por Luís César Ebraico
Há uma pergunta que se repete com frequência em entrevistas iniciais. O diálogo abaixo – fictício – ilustra como costumo trabalhar essa pergunta com um candidato a tratamento psicanalítico, que chamarei de Haroldo.
HAROLDO: — Mas, afinal, doutor, eu PRECISO ou não de análise?
LC: — Haroldo, análise não é para quem precisa, é para quem está com vontade de fazer.
PACIENTE: — Como assim?
LC: — Não creio haver uma só pessoa neste planeta que, tendo vontade de investir no processo de ampliação da própria mente em que consiste a experiência psicanalítica, não obtenha ganho com isso, mesmo que não esteja apresentando nenhum distúrbio psicológico de maior gravidade; por outro lado, pessoas com graves distúrbios psicológicos e que poderiam tirar muito maior proveito dessa experiência, se não estão dispostos a investir nela, nunca terão acesso a esse proveito.
PACIENTE: — E quando, como eu, a pessoa não acredita que esse ganho seja possível.
LC: — O processo psicanalítico não requer crença, requer apenas o “benefício da dúvida”.
PACIENTE: — O que é isso?
LC: — Lhe explico. Você precisa ACREDITAR em um antibiótico para que ele funcione?
PACIENTE: — Claro que não!
LC: — Basta, não importa por qual via, INGERI-LO, certo?
PACIENTE: — Certo.
LC: — Então, se um indígena que “não acredita em remédio de homem branco”, aceitar, ainda que fazendo pouco, tomar um antibiótico contra uma determinada infecção, vai fazer tanto efeito nele quanto faria em um “homem branco” que acredita nesse tipo de medicamento, não é assim.
PACIENTE: — Sem dúvida.
LC: — O mesmo ocorre com a Psicanálise. Se você, mesmo não acreditando nela, lhe dá o “benefício da dúvida” e se dispõe a investir no processo, ela irá funcionar tanto quanto funciona em alguém que a priori, tem confiança nela. Lembro-me de um paciente hipocondríaco – o mais hipocondríaco de todos que já atendi – que duvidou inicialmente de que poderia ter alguma utilidade fazer o que eu lhe indiquei; entre outras coisas, detalhar, dizendo nomes, as situações de doença que ele temia. Mas deu-me o “benefício da dúvida” e tentou. Livrou-se da hipocondria e, tendo “pago para ver”, descobriu a eficácia da Psicanálise. Quando partimos para tratar de outros sintomas, investiu na análise porque sua experiência anterior já lhe demonstrara a eficiência da técnica e não meramente por me estar dando o “benefício da dúvida”.
PACIENTE: — Tudo bem, vou lhe dar o “beneficio da dúvida”. Quero tentar.
LC: — Combinado. Poderíamos nos encontrar então blá, blá, blá, blá, blá, blá…