Sabores antigos e novos: a tessitura da vida

por Regina Wielenska

Preciso partilhar uma história com vocês. Minha sobrinha mais velha tinha por volta de uns quatro ou cinco anos quando quebrou o micro-ondas deles.

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Constatado que o eletrodoméstico não funcionava, ela virou-se para a mãe e, preocupadíssima, comentou: “Mas, e aí, mamãe? A gente não vai mais poder fazer a mamadeira (da irmã mais nova)!”. Nunca ela tinha visto alguém aquecer leite na panela, ao fogão. Do alto de sua reduzida experiência de vida, a situação parecia incontornável.

Essa sobrinha, na mesma época, foi quem me ajudou a dar os primeiros passos efetivos no uso do computador. Cheia de fantasias parcialmente embasadas, eu tinha medo de dar um comando errado e estragar a máquina ou o trabalho em execução! Por meio das mãos confiantes e desinibidas da guria, aprendi a usar um programa para desenhar, o trisavô do Paint. E “brincar de aula de informática” com ela me auxiliou a desfazer um não tão antigo trauma.

Poucos anos antes, havia sido desastrosa minha parceria com um colega ao rodarmos no DOS um programa de banco de dados que organizaria a pré-matricula de nossos alunos da universidade. Conseguimos deletar horas de nosso trabalho árduo com apenas um ou dois cliques indevidos. O computador era um modelo TK85 ( http://pt.wikipedia.org/wiki/TK_85 ), cujos dados eram registrados numa fita cassete inserida num gravador. Foi um desastre perder as informações armazenadas. Passei a achar que essas máquinas não haviam sido delineadas para criaturas jurássicas como eu.

As histórias se entrelaçam se pensarmos o seguinte: a menina desconhecia a prática antiga do uso do fogo para esquentar o leite e pensava não haver solução. Eu desconhecia a faceta amigável dos novos computadores e ficara congelada, imobilizei-me na tecnofobia. O caso dela era apenas de desconhecimento, não tivera tempo para conhecer os meandros da cozinha, era pequena demais para dominar o fogão. Sua mãe a protegera dos perigos de queimaduras, então a pequena sabia reproduzir apenas o que via sua mãe fazer todos os dias, mamadeiras no micro-ondas.

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Conhecer a história nos ensina muito, aprendemos a resolver melhor os problemas se temos acesso a dados do passado. Como se aquecia mamadeiras antes do advento do micro-ondas?

Por outro lado, quão adaptativo seria ficar congelada ao primeiro insucesso no manejo de uma tecnologia nova?

Afinal de contas, se borracha é companheira inseparável do lápis é porque está previsto que errar faz parte do escrever. Um sem-fim de descobertas científicas foi o sucedâneo de erros em série. Variar o comportamento, experimentar alternativas, persistir, carregar os erros consigo, com leveza e tolerância, tudo parece ajudar aos que precisam aprender a errar para ao final conseguirem acertar.

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Quem se cala, temeroso de cometer equívocos, dificilmente dará conta de aprender um novo idioma na vida adulta. Ao novo precisamos abrir espaço, no corpo, no coração, na mente, na sala de estar de nosso ser. Sejam, então, bem-vindos ao estranhamento, ao frio na barriga e ao medo de errar.

Por hoje é isso, proponho termos curiosidade com nossa história, aprendermos com os que chegaram antes de nós e, ao mesmo tempo, acho que só vive de verdade quem está aberto ao novo, e dele experimenta, com gosto por ampliar seus repertórios para interagir com um mundo em constante transição.