Selfie veio para ficar

por Andrea Jotta – psicóloga componente do NPPI

O “selfie”, dentre os novos termos designativos dos comportamentos humanos surgidos na virtualidade, parece ter se popularizado com força e amplitude.

Continua após publicidade

Esse termo, de origem americana – como muitos dentre os utilizados pelas novas tecnologias – é um derivado de “self”, substantivo da língua inglesa denominativo do “eu”, ou “referente à própria pessoa”. No contexto das atuais redes sociais passou a ser utilizado para denominar as fotos que os internautas tiram de si mesmos, normalmente com as câmeras dos celulares ou tablets, para em seguida serem postadas nas redes sociais.

Mais recentemente surgiu também na web uma variante desse tipo de postagem – o “shelfie” – que consiste na postagem de fotos de objetos ou ambientes reveladores da intimidade do internauta, como seus quartos, estantes de livros, coleções e outros ambientes ou objetos pessoais.

A postagem dos selfies parece estar se configurando como um comportamento que veio para ficar. Embora suas motivações mais básicas, bem como suas consequências, ainda sejam indeterminadas do ponto de vista psicológico ou social; existem questionamentos mais radicais que as apontam como expressões de uma atitude narcísica, egoísta e individualista presente nos indivíduos da sociedade atual. Vale destacar: os selfies não são tidos como causadores dessas possíveis características da nossa sociedade, mais, sim, expressões das dinâmicas psicológicas que as regem.

As síndromes ou desordens de personalidade narcísicas, bem resumidamente, segundo o site – http://www.bestcomputerscienceschools.net/wp-content/uploads/2013/11/Selfie-Syndrome.png – envolvem a preocupação excessiva dos indivíduos consigo mesmos e em como os outros os enxergam, sentindo-se orgulhoso de si e baseando sua estima na admiração de seus atributos físicos e intelectuais.

Continua após publicidade

Sinais de comportamento narcisista

Seguem aqui alguns sinais ou comportamentos que, se muito frequentes, podem interferir negativamente no desenvolvimento dessas pessoas, especialmente em se tratando de crianças ou adolescentes:

– Apresentam uma atitude de escuta unilateral, onde o outro só é ouvido para ser contrariado, diminuído ou ter seus conceitos negados, ignorados ou considerados como irrelevantes;

Continua após publicidade

– Preocupa-se apenas consigo próprio, atuando de forma egoísta, onde mesmo as atitudes generosas só respondem aos seus próprios conceitos;

– Desprezo às regras, aliado a um falso sentimento de que as regras só se aplicam aos outros e que essas regras não valem para si;

– Inabilidade para lidar com críticas: por terem uma visão inflada e distorcida de sua própria importância, acabam não conseguindo lidar de forma calma com as críticas, principalmente com as negativas;

– Fogem das responsabilidades, tendendo a culpar os outros quando as coisas vão mal;

– Irritabilidade: podem se tornar irritados e agressivos com facilidade frente aos comentários críticos ou quando recebem ordens dos outros sobre o que devem fazer.

Esse tipo de observação é válida, desde que tenha um caráter preventivo, tomando-se o devido cuidado para não incorrermos em uma “patologização” generalizada desses comportamentos. O uso brasileiro de internet e das redes sociais, apesar de crescente, ainda não possui a mesma amplitude de acesso ou rapidez de internet dos países desenvolvidos.

Em acréscimo, esse tipo de postagem pode ainda criar para seus autores a impressão de seu fácil acesso ao mundo das celebridades, antes tão inatingível: o mundo dos artistas de teatro televisão e cinema. Dessa forma, parecer tão popular e admirado quanto uma celebridade do meio artístico é um dos grandes atrativos desse tipo de comportamento. Os filtros, programas e aplicativos de manipulação de imagem, acabaram favorecendo a expressão desse tipo de fantasia, pois, afinal, quem não quer “sair bem na foto”?

Mas, por incrível que possa parecer, existe sim, uma parcela de pessoas que atua no sentido contrário, utilizando recursos que distorcem suas aparências: uma rápida pesquisa no Google revela uma quantidade significativa de imagens bizarras, contendo, por exemplo, selfies de rostos desfigurados por meio da aplicação de fita adesiva transparente.

Os selfies podem causar grandes polêmicas e influenciar até mesmo a política, pois uma imagem vale mais que mil palavras, já dizia o ditado popular. Exemplos recentes desse tipo de repercussão aconteceram por ocasião das postagens de selfies do presidente Obama em diferentes momentos de sua vida pública. Para esses casos acabam se estabelecendo certas “regras” de etiqueta sobre onde não se deve registrar um selfie como, por exemplo, em um funeral (vide o caso do presidente Obama no funeral de Mandela). Afinal, funerais são locais para se despedir de quem não está mais aqui e não ocasiões para eternizá-los em uma última foto, no caixão. Ou ainda no ambiente de trabalho, principalmente se seu chefe puder ter acesso à sua postagem e, portanto, constatar o trabalho que você “deveria”, mas NÃO está fazendo…

Por fim, uma das mais recentes modalidades dos selfies, designada pela hashtag(#) aftersex, (fotos tiradas após o sexo do casal) trouxe novamente à tona os questionamentos sobre a exposição virtual e suas repercussões sociais. Há os que defendem as fotos de selfie depois do sexo como um amplificador ou um disseminador do sentimento amoroso e carinhoso que existiria depois do ato sexual; mas há também quem os critique por resultarem em uma exposição excessiva e desnecessária da intimidade dos casais.

De toda forma, parece que o recomendável, em relação aos selfies – assim como em relação à maioria dos comportamentos virtuais – vale a advertência dos nossos parceiros da Safernet (http://adsoftheworld.com/media/print/safernet_brasil_selfie): o espaço da virtualidade não consegue guardar segredos, e o melhor, ainda, é preservarmos nossa privacidade off line.