por Leonel Vieira
Muitos dos nossos problemas decorrem de percebermos apenas um dos lados das situações e das pessoas. Quando sentimos simpatia por alguém, nossa tendência é perceber apenas suas qualidades. Ocorre o oposto em relação à nossa percepção das pessoas com quem antipatizamos. Somos geralmente unilaterais. O nosso progresso em direção a um melhor relacionamento com os outros e uma maior paz de espírito passa pelo nosso esforço em desenvolver uma visão mais equilibrada das pessoas e situações.
Uma história que me foi contada anos atrás por uma mestra espiritual, nos ensina algo neste sentido.
Há muito tempo atrás, os discípulos de um mestre estavam se acusando mutuamente: "Fulano não fala a verdade!", "Sicrano é orgulhoso!", "Beltrano come demais!" e assim por diante… O mestre nada disse. Apenas pegou uma grande tela branca, um pincel e, molhando-o em tinta preta, fez com ele um pontinho preto no meio da tela.
Em seguida, chamou um dos seus discípulos e perguntou-lhe:
– O que você vê nesta tela?
Sem hesitar, o discípulo respondeu:
– Um pontinho preto!
Chamou a outro discípulo e repetiu a pergunta:
– O que você vê nesta tela?
O segundo discípulo olhou com cuidado, examinou toda a tela e disse:
– Um pontinho preto.
O mestre foi chamando cada um dos demais discípulos. Alguns davam a resposta imediatamente, outros examinavam com cuidado a tela, e outros ainda chegavam até a apertar os olhos para ver se havia mais alguma coisa na tela. Contudo ao final, todos davam a mesma resposta: "Um pontinho preto."
O mestre então, olhou para cada um dos discípulos e mostrando a tela disse:
– Com toda esta grande extensão branca da tela, vocês só enxergam este pontinho preto?
Os discípulos se entreolharam com surpresa. E o mestre prosseguiu:
– Da mesma forma, vocês só estão enxergando o pontinho preto um dos outros, sem considerarem toda a extensa área clara de qualidades e boas realizações que têm!
Quantas vezes deixamos de ver o lado positivo das pessoas? O termo "falar dos outros" é usado como sinônimo de falar mal, tal a freqüência que ao falar de alguém, tendemos a enfatizar seus defeitos reais, fatos negativos em que está envolvido, em detrimento de suas qualidades e sucessos. Esta visão negativa pode nos contaminar também, viciando-nos a ver principalmente os aspectos negativos das pessoas e situações; o que pode nos tornar por vezes parte dos eventuais problemas com que nos defrontamos, ao invés de contribuirmos para a solução.
Sugiro que, quando começar a pensar ou a falar nos defeitos ou insucessos de alguém, busquemos passar pelas três peneiras que esta história (que se teria passado com Sócrates) nos ensina:
Certa feita um homem esbaforido aproximou-se do filósofo e disse-lhe:
– Escute, Sócrates… Na condição de seu amigo, tenho uma coisa muito grave para dizer-lhe a respeito de um conhecido nosso.
– Espere!… – disse o sábio prudente. Já passou o que me vai dizer pelas três peneiras?
– Três peneiras? – perguntou o visitante, espantado.
– Sim, meu amigo, três peneiras. Observemos se sua confidência passou por elas. A primeira, é a peneira da verdade. Você tem absoluta certeza, quanto àquilo que pretende comunicar?
– Bem, – ponderou o interlocutor, – assegurar mesmo, não posso… mas ouvi dizer e… então…
– Portanto não passou pela primeira peneira. Decerto então passou o assunto pela segunda peneira, a da bondade. Ainda que não seja real o que julga saber, será pelo menos bom o que quer me comunicar?
Hesitando, o homem replicou:
– Isso não… Muito pelo contrário…
– Ah! – tornou o sábio – então recorramos à terceira peneira, a da utilidade, e notemos o proveito do que tanto o aflige.
– Útil?!… Disse o visitante muito agitado.
– Útil não é…
– Bem – rematou o filósofo num sorriso, – se o que você tem a confiar não é verdadeiro, nem bom e nem útil, esqueçamos o problema e não se preocupe com ele, já que nada constrói de positivo para nós!…