por Ceres Araujo
A resiliência é a capacidade humana de superar situações difíceis da vida, de superar adversidades e de ser fortalecido por elas. É um potencial humano independente da cultura e do tempo. Em função dessa capacidade, o individuo pode transformar as dificuldades em desafios e buscar meios novos para enfrentá-los, continuando seu processo de desenvolvimento de forma adaptada.
Na trajetória do desenvolvimento humano, a adolescência se constitui em um período sensível, difícil para muitos jovens. As mudanças hormonais, o rearranjo dos circuitos neuronais no cérebro, determinam alterações significativas no comportamento do ser humano. Observa-se um aumento no nível de estresse, muitas vezes superior ao que o indivíduo está acostumado a administrar.
Cabe ao adolescente o confronto com o mundo dos pais e dos adultos em geral para buscar a própria autonomia. O desejo da independência, de dirigir o seu destino é louvável e muito desejável, pois está relacionado aos ensaios de posturas de afirmação na vida, mas tal desejo nem sempre pode ser satisfeito em todas as ocasiões. É exatamente nesse ponto que surgem os conflitos ocasionados pela dificuldade imensa de lidar com a frustração que muitos jovens tendem a apresentar na atualidade. A baixa tolerância à frustração, a dificuldade de tolerar esperas e de adiar a satisfação de desejos do adolescente, constituem fatores de risco para o seu desenvolvimento. A dificuldade de muitos pais para lidar adequadamente com os limites e com as interdições pode exacerbar os conflitos com os filhos adolescentes.
Em relação às mudanças da adolescência, alguns jovens conseguem apreciar a vida nessa época e se adaptam com flexibilidade às novas circunstâncias e desafios, enquanto que outros, ao contrário, ultrapassam essas mudanças a duras penas, vivendo mal-estar constante, altos níveis de estresse e ansiedade. Surge o risco maior do uso e da dependência de drogas, na busca de alívio.
A instabilidade é própria da adolescência, em função de todas as mudanças físicas e psicológicas que ocorrem e que repercutem em todos os ambientes onde o jovem se insere: familiar, escolar e social em geral. Quando ele é compreendido em suas reações instáveis fica mais fácil, para ele e para os que o cercam, viver o dia a dia, mas quando ele é considerado o “aborrecente”, tem-se um fator de risco importante.
Perfil do adolescente que se adapta às mudanças
Os adolescentes que conseguem se adaptar melhor às mudanças da idade são aqueles que receberam dos pais, afeto e segurança durante a infância, que aprenderam a lidar com limites e frustrações, que internalizaram um sistema de valores, normas e princípios de conduta e que adquiriram confiança e segurança em si mesmos. São adolescentes que encontraram em seu entorno, estruturas familiares, sociais e culturais que serviram de tutores de resiliência, para usar a expressão cunhada por Boris Cyrulnik, pesquisador em resiliência. Um tutor de resiliência pode ser uma pessoa, um ambiente ou uma situação que reconhece no outro, o valor, a competência e a viabilidade de sua existência como ser único. Ser reconhecido e valorizado frente a seus recursos, potencializa no jovem a possibilidade de transformar dificuldades ou adversidades em desafios e enfrentá-los.
Nesse ponto, encontra-se um problema na nossa atualidade. Muitos pais deixaram de ser figuras de autoridade para seus filhos. Fugindo de uma postura autoritária, adotaram uma postura permissiva demais e deixaram de ser modelos de identidade valorizados e respeitados. Algo semelhante ocorreu com vários professores, despotencializados na salas de aulas, impedidos de usar a meritocracia como método de avaliação. Isso fez surgir uma geração de adolescentes inseguros, desorientados, sem modelos íntegros e respeitáveis para se identificarem. Essa é uma nova adversidade, com a qual, agora, os jovens têm que lidar. Ela constitui um risco altíssimo para o desenvolvimento.
Porém, apesar dos conflitos, muitas vezes vividos com os pais, professores e adultos em geral, na puberdade e na adolescência, o ser humano precisa continuar a se sentir querido e valorizado. Para ser valorizado, ele precisa se sentir competente no que faz, competente na construção do conhecimento e competente também socialmente. É dessa forma que a autoestima funciona como um fator de proteção importante para os riscos da idade. Cumpre lembrar que é uma boa autoestima que permite uma adequada autocrítica.
Mas, não só as trocas afetivas vividas com os familiares são fundamentais nessa época da vida. Na adolescência as trocas afetivas realizadas fora da família assumem uma importância considerável. É aí que o jovem se testa e avalia seus recursos. Surgem, na adolescência, os primeiros apaixonamentos e os primeiros sofrimentos com as perdas dos objetos de amor. É a época do treino das relações amorosas, muitas vezes esfuziantes, muitas vezes doídas.
Viver é enfrentar conflitos e elaborá-los. Dessa forma o eu cresce e se fortalece. Da superação dos conflitos da adolescência surge o jovem adulto, autônomo e preparado para os papéis sociais que o esperam.