por Rosa Fonseca
Conheço dezenas de pessoas que odeiam molho branco. Acredito que a impopularidade se deva aos terríveis molhos servidos por aí.
Até eu, que adoro, volto-me contra as gelatinas insossas, incoroles e inodoras disponíveis em buffets e restaurantes que, às vezes, ainda cobram preços salgados
A receita-base de molho branco leva 3 colheres rasas de farinha de trigo e 3 colheres de manteiga para 1 litro de leite. Siga essas dicas e redescubra o molho branco:
1. Sem gosto de farinha – quando cruas, além de serem indigestas, farinhas têm gosto amargo e alcalino. Seus carboidratos são constituídos por longas cadeias de glicose, que só são devidamente quebradas com o calor da cocção. Nesse processo, o amargor dá lugar a um sabor leve e aveludado, quase doce, semelhante ao de uma batata cozida. O primeiro e decisivo passo para ter um molho branco perfeito é: cozinhe a farinha o máximo que der! Para isso, derreta a manteiga em uma panela, adicione a farinha e vá mexendo, em fogo muito baixo. A mistura gerará uma pasta espessa e amarelada, chamada de roux (lê-se rú). Quanto mais tempo cozer, mais maravilhoso será o gosto e a textura do molho. Para bons resultados, cozinhe por pelo menos 10 minutos.
2. Com a cor certa – manteiga carameliza em alta temperatura. Mesmo em fogo brando, com o passar do tempo, fatalmente ficará marrom, exalando um delicioso aroma de nozes. É uma propriedade maravilhosa, aproveitada em pratos nos quais a coloração ou o aroma são bem-vindos. Não é o caso desse molho, que deve ser branco-creme. Por isso, quanto mais suave o calor, mais tempo você cozinhará o roux sem tostar a manteiga. Se ele ficar bege, desligue e mexa para baixar a temperatura. Quem tiver panelas de ferro, esmalte ou fundo triplo, que conservam o calor por mais tempo, deve redobrar a atenção para esfriá-las assim que o roux começar a escurecer. Se simplesmente desligar o fogão e deixar a panela lá, continuará quente por minutos suficientes para levar a receita a cabo. Se o roux estiver passando do ponto, resfrie a panela em água, coloque-a sobre granito ou na geladeira. Outro caminho é substituir manteiga por margarina, menos suscetível ao calor. Mas o aroma da manteiga é imbatível!
3. Sem caroços – uma vez pronto o roux, é hora de adicionar o leite. Para seu molho não ter gosto de água, use leite integral! Se você despejar todo o litro na panela, o roux não se dissolverá de forma homogênea, gerando caroços de farinha difíceis de desmanchar. Para um molho lisinho, despeje o leite bem devagar, mexendo sem parar. Nas primeiras vezes, peça para alguém mexer enquando você põe o leite. Conforme for sendo incorporado, será cada vez menor o risco de empelotar. Por isso, depois do primeiro ¼ de leite, pode despejar o resto mais rápido. Ajuda usar leite gelado se o roux estiver quente e usar leite quente se o roux estiver frio. A diferença térmica retarda a gelatinização e ajuda a não encaroçar. Mas, se em qualquer fase do preparo a mistura encaroçar, use o mixer ou liquidificador para sanar o problema e passe ao passo 4.
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4. Textura certa – o roux engrossará o leite, mas não se surpreenda se levar cerca de 20 minutos. Esse tempo é essencial para completar a cocção da farinha. Se o leite engrossar rápido, acrescente mais líquido para afinar a mistura e continue ao fogo. Molho branco de 2 minutos fica pesado e com gosto de farinha. Lembre-se de mexer de vez em quando: se você esquecer a panela, a mistura vai encaroçar! Para saber se está na textura certa, coloque uma colher no molho e retire. Se logo escorrer da colher, está líquido demais. O ideal é que, se você passar o dedo nas costas da colher, o caminho que ficar sem creme não seja novamente coberto, mas as “bordas” desse caminho fiquem indefinidas em alguns segundos, demonstrando que o creme não virou uma gelatina espessa. Se engrossar demais, acrescente mais líquido e deixe cozinhar um pouco.
5. Sabor ideal – uma das características mais importantes do molho branco é o sabor suave, com um dulçor e a untuosidade leves e tempero delicado. A especiaria mais recomendada aqui é a noz-moscada, com perfume amadeirado excelente para acompanhar ovos e laticínios. Mas use com moderação, ou o molho terá gosto de árvore. Use também um pouco de pimenta do reino branca. Dê preferência aos temperos ralados na hora (ao invés dos vendidos em pó), porque conservam melhor o aroma. E vale dar preferência ao sal marinho. Mas nunca salgue demais um molho branco, mesmo se você gostar de pratos mais salgados, ou seus sabores sutis passarão despercebidos.
Outra forma fantástica de temperar um molho branco é colocar uma cebola média descascada inteira, uma folha de louro e 3 cravos-da-índia para cozinhar junto com leite. Acreditem: isso dá um aroma e sabor deliciosos. Só lembre-se de retirá-los antes de servir. Algumas pessoas usam cebola ralada. Não recomendo, a não ser que deseje fazer um molho de cebola. O mesmo vale para o queijo ralado de pacotinho, que é desidratado antes de ralado para intensificar o sabor. O resultado é que só dá ele no molho. Se quiser adicionar queijo, rale parmesão ou peccorino in natura. Alguns ainda substituem parte da medida de leite da receita por creme de leite. O creme acrescenta corpo e gordura ao creme, mas também calorias. Só com leite, fica mais leve.
6. Combinações favoráveis – apesar de não haver um consenso sobre combinações entre molhos e massa, defendo que, para acompanhar um molho branco, a massa deve ser esplêndida, com sabor e textura muito delicadas. Isso porque, com um molho leve, nenhum “defeito” da massa será minimizado. Ao contrário: ela poderá realmente brilhar, acompanhada do coadjuvante perfeito. Para acompanhar um espaguete de supermercado, prefiro um belíssimo molho de calabresa, bolonhesa ou putanesca. Nesse caso, a massa funciona como uma tela neutra, boa para esses molhos de sabor pronunciado brilharem. O melhor molho branco com espaguete de supermercado será sempre um prato médio. Prefira massas frescas com recheios de ricota, espinafre, nozes, abóbora ou frango.
O que NÃO fazer?
Há quem faça molho branco dissolvendo duas colheres de amido de milho em ½ litro de leite e levando para ferver. Nem cebola, nem creme de leite, nem o melhor parmesão do mundo tornarão esse molho incrível. O retrogosto de farinha sempre estará lá, junto com uma cor branco-dente translúcida pouco apetitosa. Se bem quente, a textura não é tão ofensiva, mas basta começar a amornar, para se transformar em mingau. E ainda tem aqueles que simplesmente aquecem creme de leite com sal. Além de faltar complexidade de sabor e aroma a esse molho, ele fica pesado e enjoativo.