Por Luciana Ruffo – Psicóloga componente da equipe do NPPI
O grande fantasma da maioria das relações amorosas é, e sempre foi a traição. Saber que o parceiro deseja outra pessoa é algo muito doloroso em nossa cultura.
Com a chegada de novas tecnologias, houve um aumento das oportunidades de encontro de pessoas que compartilhem os mesmos desejos e fantasias sexuais. Conhecer pessoas através do uso da internet, via e-mails ou salas de bate-papos, tem sido algo fascinante e cada vez mais fácil de ocorrer.
Encontros amorosos e sexo virtual surgem em discussões, freqüentemente. Mas, fazer sexo virtual é mesmo uma traição ao parceiro? Qual é o tipo de contato que realmente caracteriza uma traição? A internet abriu um campo novo, onde nos deparamos com situações inusitadas e provocantes para muitos. Algumas destas novas formas de contato vêm gerando polêmica entre os casais, motivando desconfiança, e até mesmo provocando o fim de relacionamentos tidos como sólidos.
Por exemplo, se antes um homem se masturbava vendo revistas ou filmes eróticos, hoje pode fazer o mesmo enquanto acessa sites que estão em constante atualização, ou ainda “vendo” uma mulher que está do outro lado do computador, e que pode realizar seus desejos, ainda que de modo virtual.
Neste caso, passamos a ter dois fatores presentes: não mais apenas a “imaginação” (ou seja, a fantasia), mas também a possibilidade da “presença” (ainda que virtual) de um “alguém” que realiza suas fantasias e ainda a complementa em conjunto.
E-mails trocados, ou conversas travadas em salas de bate papo podem ter um conteúdo altamente erótico. O acesso é fácil. Conhecer pessoas com um mesmo interesse também. Muitos, então, começam a se preocupar com o que o parceiro faz durante as tantas horas conectadas na internet. Então, um parceiro desconfiado pode vasculhar e-mails (invadindo a privacidade do outro) ou verificar que sites estão sendo visitados pelo outro, tudo em nome do medo da traição.
Normalmente homens e mulheres têm um conceito diferente do que seja a traição. Para alguns o fato de acontecer o contato físico é a única traição real. Para outros o envolvimento afetivo é a característica mais marcante.
É freqüente encontrarmos homens que acham que suas ‘pequenas escapadas’ são perfeitamente normais, e que suas mulheres devam compreender e relevar tal fato, uma vez que, nessa visão, o contato com a “outra” se resume ao físico e não envolve o afeto. Agora, se sua mulher adotar a mesma atitude, dificilmente esses mesmos homens a perdoariam, pois temeriam ser motivo da gozação de seus amigos. Ou ainda, para os homens de modo geral, permitir que um outro “tenha” fisicamente sua mulher, é sentido como se algo que lhe “pertence” fosse subtraído. Já para as mulheres, normalmente, a pior traição consiste na traição do afeto.
Porém, é desconfortável tanto para os homens quanto para as mulheres, saber que não é o “único” na vida do companheiro. Descobrir conversas mantidas por e-mails ou chats, ou a troca de fotos e imagens captadas por câmeras na web gera diferentes reações. Que estas formas de contato podem se tornar muito íntimas e pessoais não há dúvidas, mas a questão é como cada um (ou o próprio casal) encara tais situações.
Não existe uma regra válida para todos os relacionamentos, que defina de modo conclusivo o que seja (ou não) a traição, embora, de modo geral prevaleça o consenso de que o contato físico é sentido como a maior prova da falta de amor do outro. Mas, apesar de na internet não ocorrer o contato em sentido estrito, o ciúme invade o pensamento de muitos, do mesmo modo. A conversa sendo íntima permite à imaginação ir longe, compartilhando no espaço do virtual algo que antes só era dividido entre quatro paredes.
A fixação de um dos componentes de um casal por sites contendo fotos pornográficas, pode fazer com que seu parceiro se sinta menosprezado e excluído, como se tivesse defeitos a serem reparados, ou ainda possa supor que não é dotado de atrativos suficientes para satisfazer o companheiro.
Uma forma de lidar com estas complexas questões é a abertura da conversa franca dentro do próprio par, expondo-se as fantasias, sensações e pontos de vista de ambos. O objetivo seria, então, poder partilhar as necessidades do outro, desde que se respeite a própria vontade e limites individuais. Desse modo, a Internet talvez possa servir como um novo campo criativo, ou ainda um estímulo para que se amplie a experimentação da sexualidade. Ou ainda: um meio através do qual os casais possam enriquecer suas vidas sexuais.
A inclusão de um outro alguém na relação do casal geralmente é difícil de ser imaginada e compreendida, mas a fantasia humana não se limita a uma única pessoa, por mais que esta seja o grande amor de uma vida. Desejo e amor caminham juntos, mas não seguem regras únicas. Depende de cada um encontrar, junto com seu par, a forma ideal de relacionamento, e buscar estabelecer os limites do que pode (ou não) ser permitido dentro desta relação.
Cada relação é única, assim como cada pessoa que passa em nossa vida. Em se falando de sexualidade a única regra é a busca das formas de prazer que não invadam o espaço e/ou a sensibilidade do outro. Como em uma relação real, a avaliação das relações virtuais depende de cada casal, e a traição só pode ser vista e sentida como tal por quem está dentro dela, levando em conta as características deste casal, lembrando, ainda, que a única diferença é que agora estamos no campo digital na ação, mas o afeto continua a acontecer de forma “real”.