por Danilo Baltieri
"Moro com um dependente de maconha. Ele usa todos os dias e às vezes usa crack e cocaína. Vivemos bem, mas fico muito incomodada com algumas situações: minha casa cheira maconha, não posso receber visitas sem marcar dia e hora. Estou bastante estressada com a situação, mas tenho medo de deixá-lo e ele piorar."
"O “codependente” deve procurar ajuda especializada com a finalidade de tratar-se, identificando os pensamentos disfuncionais que produzem comportamentos inadequados que prejudicam ambos os lados" Resposta: Muitas pessoas que convivem com dependentes químicos acabam por apresentar sintomas conhecidos como “codependência”
Sintomas de codependência:
– tentar controlar ou prever as ações do dependente;
– abandonar ou mesmo minimizar os próprios desejos, minimizar os comportamentos muitas vezes lesivos do dependente;
– deixar de respeitar seus próprios limites;
– tentar aparentar tranquilidade em momentos em que se sente mal e desrespeitada;
– evitar conflitos para manter as aparências;
– permitir ser desrespeitada em todo momento;
– acreditar que não tem outra opção além de conviver com a situação e com o dependente;
– assumir responsabilidades do dependente e pelo dependente.
Não é incomum que o indivíduo “codependente” tenha comportamentos e pensamentos contraditórios. Ou seja, ao mesmo tempo que não suporta o cheiro de maconha em casa, permite que o dependente fume na sala de visitas com as janelas abertas (porque é melhor fumar em casa do que fumar na rua; ou se ele fumar maconha em casa, não haverá brigas mais tarde).
Muitos outros comportamentos podem ser sumarizados abaixo.
Comportamentos do codependente:
– Dar dinheiro para o dependente comprar a droga, porque ele não tem dinheiro e pode passar mal sem a droga;
– Comprar a droga para o dependente, porque, se não o fizer, ela vai até a favela (ou algum outro lugar: “boca”) para comprar;
– Assumir responsabilidades pelo dependente, porque o mesmo está intoxicado ou mesmo de ressaca;
– Mentir ou desculpar-se para amigos, familiares ou chefe, objetivando esconder o problema;
– Usar a droga junto com o dependente, somente para ver como é o efeito e checar se é “tão bom mesmo”;
– Permitir que o dependente use drogas em alguns dias da semana, horas do dia, ou mesmo certas ocasiões;
– Emprestar dinheiro para pagar contas do dependente, incluindo aquelas obtidas por causa de drogas;
– Cancelar atividades sociais, de trabalho ou qualquer outra, porque o dependente estava intoxicado ou de ressaca;
– Ter sexo com o dependente quando realmente não queria, porque o mesmo estava intoxicado e assim o desejava;
– Tentar livrar o dependente de problemas que ele mesmo causou;
– Impor limites ao dependente, mas não cumprir com o proposto;
– Mentir para a polícia (ou outras autoridades) com o fim de salvaguardar o dependente;
– Limpar a casa (após o dependente vomitar ou quebrar móveis e utensílios) para evitar que outras pessoas vejam o problema;
– Pedir que outros familiares e amigos mantenham segredo sobre o problema com drogas.
Pensamentos do codependente
Pensamentos que nutrem esses comportamentos citados logo acima são fontes perigosas que precisam ser rigorosamente revistos pelos “codependentes”.
Alguns desses pensamentos são:
– É meu dever assumir as responsabilidades da casa nestes momentos de estresse;
– Eu sinto que eu devo cuidar do dependente, independentemente do que ele faz;
– Eu posso mudar o dependente quando eu quiser ou achar que devo;
– Eu sou uma das razões pela qual o dependente faz uso de drogas;
– Está tudo bem se o dependente usar drogas, desde que ele controle este uso;
– Às vezes, eu acho bom que o dependente faça uso de drogas em casa, porque ele fica mais afetuoso, além de expressar emoções positivas;
– Eu sinto falta de certos aspectos da vida, quando o dependente para de usar drogas;
– Eu preciso fazer o que for preciso para manter meu relacionamento com o dependente;
– Frequentemente, eu não digo tudo o que eu penso sobre o uso de drogas e álcool, porque tenho medo de que a minha sinceridade piore a situação;
– Frequentemente, eu nego, minimizo e ignoro a seriedade do problema com o uso de drogas e álcool;
– Eu tolero o consumo de drogas do dependente, desde que ele cumpra com as suas obrigações financeiras;
– Eu devo fazer tudo o que for possível para proteger o dependente das consequências sociais e legais do consumo de substâncias;
– O dependente não consegue recuperar-se sem a minha constante ajuda.
Frequentemente, o “codependente” manifesta consequências psicológicas, físicas e sociais advindas desses comportamentos e pensamentos que não são rapidamente percebidos pelo mesmo, tais como: redução da rede de amigos, sonhos não usuais, mudança no padrão de sono e apetite, sintomas ansiosos e depressivos, redução da habilidade e desempenho no trabalho, conflitos com normas e crenças pessoais, problemas financeiros, deterioração da autoestima, dentre outros.
O “codependente” deve procurar ajuda especializada com a finalidade de tratar-se, identificando os pensamentos disfuncionais que produzem comportamentos inadequados que prejudicam ambos os lados.
Como tenho reiteradamente escrito aqui no Vya Estelar, o ato de ajudar deve sempre ser estimulado, mas precisamos saber como fazer isso de forma adequada e saudável. Cada caso deve ser estudado intensivamente, avaliando as melhores estratégias de manejo.
Queira procurar ajuda especializada com um profissional qualificado na matéria.
Abaixo, forneço interessante referência para leitura:
Rotunda, R. J., West, L., & O'Farrell, T. J. (2004). Enabling behavior in a clinical sample of alcohol-dependent clients and their partners. J Subst Abuse Treat, 26(4), 269-276.