Somos reféns do WhatsApp?

por – Fabiane Manuchakian – psicóloga componente do NPPI

No dia 17 de dezembro de 2015, o aplicativo WhatsApp saiu do ar no Brasil por 48 horas, por determinação judicial da 1ª Vara Criminal de São Bernardo, cidade da grande São Paulo. Tal ação já havia sido tentada em fevereiro do mesmo ano com a alegação à Justiça que essa atitude auxiliaria uma investigação contra pedofilia.

Continua após publicidade

Uma reportagem feita pelo site Exame (1) revela que, em pesquisa feita pelo IBOPE, 93% dos donos de smartphones no País utilizam esse aplicativo de comunicação instantânea. Na sequência aparecem os aplicativos semelhantes do Facebook, com 79% e o YouTube, com 60%.

Como terá sido o comportamento das pessoas diante dessa notícia? E quanto ao não funcionamento do aplicativo mais usado pela população?

Foi possível observar manifestações em redes sociais sobre o assunto.(2) Algumas pessoas se mostraram indignadas, revoltadas, em busca de solucionar a “falta de serviço” e outros reagiram com senso de humor.

Alguns posts diziam que nos presídios o celular funcionava bem, mas para a população não. Outros, que o WhatsApp havia caído “antes do Cunha” (em alusão à Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, à época em situação polêmica no jogo político). E ainda, alguns posts dizendo que agora que estavam sem o aplicativo, haviam descoberto moradores novos em suas casas (se referindo na interação com a própria família).

Continua após publicidade

Muitas pessoas não conseguiram esperar 48 horas para ter seu aplicativo funcionando novamente e encontraram uma forma de burlar o bloqueio. Fizeram download de um aplicativo que fornecia um ip para o celular de outro país, porém os dados contidos no aparelho ficavam vulneráveis. Outra forma que alguns usuários encontraram foi fazer o download de outro aplicativo de mensagens, o qual funciona da mesma forma que o WhatsApp.

E então surge a pergunta: que dificuldade é essa, que se evidenciou de forma tão gritante na população, de ficar sem o serviço desse aplicativo? O que isso pode representar? Será que nos tornamos reféns desse recurso?

A princípio, devemos observar o fato de que essa foi uma manifestação social e muitos que se manifestaram podem ter reproduzido algo que de fato não sentem. Ou, se de fato sentiam, talvez essa seja uma expressão de que algo no campo do “real” não vai bem. O uso do aplicativo, e essa possível “dependência em massa”, pode estar servindo como motivo para não se olhar para o que de fato incomoda.

Continua após publicidade

Devemos também considerar tal circunstancia individualmente. E então, o fato de um aplicativo ficar inoperante pode ter gerado ansiedade, uma vez que hoje em dia estamos conectados o tempo todo.

O WhatsApp é famoso pela ágil forma de interação que propicia. Permite conversar individuais, mas também conversas em chats grupais. Forma-se um “grupo” que pode ser constituído de quantas pessoas seu criador resolver convidar. Sendo assim, o aplicativo em questão conecta as pessoas e é utilizado para que elas se comuniquem.

Embora já existissem outras formas de manter essa comunicação (Messenger do Facebook, sms, ligações), foi preciso buscar formas semelhantes ou até o próprio aplicativo, mesmo que seus dados ficassem em risco.

Parece que estar conectado da mesma forma que os aplicativos preexistentes gera mais conforto, como se o diferente incomodasse e fosse causa de ansiedade. E não ter esse serviço, talvez fizesse com que as pessoas percebessem sua dificuldade em estar presente fisicamente e mentalmente com os outros.

Outro ponto sobre o qual podemos refletir é pelo fato da pessoa “receber” uma mensagem e, pela falta de serviço do aplicativo, não conseguir visualizá-la. O imediatismo dessa ferramenta não estaria funcionando. Esse imediatismo interfere no comportamento das pessoas nos dias de hoje, como uma forma de controle, ansiedade e até de satisfação.

Talvez a satisfação imediata, gerada pelo uso em excesso da tecnologia e pelo uso de aplicativos de comunicação e redes sociais esteja gerando uma população com dificuldade de interação social real (presencial) e assim, se tornando refém de seus smartphones e seus variados recursos.

1 – http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/whatswapp-e-bloqueado-por-ordem-judicial
2 – http://oglobo.globo.com/economia/bloqueio-do-whatsapp-repercute-nas-redes-sociais-18315880