Por Edson Toledo
É comum dizermos naqueles momentos mais acalorados, em que as crianças não têm preocupações, responsabilidades e nem obrigações: que a vida delas é muito boa, pois têm tudo o que precisam.
No entanto, se pararmos para pensar um pouco, a razão nos dirá que não é bem assim.
Problemas familiares e estresse causado pelo excesso de atividades diárias, o uso excessivo de eletrônicos, podemos incluir na lista a cobrança por bom desempenho escolar, estão criando crianças tristes, ansiosas, com problemas de comportamento, atenção, concentração e foco. Esse é o cenário em que se encontram muitos de nossas crianças.
Como a criança de hoje tem muitos estímulos, aulas extras, brinquedos eletrônicos e uso de tecnologias de toda ordem, só para citar alguns, sobra menos tempo para brincar livremente, assim o excesso de estímulos faz com que ela se desconecte de si mesma e entre em um padrão muito acelerado, com competição e ansiedade.
Uma prática que está sendo utilizada com sucesso com as crianças, é a meditação. E ela pode trazer uma série de benefícios como combater o estresse, aliviar a ansiedade, melhorar o sono, reduzir a agressividade, relaxar fisicamente e mentalmente, pode também melhorar a concentração, minimizar os sintomas de transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e ajudar a lidar com sentimentos como frustação, medo e raiva.
Diminuir o ritmo e saber aproveitar os momentos no instante em que eles acontecem são hábitos necessários, mesmo para as crianças – e é aí que o costume de meditar pode colaborar para viver melhor o presente.
Segundo especialistas, ensinar a criança desde pequena a parar, respirar lentamente e profundamente de olhos fechados e observar a respiração, já se mostra extremamente benéfico. O tempo de meditação também é muito importante, pois deve ser breve, proporcional à idade. Uma criança de cinco anos pode meditar cerca de 5 minutos, uma de 10, por volta de 10 minutos, e assim por diante.
Pesquisas indicam que a meditação desenvolve foco, memória, autoestima, reduz estresse e ansiedade, tanto em adultos quanto em crianças. Meditando, a criança pode aprender a respirar com consciência, e isso pode ajudá-la a lidar com mais calma e discernimento as situações de estresse.
O simples ato de respirar lenta e profundamente pode acalmar os pensamentos, estimular o melhor desempenho do córtex pré-frontal, área do cérebro responsável pelo desenvolvimento cognitivo e das funções executivas.
Pesquisa conduzida pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, mostrou benefícios fisiológicos promovidos pela meditação. Com 16 participantes e duração de oito semanas, a pesquisa demonstrou que o exercício meditativo produz mudanças ao longo do tempo na massa cinzenta do cérebro, mais precisamente no hipocampo, conhecido por sua importância para a aprendizagem e memória, além de estruturas relacionadas à autoconsciência, compaixão e introspecção.
Em outras palavras, os praticantes de meditação (e aqui podemos incluir as crianças) possuem a massa branca e cinzenta do cérebro aumentadas; funções cognitivas e executivas passam a serem melhoradas, assim como a memória e têm a capacidade de autorregulação e autocontrole emocional melhoradas, equilibradas.
Outro aspecto a ser considerado, é o ensino de meditação em escolas que têm se mostrado uma ferramenta muito útil. Pesquisa publicada no Developmental Psychology mostrou que a prática de meditação melhorou em 15% o desempenho dos alunos em matemática. Dentre os estudantes, 24% se mostraram menos agressivos e outros 20% se tornaram mais sociáveis.
Outro estudo, realizado pela Fundação David Lynch em escolas das cidades de Los Angeles, Chicago e Nova York, revelou que prática do mindfulness diminuiu em 40% o estresse e aumentou em 25% as notas dos alunos. Além disso, o número de suspensões nessas instituições caiu 86%.
Na Inglaterra, em cinco anos, quatro mil professores foram treinados e, hoje, possuem qualificação para ensinar meditação aos alunos do ensino básico, segundo o Mindfulness School Project.
Exemplo brasileiro
Um exemplo brasileiro é o do colégio Marista Santa Maria (PR) onde a coordenadora da Educação infantil Ana Paula Detzel comentou que a partir de uma turma muito atípica de alunos, que era muito ativa e com falta de concentração, surgiu a ideia da meditação em sala de aula como uma forma de ajudá-los. A meditação acabou se incorporando à grade horária escolar e virou rotina para professores e alunos a partir de 2 anos, devido aos resultados favoráveis à maior concentração e controle emocional.
A meditação coloca a criança em contato com o silêncio, de forma que ela possa observar o fluxo de seus pensamentos e emoções, reconhecendo-os e identificando-os como positivos ou negativos, fazendo com que sua educação emocional seja construída. Dessa forma, além dos benefícios ligados ao aprendizado, foco e memória, a criança torna-se mais consciente, amorosa e pacífica, menos ansiosa e com estresse reduzido.
Meditação infantil: regras básicas:
1 – Não Pode ser uma Obrigação
Primeiramente, a meditação diferente das outras atividades praticadas pela criança como a natação, judô, estudar língua estrangeira (e muito mais), precisa ser algo natural que surge em pequenas ações do dia a dia.
2- Tempo da Meditação
A segunda regra é que a criança deve meditar por pouco tempo, alguns minutos apenas, pois as crianças se distraem com muita facilidade. Uma dica é que para cada ano de vida a criança medite 1 minuto, exemplo, a criança com 5 anos deve meditar 5 minutos, a criança com 10 anos deve meditar 10 minutos, e assim vai progressivamente.
3 – Orientação de Adultos
Ser orientada por um adulto, pelo menos no início, já que trata-se de algo novo para a criança.
Exercícios meditativos
Regras estabelecidas, vejamos agora alguns exercícios meditativos práticos que podem ser feitos com crianças, em casa:
Exercício 1 – Coloque a criança sentada em posição de índio (com as pernas cruzadas). Em seguida, ela deve fechar os olhos e contar de um até dez, o mais lento que conseguir.
Exercício 2 – Sentada de joelhos dobrados e sobre os calcanhares, a criança deve repetir dez vezes a respiração do cachorro cansado, ou seja, com a língua para fora, ela deve imitar um cachorro cansado, fazendo apenas expirações, com contrações abdominais involuntárias.
Exercício 3 – Com os olhos fechados e sentados em posição de índio, fale para ela imaginar que está na praia e repetir seis vezes o som do mar, utilizando a passagem do ar pela garganta e fazendo um barulhinho similar ao som da água. A cada inspiração do ar, deve-se visualizar que a onda vem, e a cada expiração, visualizar que a onda vai.
Se você achou complicado (embora não seja, é uma questão de treino) existem formas mais fáceis de introduzi-las do que você imagina, por exemplo, utilize brincadeiras que levam à meditação. Veja abaixo:
Um passeio no parque para contemplar a natureza, brincar com uma ampulheta e observar a areia caindo, colorir mandalas, escutar uma história e tentar imaginar que é parte dela fazendo visualizações, colocar um bichinho de pelúcia favorito sobre o peito e observar como ele se movimenta enquanto respiramos… Tudo isso vale para introduzir a meditação na rotina da criança.
* A função executiva (também conhecida como controle cognitivo e sistema supervisor atencional) é um termo abrangente para a gestão (regulação, controle) dos processos cognitivos, incluindo memória de trabalho, raciocínio, flexibilidade de tarefas e resolução de problemas, bem como o planejamento e execução.