por Regina Wielenska
Acabei de ver uma casa magnífica no programa de televisão, construída de frente para o oceano. Dois grandes lances de escada em meio à vegetação são o caminho a ser percorrido pelos moradores e hóspedes. Aí começa a encrenca: a bisavó na cadeira de rodas tem como chegar ali? Não vi rampas, elevador e sequer corrimão.
Sofás maravilhosos, de um tecido branco, impecáveis. Será que são, na verdade, capas impermeáveis? Crianças sobem com calçado ou pés sujos de areia sem que tenhamos chance de prevenir desastres. Bebe-se vinho tinto sentando num sofá assim?
Devo estar com uma baita inveja disso tudo. Talvez, eu confesso.
Mas, de verdade, me pergunto, pra quem deve ser o planejamento de uma casa? Só para adultos, zeloso, atentos e no auge da boa forma? Creio que não. A arquitetura é uma arte e ciência incrível, e pode ajudar a gente a pensar na integração entre aquele lar que está sendo planejado e as possíveis necessidades de visitantes e moradores.
Faz cerca de duas décadas que ouvi de uma amiga que estava a construir a casa onde pretendia passar seus dias até a vida querer que assim fosse. Ele me contava da quantidade enorme de tomadas, boa parte delas instaladas na metade da parede. Dizia a amiga: "Ao envelhecer pode ser que eu não consiga alcançar tomadas perto do rodapé, preciso de barras nos banheiros, pedi uma casa térrea com portas largas, que permitam a um cadeirante circular sem barreiras". Ela não construía um asilo, na verdade queria que sua nova casa comportasse três ou mais gerações, num ambiente belo, confortável, seguro e tecnológico.
Também me incomodam casas sem história, constituída apenas de objetos comprados unicamente para fazer vista, "pra tudo ficar chic" e impressionar aos visitantes. Um lar sem livros me cheira a ignorância, mas não posso me esquecer dos benefícios dos leitores de e-books. Ocupam pouco espaço na estante e abrem universos de leitura por horas sem-fim.
Tenho dificuldade para me desfazer de alguns objetos, mas em nada me assemelho aos acumuladores, indivíduos acometidos por um transtorno de comportamento. Parece bacana conseguir encontrar o meio-termo entre o amor por objetos, e as boas lembranças que eles nos evocam e o apego descabido àquilo que na verdade já perdeu sua função física ou emocional.
Um lar precisa ter o tamanho dos braços de seus donos. Um porão onde ninguém entra serve para quê? Acumular mofo ou assombrar os menores? De que vale uma banheira de hidromassagem se os custos para usá-la extrapolam o razoável?
Me impressionou ver um morador de rua que, após o que pareciam alongamentos, passou a varrer o chão onde dormiria aquela noite. Muito respeitoso consigo e com a calçada sob o toldo de um comercio fechado.
Não sei bem a razão de ter decidido partilhar com vocês algumas de minhas inquietações sobre as funções de um imóvel ou calçada quando vira um lar: para mim seria promover o bem-estar, a saúde, o acolhimento, a prosperidade, a segurança, o amor, a amizade e muita coisa mais. E pra vocês, quais as faces do local onde moram?