A arte de deixar ir

Por Patrícia Gebrim   

Na aceitação das inúmeras perdas que vivenciamos em vida é que nos preparamos para a transformação maior de nossa existência, o ato final.

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Para morrer bem, é preciso ter vivido bem, de forma fluida. É preciso que tenhamos tido a coragem de nos mover quando nossa alma assim nos inspirasse, é preciso que tenhamos nos desapegado das falsas seguranças, nos transformado.

A melhor preparação para a morte está em aceitarmos a vida em todas as suas nuances. Confiar na vida faz com que possamos também confiar na morte, pois vida e morte, como claro e escuro, são duas polaridades de uma mesma existência.

Praticar o desapego nos permite caminhar livremente sem excesso de bagagem, levando apenas o necessário. Para fazer isso, é necessário que sejamos capazes de abrir mão da nossa necessidade de ter tudo sob controle. Todos nós, em maior ou menor grau, tentamos controlar a vida.

Tentamos controlar as experiências e as pessoas, pois acreditamos que dessa forma podemos evitar o sofrimento, a dor, a perda.

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Ouça, a vida não é algo que possamos controlar. O que quer que você precise vivenciar será atraído em sua direção por sua alma e, queira ou não, você terá que lidar com isso. Muito mais sábio do que desperdiçar sua preciosa energia tentando controlar o que não pode ser controlado, seria utilizá-la para lidar, da melhor maneira, com o que lhe acontece a cada momento.

Quando nos dispomos a confiar na vida, nos libertamos. Paramos de nos agarrar a tudo. Paramos de temer. Paramos de tentar aprisionar ou afastar pessoas. Paramos de nos ocupar do que ainda não aconteceu e deixamos partir o que tiver que ir embora. Nos desapegamos da bagagem mais maléfica que podemos carregar: nossas crenças, falsas e disfuncionais, baseadas no medo, na escassez, na falta de consciência e de amor.

Quando confiamos na vida, não temos medo da morte, seja a morte de um trabalho, de um relacionamento, seja uma mudança de casa, seja a entrega de nosso corpo físico. Quando confiamos na vida sabemos que não existe morte, apenas transformação.

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Muitos se recusam a diminuir suas bagagens e carregam tanto peso que acabam morrendo em vida. Nunca permitem a si mesmos ser quem de verdade são. É triste. Chegam ao fim desta vida exaustos e imersos na súbita consciência de que não há como voltar atrás. Mas não precisa ser assim.

Viva intensamente, consciente de que cada dia é um presente incrível, cheio de oportunidades. Deixe ir o que tiver que ir, solte os controles, morra sempre que necessário, de maneira que vida e morte façam uma aliança tão forte que uma nunca possa existir sem a outra.

Para que possamos viver mantendo a vida, é imprescindível deixar morrer. Quando permitimos que algo se vá, é inevitável que uma parte de nós morra também. É assim que, dolorosamente, nosso ego vai se desfazendo aos poucos.

Mas eis que, do meio da dor da perda, brotam de nós essas inesperadas asas coloridas. As asas de nossa alma liberta, livre das amarras egoicas, pulsando no anseio de novamente voar. Nossa evolução se dá no equilíbrio entre voos e quedas. Não há nada a temer, nada a evitar. Todo luto se transforma nos mais incríveis voos e o desafio de todos nós é o de aprender a confiar.

Extraído do livro de Patrícia Gebrim “Deixe a Selva para os leões – Inspirações para bem viver nos dias de hoje” – para ler capítulo anterior – clique aqui.