por Ceres Araujo
Crianças estressadas e bebês estressados – algo pouco concebível anos atrás, mas uma realidade nos nossos dias.
Estresse é uma reação normal e desejável do organismo frente a situações muito excitantes ou muito difíceis. O estresse não é uma doença, porém, quando a reação a uma situação estressante é intensa e prolongada, o organismo pode ser debilitado, existindo uma disfunção do sistema imunológico, o que pode determinar o aparecimento de sintomas e doenças.
Durante a vida, desde o nascimento, talvez mesmo antes, o ser humano enfrenta inúmeras situações de estresse, sendo que a capacidade de enfrentamento a essas situações vai aumentando com as experiências de vida e com a maturidade emocional. A capacidade para administrar situações de estresse é muito variável de individuo para indivíduo. Algumas pessoas lidam melhor com eventos estressantes que outras.
Muitas vezes, a capacidade ainda imatura da criança para enfrentar situações de estresse, faz com que ela experimente níveis de tensão muito elevados, durante seu desenvolvimento. Assim, o nascimento de um irmão, a adaptação à escola, mudança de casa, mudança de quem toma conta, doenças, acidentes, que são, contingências normais da vida podem ser vividas como situações estressantes. Cabe, aos adultos, responsáveis pelas crianças, a sensibilidade para perceber quando o estresse é demasiado, quando a tensão é intolerável e quando é necessário ajudar a criança a se tranquilizar.
Em todas as épocas, crescer e viver significa ter que lidar com situações de tensão, de estresse e aprender com elas. Entretanto, nos nossos tempos, observa-se uma incidência mais elevada de estresse em todas as idades, inclusive na infância.
O tipo de atividade infantil de anos atrás era menos gerador de tensão. As crianças tinham menos horários a cumprir, ficavam mais em casa, as formas de brincar eram mais apaziguadoras, etc. Atualmente o estresse provocado pelos riscos da violência urbana, pela poluição ambiental, entre outros males da vida cotidiana, fazem parte da realidade do mundo infantil.
Outro fator importante, como gerador de estresse nas crianças, está ligado diretamente à nossa era tecnológica. No mundo globalizado, cada vez mais se acelera a velocidade da transmissão da informação. As crianças são inundadas de inúmeros estímulos ao mesmo tempo e, pela idade, ainda não desenvolveram uma estrutura mental capaz de adequadamente organizá-los. Como decorrência, elevam-se a excitabilidade e a desorganização interna nas suas mentes. O resultado, em muitos casos, é o estresse para a criança.
Cumpre ressaltar também, como geradores de estresse o excesso de horários e o excesso de obrigações impostos à criança. Na estrutura familiar contemporânea, houve uma sensível diminuição do tempo de interação entre pais e filhos. Pais e mães trabalham muitas horas, as crianças estão indo para a escola cada vez mais jovens.
Se isso traz benefícios reais, pois elas estão se desenvolvendo mais precocemente em todas as áreas – hoje temos "geniozinhos de fraldas" – por outro lado, a rotina de vida diária ficou carregada de horários impostos de forma não natural. A criança é pressionada para se levantar, se vestir, se alimentar e correr para ir à escola ou a atividades extra-escolares, na maioria das vezes, enfrentando o trânsito e o perigo de assalto e sequestro comuns nas nossas cidades. Falta-lhe tempo para brincar pelo prazer de brincar, pois até o brincar está sendo submetido ao render e produzir. Os pais se cobram demais e cobram muito seus filhos. Existem altas expectativas de grandes resultados no empreendimento que se tornou a família na nossa época. Tudo isso é altamente gerador de estresse. Quando os cuidadores das crianças não entendem o que está acontecendo e não as atendem adequadamente, distúrbios físicos e emocionais podem ocorrer.
Marilda Lipp, pioneira nos estudos sobre estresse infantil no Brasil, mostra que uma criança muito poupada não se prepara para o mundo estressante de hoje e, por outro lado, uma criança muito exposta às adversidades, pouco protegida, não terá chance de adquirir, de modo gradual, boas estratégias de enfrentamento.
Seguem aqui, alguns dos principais fatores de risco para elevação do nível de estresse na infância:
– Brigas constantes ou separação dos pais
– Nascimento de irmão
– Doenças, hospitalização
– Doença mental dos pais
– Disciplina confusa por parte dos pais
– Expectativas ou cobranças exageradas por parte dos pais
– Rejeição ou "bullying" por parte de colegas
– Excesso de atividades
– Mudanças constantes de cidade
– Mudanças constantes de escola
Quanto aos fatores de proteção para evitar elevação do nível de estresse na infância, pode-se destacar, entre outros:
– Boa saúde
– Pais atentos e sintonizados às necessidades do filho
– Cuidadores e professores competentes e sensíveis à criança
– Capacidade de tolerância à frustração no esperado para a idade
– Curiosidade e interesse para lidar com situações novas.
Pais estressados têm filhos estressados, assim como professores estressados têm alunos estressados. Aprender exige certo sacrifício, mas aprender precisa ser também algo prazeroso. Pais e professores são as pessoas que apresentam, à criança, o mundo dos relacionamentos e o mundo do conhecimento. Daí a importância deles como modelos adequados para ensinar às crianças a administrar o estresse gerado pelas circunstâncias da vida.