por Pedro Tornaghi
Quando na virada do século XIX para XX Freud criou o conceito de inconsciente, imaginou este como um depositário de memórias de experiências pessoais, muitas delas “mal digeridas” e pouco compreendidas pela pessoa que permaneciam como que guardadas em um poço “secreto” dentro de cada indivíduo.
Segundo ele, esses conteúdos transformam-se com o tempo em uma faixa psíquica latente, composta de desejos e processos psicológicos dinâmicos que atuam sobre o comportamento, mas da qual não se pode dispor livremente, pois escapa à consciência. Elas são excluídas do campo consciente pela censura moral. Com sua descoberta, Freud pôde ajudar muita gente nos primeiros passos rumo ao entendimento do que levava a condição emocional e psíquica de inúmeras pessoas a gerar sofrimentos indesejados.
Um dia Carl Jung, chamado por muito tempo de príncipe herdeiro de Freud, em uma viagem pela Baviera conheceu um camponês que falava javanês antigo, embora nunca tivesse saído do vale onde nascera e não tivesse tido contato com ninguém que falasse a língua. Mais tarde, viajando de trem pela Rússia com um aluno, Jung se surpreendeu com o fato de que esse sabia ler os nomes das estações por onde eles iam passando, todas escritas em alfabeto russo, com o qual esse aluno não tinha tido, até então, nenhum contato direto. A partir dessas duas experiências, Jung criou o conceito de “inconsciente coletivo”, algo que ampliava imensamente a dimensão de inconsciente descrita por Freud. Jung defendeu existir uma espécie de “mente coletiva”, onde inúmeras memórias da experiência humana estão registradas; e entendeu que, em alguns momentos, certas pessoas têm acesso aleatório a parte desses registros.
A partir desse momento, a cultura ocidental passou a admitir a existência de três níveis de consciência: o estado de vigília, o inconsciente individual e o inconsciente coletivo. Na milenar Índia, sempre se falou em sete estados de consciência. Considerando esses três “níveis” como legítimos, os antigos “rishis” – sábios – apontavam ainda para outras dimensões da consciência.
O quarto estado de consciência descrito por eles é o “inconsciente cósmico”. Sim, se para Jung uma grande parte, se não todas, as experiências da humanidade estão registradas em uma mente coletiva, para os rishs indianos existe o que eles chamam de “espaço akáshico”, um campo onde estão registradas todas as experiências do Universo, desde muito antes da humanidade existir. E afirmaram ser possível ao ser humano comum, pela meditação, realizar o feito dos rishis, entrar em contato com esse espaço e fundir sua compreensão pessoal com a sabedoria intrínseca às memórias akáshicas.
Mas a cultura indiana não parou nos diferentes estados de inconsciência, eles falam ainda de três outros estados de uma qualidade diferente, e todos possíveis ao homem: a supraconsciência individual, a supraconsciência coletiva e a supraconsciência cósmica. Sim, segundo eles, podemos expandir os limites de nossa consciência ordinária e experimentar o mergulho nessas novas dimensões da consciência. E, para não ficar na teoria, que não é a característica daquela nação capricorniana, eles criaram métodos para essa realização. Um deles, passa pela compreensão dos chakras.
Pode-se dizer que cada um de nossos sete chakras representa um desses estados de consciência e atua como um embaixador do cosmos, presente, sempre presente em nós. E acessível. Muito mais do que a maioria imagina. Cada um deles é uma porta que, se aberta, nos faculta uma nova dimensão de lucidez.
Primeiro chakra
O primeiro chakra está ligado ao inconsciente cósmico. Se o inconsciente coletivo de Jung se refere às experiências humanas acumuladas, essas, datam de 4 milhões de anos, e são úteis para se decifrar e entender boa parte de nossas atitudes atuais. Mas se a presença humana no planeta acumula 4 milhões de anos, a experiência do Universo passa dos 7 bilhões de anos e, mesmo sem percebermos, muitos de nossos reflexos e atitudes cotidianas repetem padrões de comportamento anteriores à própria humanidade. O inconsciente cósmico traz consigo a memória do primeiro átomo no Universo, do momento em que a primeira partícula de energia, querendo exercer a natureza da energia, que é vibrar e movimentar-se, submetida às leis do espaço, encontrou resistência ao seu movimento. Dessa maneira, ficou gravado no inconsciente cósmico e trazemos em nosso primeiro chakra a sabedoria instintiva de que necessitamos nos movimentar e explorar a vida, mas que toda vez em que fazemos isso, encontramos resistência ao nosso impulso.
Dessa maneira, o medo de ser rejeitado do rapaz que tenta se aproximar de uma morena por quem se sente atraído no ônibus, não vem apenas de sua experiência anterior de rejeições como propunha Freud, nem da memória de quantas vezes isso tem acontecido desde o tempo dos homens da caverna como suporia Jung, mas de um instinto mais profundo e essencial, presente na memória de cada átomo no Universo, de que todo impulso tende a encontrar uma resistência.
