por Renato Miranda
A prática esportiva é geralmente instrumento indicado para se obter saúde. Benefícios físicos e psicológicos são considerados tangíveis desde a tenra idade para aquele que pratica esporte.
Independentemente do tipo de esporte, se adequado à pessoa, decerto a mesma terá uma boa saúde. Desenvolvimento físico, cognitivo e emocional, na infância e adolescência, são comprovadamente favorecidos pela prática esportiva, não obstante os diversos objetivos dos praticantes.
Desde que a exigência seja adequada à capacidade psicofísica do jovem, o esporte é considerado uma experiência valiosa para o bem viver.
Decorre que o esporte não é uma atividade incontestável em relação à saúde. Explico: o esporte não impede a entropia do ser humano! Essa é uma frase simples, mas que diz muito. Em resumo deve-se considerar entropia como "desgaste" natural de qualquer sistema que organiza e produz energia por determinado tempo. Portanto, para qualquer sistema que funcione (pense em algum produto ou equipamento que você usa), o desgaste será inevitável.
Ao considerar o ser humano como o mais complexo, funcional e sofisticado sistema existente na face da terra, sua entropia, pode ser controlada, equacionada e diminuída, tal como outro sistema (observe que qualquer equipamento que você adquira com certa sofisticação há instruções -"manual"- para garantir o melhor uso e durabilidade do equipamento), porém com mais elaboração e através comportamentos autônomos.
Nós não nascemos com "manual", mas a ciência cria com o tempo, mecanismos e instruções para retardarmos nossa entropia e com isso viver mais e melhor. Um desses mecanismos é a prática esportiva.
Sendo assim, se o esporte pode ser um instrumento para retardar nossa entropia, ele mesmo, por outro lado, tem seus fatores de desgaste (entropia). Por exemplo, lesões por contato físico, movimentos exacerbados de músculos e articulações e uso exigente de determinada parte do corpo por muito tempo (repetições).
De tal ordem, ao mesmo tempo em que a prática esportiva deveria ser estimulada por toda a vida é importante reconhecer que de acordo com as características e exigências dos tipos variados de esporte os anos de vida adicionam "barreiras" quase que intransponíveis.
Em geral, esportes coletivos e individuais, principalmente os que geram muito contato físico e/ou exigem muitas habilidades físicas (agilidade, velocidade, coordenação, força, flexibilidade etc.) para sua prática, como futebol, handebol, basquetebol (coletivos) e judô, tênis, surfe (individuais) não oferecem muitas possibilidades de alto desempenho para uma prática longeva, principalmente após quarenta anos (profissionais geralmente antes dessa idade), pois a entropia é muito grande.
Esportes individuais que têm na resistência sua principal característica como corrida e natação de longas distâncias parecem oferecer maiores possibilidades de prática segura. Portanto, em uma avaliação geral e não muito rigorosa pode-se dizer que a prática de esportes deveria com o avançar de a idade ser menos exigente tanto física como psicologicamente (no que diz respeito à cognição e emoção). Ao mesmo tempo e gradualmente a pessoa substituir o esporte pelos exercícios físicos ou realizar uma prática esportiva que exija poucas habilidades complexas.
Mesmo admitindo tais ideias, há pessoas que adoram determinado esporte e mesmo por lazer não gostariam de deixá-lo de praticar nunca se fosse possível. Aqui a cultura e a tradição esportiva sustentam esse desejo.
Por isso, no Brasil, por exemplo, você pode encontrar homens acima de 60 anos que ainda jogam futebol (com limites é claro). Mesmo sujeito às lesões articulares, musculares, não param de jogar futebol. Neste caso, o abandono esportivo, se por um lado protege a pessoa fisicamente, por outro a deixa psicologicamente mais fragilizada. Pergunto: vale a pena abandonar o esporte?
Reposta objetiva: difícil ter! Porque se por um lado é possível mediar uma situação para que a pessoa idosa cuide muito de sua alimentação, seja disciplinada em exercícios físicos e fisioterápicos e tenha limites mais rigorosos de desempenho em "seu" futebol, por outro lado, uma lesão mais grave pode não só interromper a atividade como prejudicar o praticante pelo resto da vida (exemplo: fratura grave).
Observe, portanto, que entre a teoria e a prática há uma relação emocional importante da pessoa com o esporte. Cabe a cada uma avaliar o nível de desgaste (entropia física e psicológica) em deixar ou não a prática de esporte com o avançar da idade.
Uma curiosidade para reflexão: quando pergunto aos homens acima de 60 anos quando vão parar de jogar futebol, a resposta é quase unânime: "Até quando tiver forças!".