Quando o filho se torna dependente a culpa é dos pais?

por Silvia Maria de Carvalho

"Tenho um filho de 17 anos totalmente dependente de mim. Sei que é culpa minha. O que faço para corrigir isso?"

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Resposta: Importante você falar em culpa. O que você sente quando pensa nessa palavra?

Pra mim, parece crítica ou acusação de algo que a gente fez. Parece que “foi de propósito”, sabe?

A gente fica meio paralisada, olhando pra trás. Vejo um dedo apontado na cara. Pior: nosso próprio dedo.

Gosto de falar sobre responsabilidade. Aí sim assumimos que nossos atos têm consequências, querendo ou não. Se você agiu de determinada forma, era o que sabia fazer naquele momento. Mas com responsabilidade, está disposta a mudar a situação. Colocamos o foco nos fatos. Vamos pra frente.

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Ninguém se torna totalmente dependente da mãe quando faz 17 anos. Provavelmente foi um padrão de comportamento desenvolvido aos poucos, quase sem você perceber.

Quando pequenos, penso mesmo ser difícil estabelecer o limite entre o que os pais fazem pelos filhos e aquilo que eles (filhos) poderiam fazer por si próprios. Só que as crianças crescem e a gente acha que aos 17, 18 anos, eles vão se tornar independentes, só por que ficaram adultos. Não depende da idade. Mas sim da história de aprendizado que tiveram.

Sabe aquele tênis que você amarrou todos os dias quando ele já sabia amarrar os próprios sapatos?

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Olha a armadilha: quando é hora de parar?

Soma esse cadarço amarrado, com a toalha molhada que você estendia depois dos banhos. Agora junta com as os brinquedos que você guardava por ele. Ah… tem também os momentos que você tomava a frente nas discussões com os amiguinhos. Até aí, parece inofensivo. Afinal, são crianças! Não é assim que a gente pensa? São exemplos simples que você pode substituir por milhares outros.

E vai se formando um ciclo vicioso: quanto mais você faz, menos ele faz e quanto menos ele faz, mais você faz. Você acha que ele vai ficar sem fazer e precisa “salvar” a situação. Olha como cresce o balão! Aí fica difícil parar, porque vai ter escândalo, certamente. Ele está acostumado a esperar.

E lembra daquele cadarço que a gente falou um pouco antes? Vira a prestação do carro que ele não paga, porque esquece; vira o projeto no trabalho, que ele não sabe negociar com o chefe. E aquela criança hoje tem barba e aprendeu a falar e se justifica! Diz que não tem tempo pra resolver essas coisas. Que só não mudou ainda porque não quis. Que está muito cansado hoje. Na verdade, não tem preparação pra vida. O mais perigoso, a meu ver, é ficar aí nesse lugar, discutindo quando é que ele vai crescer, ao invés de planejar uma mudança de postura.

Por onde começar a mudar a relação de dependência?

Quando a gente entende, de verdade, que fazer menos é fazer mais, o jogo começa a virar. Não dá pra esperar alterações bruscas e definitivas. Do mesmo jeito que esse padrão foi instalado dia após dia, vai sendo desaprendido aos poucos também. Vamos descendo um degrau por dia. E reaprendendo nova forma de se comportar. Mais saudável para os dois.

Não acho que tem dia certo pra começar… Tenha certeza que vai haver desconforto e ele vai procrastinar bastante. Se você puder combinar com seu filho pequenas coisas que vai deixar de fazer, será ótimo.

Caso ele não tope, a mudança precisa ser sua. Tendo convicção de que será melhor pra ele, você vai conseguir. Você pode dizer a ele, se quiser, que ele é capaz de fazer algumas coisas sozinho e por isso vai deixar que as faça. No primeiro momento, ele ainda será dependente das suas instruções. Perguntar o que precisa ser feito ao invés de fazer, já é uma mudança. Ensiná-lo a escrever sua própria lista de tarefas e estar atenta para dar feedbacks descritivos sobre seu avanço, vai ajudar você a se distanciar, aos poucos.

Ele tem sua própria vida e precisa se responsabilizar por ela. Comece por situações simples do cotidiano que, se ele não fizer, você tolere esperar; como por exemplo: deixar que ele guarde a própria roupa ou arrume o quarto. O mais importante é manter firme sua posição.
                                                                                                              
Achei uma frase linda pra você:

“Frequentemente cantamos acalentos para nossos filhos a fim de que nós próprios possamos dormir”
Khalil Gibran