A intimidade com o primeiro chakra pode dar à pessoa, entendimento de onde vem certas informações que norteiam reações instintivas extremamente enraizadas nela. E certas meditações de primeiro chakra, podem deixar a pessoa menos “reativa” inconscientemente à vida. Elas podem nos aproximar da compreensão do que é um impulso legítimo de nossa natureza e fazer com que encontremos um caminho em que, sem negar nossa natureza e necessidades, possamos nos desenvolver no mundo em que vivemos, sem estar em constante briga com ele. O aprofundamento no primeiro chakra pode deixar o rapaz no ônibus livre do medo da rejeição.
Segundo chakra
O segundo chakra está ligado ao inconsciente coletivo. É nesse chakra que absorvemos a dor do mendigo miserável por quem passamos na rua e sofremos por ele, mesmo que achemos que não temos nada a ver com a situação em que ele está metido. Dessa maneira, é também ao desenvolvermos nossa relação com esse chakra que podemos começar a diferenciar, de maneira definitiva, quem somos nós e quem são os outros. Podemos descobrir quando agimos em função de realizações e desejos que pressupomos nossos, mas que não nos dizem respeito. É o chakra que nos leva ao processo de individuação de que Jung falou.
Terceiro chakra
O terceiro chakra está vinculado ao inconsciente individual. Por isso talvez se diga que quem tem a energia desse chakra exacerbada, tenda a ser egoísta. Isso acontece não apenas quando o temos exacerbado, mas também inconsciente. Quando o progresso da meditação nos permite lidar diretamente com a energia pura desse chakra, descobrimos o que são nossos impulsos legítimos de desenvolvimento pessoal e o que são apenas aspirações de autoafirmação em movimentos competitivos. Sim, a pessoa que tem esse chakra exacerbado e inconsciente, vive se comparando com as outras e tentando ser melhor que elas; conforme a pessoa vai ficando mais próxima da energia essencial do chakra, passa a querer ser “o melhor ele mesmo” possível, mas nunca melhor que ninguém mais. Isso proporciona a liberdade do sofrimento que Freud tanto buscou com seus pacientes, mas que pareceu impensável de se tornar uma realidade no universo em que ele circulou, da Europa vitoriana.
Quarto chakra
O quarto chakra está ligado ao estado de alerta comum. Por isso, é o chakra mais fácil de ser sentido ou contatado conscientemente por um ser humano que nunca tenha conhecido meditação ou nunca tenha se dedicado ao autoconhecimento. É o chakra do coração e do amor e, como essas são realidades presentes na vida de qualquer um, torna-se mais fácil sentir as vibrações do chakra.
Quinto chakra
O quinto chakra, na garganta, está ligado ao estado de supraconsciência individual. Sim, Freud provavelmente nunca sonhou com a possibilidade de todo o conteúdo do inconsciente individual tornar-se consciente, de alguém ligar a luz em quartos que ele sempre conheceu escuros. A supraconsciência individual é o que o indiano chama de “primeiro samadhi”. E está disponível, teoricamente, a qualquer um que persista no caminho da meditação, sabendo abrir mão – durante o caminho – do que o dispersar deste. O quinto chakra costuma ser chamado de centro da criatividade. Na realidade, ninguém cria nada, mas nesse chakra você entra em contato com a fonte da consciência criativa que está por trás de tudo e passa a poder traduzir para o concreto, formas que antes existiam apenas eu um universo invisível.
Sexto chakra
O sexto chakra, na testa, famoso pela alcunha de “terceira visão”, está ligado ao supraconsciente coletivo. Sim, no quinto chakra você havia alcançado uma lucidez total de si, e aprendido muito bem a diferença entre sua visão de mundo e a dos outros à sua volta. No sexto, você toma consciência de que você e os outros são uma coisa só, você percebe a mesma consciência por trás de você e de todos, e se percebe apenas uma gota na onda que é a humanidade, dentro do oceano cósmico. Sim, você percebe que toda a humanidade em si é nada mais nada menos do que uma onda na dinâmica evolutiva do oceano cósmico, e você, apenas uma gota que “surfa” nessa onda. Nesse momento, você é capaz de saber e entender não apenas o que se passa com você, mas com qualquer pessoa à sua volta. Este é o “segundo samadhi”.
Sétimo chakra
O sétimo chakra está ligado ao inconsciente cósmico. Aqui, deixa de existir a gota, ela se dissolve no oceano, e sua noção de individualidade se evapora. Esse é o terceiro tipo de samadhi, o considerado definitivo por quem medita. Quando esse acontece, você está em contato consciente com cada átomo do Universo, e mesmo com o que não é Universo. Nesse momento, você não se sente mais uno com o outro como aconteceu no sexto chakra. Nesse momento, você não existe mais, o outro não existe mais, o que existe é o todo. Não há mais divisão.