching para o desenvolvimento dos subordinados. Como diz aquela máxima – perde-se um ótimo técnico e ganha-se um chefe-mala, incompetente.
Ânsia de chegar ao topo fomenta formação de panelas
Na ânsia de escalar ao topo da pirâmide, há profissionais que se especializam em suas competências interpessoais, extrapolando as habilidades essenciais ao trabalho produtivo em equipe, como os citados acima. Eles e elas partem para a adulação crônica dos poderosos e a formação de panelas, de diversos tamanhos, para cozinhar as alianças que apoiarão seus propósitos. Estas panelinhas corporativas têm uma capacidade quase mágica de se transformar em frigideiras quando necessitam fritar opositores.
O dilema de muitos profissionais que entram no mundo corporativo ou que mudam de empresas é “entrar ou não entrar na panela de fulano?” ou “entro na panela do fulano ou do beltrano?”
Para tratar e responder a esse dilema real e sofrido por muitos, podemos recorrer a dois artigos anteriormente publicados neste site – um que tratava do “fio de prumo” (clique aqui) de nossa carreira e outro sobre a diferença entre ser político e ser politiqueiro (clique aqui).
A resposta parece estar num plano apoiado pelo tripé de Valores (“fio de prumo”), Relacionamentos Interpessoais (habilidade política) e Competência Profissional. Este plano pode ser chamado de Credibilidade que será tão sólido quanto fortes e alinhados forem os elementos do tripé.
A Credibilidade baseada fortemente na Competência Profissional pode se sustentar, desde que amparada por valores essenciais de honestidade e ética, especialmente numa carreira técnica ou científica.
Porém, mesmo essa conformação do plano da credibilidade poderá não sustentar o crescimento daqueles que almejam influenciar outras pessoas e menos ainda, aqueles que desejam liderar outros. A carência de habilidades interpessoais e de liderança serão limitantes do crescimento que se aspira.
Por outro ângulo, a Credibilidade baseada em Valores sólidos e aprumados de ética e transparência, se não for reforçada por uma competência profissional, pelo menos num segmento de especialização técnica, não conseguirá sustentar uma carreira, pois não basta se relacionar bem e ser honesto para se conseguir o sucesso.
Outros profissionais se apoiam em sua reconhecida competência profissional e, particularmente, em suas competências interpessoais. Esses se destacam por um doutorado latu-sensu nas ciências e práticas políticas em todas suas interações sociais. Em cada encontro, ainda que casual, com pessoas de poder na organização, eles e elas estão medindo cada palavra, gesto e expressão – geralmente com aquele movimento afirmativo de suas cabeças para tudo que o chefe fala. Extrapolando sua habilidade interpessoal genuína e necessária de saber o que e como falar, usando de inteligência cognitiva e emocional, estas pessoas resvalam para o campo dos politiqueiros.
O terceiro elemento – dos Valores – é o que enfraquece a credibilidade dos politiqueiros, pois eles tendem a conceder facilmente, concordar cegamente, esquecer princípios técnicos, profissionais e até lógicos, visando a ficar bem na foto ao lado dos detentores do poder sobre sua carreira. Uma omissão aqui, uma meia-verdade ali, um elogio falso acolá, e de repente, essas pessoas perdem seu fio de prumo e acabam construindo seu carreira com paredes tortas e fracas.
Esses indivíduos se valem não apenas da bajulação crônica e eficiente de chefes em geral, mas também da formação de panelas corporativas, às quais buscam atrair semelhantes (alguns mais do que outros) incentivados pelas promessas de benefícios mais ou menos tangíveis, de curto a longo prazo. Sua aparente proximidade aos círculos de poder acaba sendo encarada pelos candidatos a fazer parte de panela como expectativas de usufruir dos mesmos benefícios do cozinheiro-chefe.
A credibilidade se fragiliza pela instabilidade do fio de prumo dos valores dessas pessoas, pois as mentiras se desmascaram e os líderes genuínos e sábios não se embevecem com vãos elogios e puxa-saquismos. As vacas de presépio que sempre dizem sim acabam encontrando pela frente um chefe que prefere quem lhes desafia e contesta. Da noite para o dia, o dono da panela, e porque não dizer, o formador de quadrilha, vê desabar seu minguado tripé.
Infelizmente, os mais desavisados membros da panela acabam indo junto esgoto corporativo abaixo.
Por outro lado, o agrupamento social de pessoas que têm interesses e preferências similares é natural e não pode ser confundido com as panelinhas. As pessoas que, por afinidade, desenvolvem relações dentro do ambiente de trabalho que transcendem as paredes corporativas não podem ser confundidas com aqueles politiqueiros.
A diferença está nos valores e nas ações cotidianas.
Esses colocam, como preço para entrar na panela e como moeda de troca nas relações, a disposição e os pactos de se proteger mutuamente e atacar os demais. São useiros e vezeiros de fofocas, maledicências e condenações sem julgamento de quem não compactua com seus pseudovalores – pelo simples fato de não fazerem parte da sua panela. E, por seu princípio antiético, se não entram na panela, vão para a geladeira e mais frequentemente para a frigideira
Resta ainda a expectativa de uma resposta mais clara ao dilema:
Posso sobreviver nas organizações sem fazer parte de nenhuma panela? ou Que panela escolho para me proteger?
Não há resposta fácil a perguntas tão difíceis.
O critério essencial para esses dilemas são:
– os valores de uma consciência tranquila;
– uma coerência com a lógica;
– um embasamento técnico aos posicionamentos que se adota em qualquer caldeirão de demônios;
– fazer parte de happyhours e churrasquinhos aos finais de semana não é em si fazer um pacto com o demônio.
Como agir frente às panelinhas nos encontros da empresa?
O que o fio de prumo dos valores nos recomenda adotar nesses ingênuos encontros sociais é mantermo-nos afastados de fofocas, julgamentos e condenações a frituras sem a presença do “réu”. Procurar trazer outras perspectivas, baseadas em aspectos técnicos e factuais são bons antídotos aos efeitos colaterais das panelas enferrujadas pelo mau-caratismo.
Corremos o risco de não mostrarmos uma adesão cega ao padrão de conduta da panela?
Sem dúvida. Podemos ser alvos de sessões privadas de “subpanelinhas” para julgar o quanto podemos fazer parte da gangue? Sem dúvida! Esta é a escolha que cada um devemos fazer e, como todas as demais, ela traz ônus e bônus.
Para aqueles que acreditam que a paz interior com seus princípios éticos, aliados às competências profissionais e habilidade de relacionamento, é mais importante para apoiar sua credibilidade em sua carreira no longo prazo, a resposta é mais simples e, como o tripé, mais forte e duradoura.