por Angelina Garcia
Beatriz demorou a entender que não adiantava insistir, pois, ainda que sua experiência ou intuição acertassem sempre no que resultaria uma atitude inadequada da filha, Glorinha resistia. Sentia-se dona do próprio nariz, embora não estivesse suficientemente amadurecida para isso. Se a mãe dissesse "é melhor ir de calças compridas, porque vai atravessar muito mato até chegar a tal lugar," ela colocava minissaia. E, claro, voltava toda ralada. Hora de Beatriz recebê-la com um sonoro "não te falei" e deixar Glorinha louca da vida.
Não só o adolescente, na sua rebeldia necessária, mas qualquer um de nós se chateia ao ouvir essa frase, já que o processo de individuação nunca cessa. Estamos sempre buscando "o nosso jeito" de fazer as coisas, mesmo que algumas vezes ele nos custe caro.
Por outro lado, são vários os motivos que levam uma pessoa a querer participar das escolhas alheias: em interesse próprio ou do outro, por se achar mais experiente; porque foi solicitada, ou de enxerida; mas nenhum garante que seu palpite seja aceito.
É fácil observarmos a resistência a um conselho de alguém próximo, fazendo valer o famoso "santo de casa não faz milagre". Alguns discutem, até que sua opinião prevaleça; outros concordam na hora, apenas por gentileza, para desconsiderar em seguida. Há, ainda, aqueles que só querem confirmar uma idéia já estabelecida; uma resposta contrária, portanto, não muda seu ponto de vista. Essas reações podem não ocorrer quando quem opina é distante e, por isso, não percebido como ameaça à liberdade, à individualidade.
Existem situações em que somos responsáveis pela pessoa a quem acreditamos ter algo importante a dizer, quando se trata de crianças e adolescentes, por exemplo; noutros casos, a intervenção se dá em nome da amizade, do afeto, entre adultos. Seja como for, não podemos nos abster, justificando que de nada adiantaria porque elas não nos ouvem. Se estivermos de fato interessados no seu bem-estar, é preciso dizer, sim, e encontrar formas de ser ouvido.
Para que nossa fala seja menos incômoda, podemos fazer analogias, usar a voz de pessoas mais distantes ou personagens sociais que o outro admira, mas nunca minimizar a sua sensibilidade, a sua percepção, com ironia, subterfúgio, palavras pela metade, reticências.
Além disso, é importante observarmos a hora e o lugar de maior disponibilidade da pessoa para quem falamos e considerarmos o tempo que ela precisa para digerir e incorporar aquele discurso como seu, para, só assim, sentir-se dona da sua escolha. Se o resultado da sua opção não for o melhor para ela, vamos controlar nosso desejo de poder, evitando o "não te falei".