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“Descobri agora que minhas dores de cabeça crônicas se devem ao uso de triptanos. Tomava quase todos os dias por ter dor de cabeça. Decidi que isto não pode ser mais forte que eu e quero deixar de tomar de uma vez por todas. Mas apesar de achar que vou conseguir fazer isso, quero ter uma ideia dos sintomas e do tempo que demora até me sentir melhor para me mentalizar. Cumprimentos!”
Por Danilo Baltieri
Resposta: Cefaleias, em geral, atingem todos nós amiúde de forma esporádica, episódica, recorrente ou mesmo crônica. Entre 3 e 5% da população sofre de cefaleia crônica, definida como aquela que ocorre pelo menos 15 dias por mês. Episódica ou cronicamente, é comum o uso de diferentes medicações para o controle da dor, sem visitas prévias a médicos ou especialistas.
No entanto, quando as cefaleias são muito intensas, prolongadas ou frequentes, a consulta a especialistas torna-se imperativa. No caso dos portadores de cefaleia crônica, o uso imoderado e não prescrito de medicações pode, a médio prazo, tornar o quadro de dor ainda pior e o manejo do fator causal (quando e se reconhecido) ainda mais complicado.
Os triptanos, tais como sumatriptana, naratriptana, eletriptana, zolmitriptana etc têm sido amplamente utilizados para o tratamento de alguns tipos de cefaleias, especialmente da chamada enxaqueca aguda (crises de enxaqueca). Embora o uso destas medicações devesse ser adequadamente supervisionado por médico neurologista especialista, o consumo crônico, imoderado ou mesmo exagerado e não prescrito destas medicações pela população com o objetivo de aliviar diferentes formas de cefaleias tem sido visto em diferentes locais do mundo.
Crises de dor levam ao consumo exagerado
Portadores de quadros de cefaleias crônicas acabam fazendo uso de medicações eficazes para o controle desse tipo de dor, mas, infelizmente, não é incomum que o uso ocorra em quantidade e/ou frequência superiores às recomendadas ou mesmo terapêuticas. Isso é compreensível, dada a intensidade e enorme desconforto provocados pelas crises de dor. Por isso, o acompanhamento com profissional neurologista especializado é altamente recomendado.
Sempre é importante notar que os tratamentos farmacológicos são ferramentas importantes para o manejo desse problema. No entanto, o tratamento não deve encerrar-se com medicamentos. Existem abordagens não farmacológicas que devem ser também utilizadas, incluindo atividades físicas direcionadas, de relaxamento, alterações dos hábitos alimentares e terapias comportamentais.
Uso crônico de medicação pode induzir à cefaleia
O uso crônico, imoderado ou mesmo desnecessário de medicações para o tratamento das cefaleias, como os triptanos, pode, por si mesmo, “induzir” um tipo de cefaleia crônica. Na verdade, os termos “cefaleia secundária ao uso excessivo de medicações,” “cefaleia rebote devido ao uso crônico de medicações para o tratamento da enxaqueca” têm sido mencionados comumente nos gêneros textuais médicos especializados. Mas, de qualquer forma, este quadro de cefaleia crônica secundária ao uso exagerado de triptanos surge, geralmente, depois do portador de um quadro de cefaleia genuíno (e não induzido pelos triptanos) começar a fazer uso dessas medicações.
Critérios que caracterizam quadro de cefaleia
Alguns critérios têm sido utilizados para caracterizar este quadro de cefaleia secundária ao uso de triptanos, tais como:
a) cefaleia presente por pelo menos 15 dias por mês;
b) uso regular de uma ou mais medicações para o tratamento da enxaqueca (uso regular pode ser definido como o consumo dessas medicações por 10 ou mais dias por mês durante, pelo menos, 3 meses);
c) piora da cefaleia após o consumo crônico ou imoderado das medicações;
d) retorno ao padrão clínico anterior ao uso dessas medicações após dois meses da interrupção do consumo.
É importante notar aqui que existem vários tipos de cefaleias e que a enxaqueca crônica secundária ao uso exagerado de medicações (no caso desta pergunta, dos triptanos) é apenas um destes tipos. De fato, associações médicas internacionais reconhecem mais de 300 tipos de cefaleias, classificando-as em primárias ou secundárias. As primárias são, em si mesmas, doenças; já as cefaleias secundárias são relacionadas a algum outro problema que as gera, como, por exemplo, o consumo de algumas medicações.
Em diferentes estudos, os portadores dessa cefaleia secundária ao uso de medicações apresentam mais frequentes taxas de consumo de tabaco, maior índice de massa corporal e insônia. Embora controvertido, devido aos resultados discrepantes de diferentes estudos, aqueles portadores da cefaleia crônica secundária ao uso de medicações parecem demonstrar mais sintomas de depressão e ansiedade (quando comparados a portadores de cefaleias episódicas ou esporádicas).
Entre os portadores da cefaleia secundária ao uso de medicações, a conduta é a retirada do fator causal (ou seja, das medicações). O objetivo não é somente a interrupção dos triptanos (ou outras medicações causadoras), mas sobretudo, aumentar a capacidade do portador para responder a outras formas de tratamento e de manejo médico.
Descontinuação da medicação: sintomas
A descontinuação das medicações associadas ao quadro de dor pode provocar alguns sintomas bastante desagradáveis, tais como:
a) piora do quadro de dor;
b) taquicardia;
c) alteração da pressão arterial;
d) náuseas e vômitos;
e) perturbação do sono;
f) ansiedade e inquietação psicomotora.
Nesta difícil fase de retirada dos triptanos, que varia de 4 a 8 semanas, as recomendações farmacológicas para aliviar os sintomas têm sido bastante diferentes, de acordo com distintos serviços médicos e pesquisas clínicas. Medicações têm variado desde anti-inflamatórios comuns até a prescrição de corticoides.
Você deve estar sendo acompanhada por médico neurologista. Converse com ele sobre as possibilidades de manejo terapêutico durante esta fase de retirada, bem como sobre os planejamentos terapêuticos para a continuidade do tratamento da sua cefaleia depois da retirada destas medicações.
Siga as recomendações do seu especialista. Tente investigar rigorosamente os fatores de risco que contribuem para o recrudescimento das crises. Após a identificação destes fatores de risco, trate-os a contento.
Atenção!
Este texto não substitui uma consulta ou acompanhamento de um médico psiquiatra e não se caracteriza como sendo um atendimento.