Por Cybele Russi
Nos últimos anos tem sido enorme a preocupação dos pais com relação às conversas que deveriam ter com os filhos sobre sexo. Com que idade a criança está pronta para falar sobre isso? Qual a melhor hora para falar? O que falar? Como falar?
Como na grande maioria das questões relacionadas à educação dos filhos, não há respostas prontas. Não existe um momento exato, nem uma idade certa, nem um discurso pronto e menos ainda, fórmulas prontas. Cada caso é um caso, cada família é uma e cada criança é única. E sexo, como todas as aprendizagens humanas, deve acontecer de forma natural, ao longo do processo de crescimento.
Mas, mesmo sabendo-se de tudo isso, a questão persiste, possivelmente porque nos últimos anos a criança tem sido, literalmente, bombardeada pelo sexo em todos os momentos de sua vida, por meio de músicas, de imagens televisivas, de imagens fotográficas em revistas, em out-doors, ou apenas pelo visual da moda, cada vez mais apelativo à sexualidade. A verdade é que a criança está exposta a uma carga pesada de referências sexuais no seu dia-a-dia, e com isso, sua curiosidade a respeito do assunto está ficando cada vez mais precoce, e a preocupação dos pais, cada vez mais intensa.
Se no passado uma barriga grávida era coberta e disfarçada com vestidos e batas longos e largos, hoje, além de descoberta, é exibida em todos os seus detalhes para quem quiser ver à vontade. E a criança vê, como todos nós. E não só vê, mas fica curiosa, e quer saber o que contém aquela barriga para torná-la tão grande e protuberante. Isso sem falarmos que a gravidez está na pauta das discussões diárias da família, seja a gravidez da tia, a gravidez da professora, a da vizinha e a da própria mãe da criança. Então, o tema que era mantido longe dos ouvidos infantis no passado, hoje pertence ao universo de seus diálogos com os coleguinhas de Jardim de Infância: "Minha mãe está grávida, vou ganhar um irmãozinho". Já vi crianças que acompanharam a mãe ao exame de ultra-som e chegaram à escola contando que tinham visto a irmãzinha na televisão do médico. E não só a gravidez está na tela da tevê do médico, mas cenas de sexo estão no horário da programação normal da televisão em todos os lares.
Contudo, ao mesmo tempo em que a criança é exposta a todo tipo de informação sexual desde bem pequena, seja de forma explícita ou de forma subliminar, alguns pais ainda se sentem temerosos e constrangidos para "falar de sexo" com ela. Mas será que "se fala de sexo" com crianças? Será que é, realmente, para se falar sobre isso com elas?
Esta é uma questão extremamente delicada, porque, a rigor, não se deveria falar sobre sexo com crianças. Sexo é assunto de adulto, é questão que envolve maturidade e não se restringe às questões da reprodução humana, mas a quase tudo o que diz respeito à vida adulta humana. É por essa razão também que, na grande maioria das vezes, a Escola não dá conta desse assunto nas salas de aula. Porque a questão sexual do homem vai muito além da reprodução da espécie, extrapola as aulas de biologia e adentra as de história, de sociologia e de psicologia. Abrange aspectos determinantes de nossa personalidade, de nossa construção como pessoas.
Ocorre porém que, como a criança está exposta a todas as formas de sexualidade, ela está também exposta a todos os riscos e perigos que a sexualidade envolve, como gravidez na puberdade, estupro, abuso sexual, doenças sexualmente transmissíveis e outras inúmeras formas de violação sexual, que podem afetar seu desenvolvimento psíquico-emocional, se ocorridos fora de hora. Então, como não falar? Pois é, não há como não falar.
A solução possível, então, é adequar o discurso ao nível de compreensão e de curiosidade da criança, de modo que seja uma conversa natural, sem grandes sobressaltos, mas que satisfaça sua curiosidade e responda às suas dúvidas. Quando a criança pergunta, a melhor coisa a se fazer é ter um papo legal, leve e sem grandes explicações científicas, mas com palavras de fácil compreensão e que sejam suficientes para resolver a dúvida.
Na realidade, a aprendizagem do sexo deve acontecer como todas as aprendizagens humanas: como um processo de construção, que se desenvolve ao longo da vida e de acordo com as necessidades de cada indivíduo. Do mesmo modo, como num determinado momento da vida, a criança espontaneamente nos pergunta: "O que está escrito aqui?" porque já se deu conta de que aqueles símbolos no papel tratam de coisa escrita, num outro determinado momento ela perguntará "Como o bebê foi parar dentro da barriga?" Devemos responder com a mesma naturalidade a ambas as perguntas, pois para ela o nível de curiosidade e de necessidade de resposta é o mesmo.
Não adianta fugir das respostas
Assim como é inútil oferecermos respostas complexas demais, que estejam fora do alcance de sua compreensão, é igualmente inútil fugirmos das respostas, pois elas irão procurá-las em outra parte, até encontrarem uma que lhes satisfaça a necessidade de saber. O ideal é que ela encontre nos pais e no lar ambiente e clima de acolhimento e confiança, para que possa perguntar sempre que desejar, sem constrangimentos.
E com os 'adolas'? Ta ligado?
E se a criança se dá por satisfeita com respostas simples, claras e objetivas, o adolescente se acredita o dono do saber, aquele que domina todos os assuntos, detém o conhecimento de tudo e nunca precisa fazer perguntas, porque já tem todas as respostas prontas. E é na arrogância do seu saber que mora o perigo, quando acontecem os "acidentes", como uma gravidez indesejada, por exemplo, ou uma doença sexualmente adquirida, quase sempre por falta de informação correta.
Se aos pequenos basta dizer que temos um corpo cheio de buraquinhos e que para cada um existe uma função específica, como olhar, comer, respirar, ouvir, fazer xixi, fazer cocô, fazer sexo, com os mais crescidos devemos ampliar nossa conversa, e discutirmos quais as melhores maneiras de usar esse corpo tão bem projetado, que foi feito para nos proporcionar saúde, prazer e enormes alegrias.
Mas tudo isso só poderá ser falado se for desde sempre, ao longo da vida, em todos os momentos em que o assunto surgir, de forma natural, de tal modo que as perguntas possam brotar de ambas as partes com espontaneidade, e que as respostas possam ser construídas sempre em parceria, entre pais e filhos, que não seja o diálogo da solidão, mas um espaço de trocas verdadeiras. Assim como se dão todos os diálogos domésticos, sem sobressaltos, sem segredos, sem constrangimentos, com a naturalidade com que se conversa sobre todas as coisas da vida, como a novela, o noticiário do jornal, as fofocas da escola e as baladas do sábado, toda hora é boa para se falar de sexo.