por Sandra Vasques
"Sou gay e sinto muita dificuldade para arrumar namorado. Às vezes chego a pensar que o amor homossexual é uma utopia. Me assusta a futilidade dos gays, pois sou considerado um homem bonito, e mesmo assim sofro muitas rejeições. Sinto que meu problema é minha idade. Não sou muito novo, tão pouco velho, tenho 27 anos. Porém, pela minha experiência, percebo que os homens mais velhos querem garotos novinhos, na faixa dos 16 aos 23 anos, e os novinhos querem caras de sua faixa de idade. Eu me sinto num limbo… Tenho perfis em diversos sites de relacionamentos, mas quando digo minha idade, sou rejeitado, inclusive por caras com idade para serem meus pais, pois eles querem caras de no máximo 23 anos. Já fui muito exigente em minha procura e agora resolvi relaxar meus limites ao mínimo aceitável, abrindo mão de quase todos os pré-requisitos, e mesmo assim não obtenho sucesso. E para piorar, sexualmente sou passivo e não abro mão disso. Não sei se a senhora sabe, a maioria dos gays são passivos, depois vem os versáteis e depois, bem longe, os ativos. Para constatar essa estatística, basta entrar em qualquer chat de encontro gay. Isso tudo só piora minha busca e solidão. Meus amigos dizem que jamais serei feliz sendo gay, pois são relações vazias e sem finalidade; dizem que deveria ser hetero. Às vezes penso nessa possibilidade, pois ficar sozinho, não vem a calhar né? O que devo fazer?"
Resposta: Deixar de ser gay não é possível. O que seria possível, é abrir mão de viver o seu desejo, que vai permanecer dentro de você, lembrando que ele existe e anseia por se realizar.
Assim, essa opção é muito perigosa e tem grande chance de não trazer a felicidade pretendida. Assim, um caminho mais saudável é entender o que está acontecendo de verdade e que o impede de ter uma companhia legal.
Além disso, algumas afirmações que você faz, apesar de acreditar que não tenha sido sua intenção, soam preconceituosas, como dizer que o amor gay é uma utopia, ou falar da futilidade dos gays e que as relações são vazias e sem finalidade.
Para alguns isso pode ser verdade, assim como acontece em relacionamentos héteros, mas não se pode generalizar. As pessoas querem ser felizes e buscam esse objetivo. É verdade que muitas vezes as pessoas pegam caminhos errados, mas daí, em primeiro lugar, é preciso olhar para dentro de si e perceber se não é necessário um pouco mais de autoconhecimento, para ver se essa tomada de decisão não foi resultado de uma fragilidade que precisa ser corrigida a partir de dentro e não no outro.
Essa teoria de desencontro das idades, com certeza pode ser verdade para uma parcela de homens, cujo principal interesse é apenas vivenciar o sexo na relação. Mas para aqueles, que além de um bom sexo querem também companhia interessante e estimulante, a idade, em especial a sua que é de um homem jovem, não vai ser um fator que dificulte.
Se você quer um amor para chamar de seu, vai precisar apresentar quem você é com conversas que envolvam assuntos como preferências culturais, musicais, suas avaliações de fatos cotidianos, se interessar pela vida do outro e abrir, pelo menos um pouco da sua. Enfim, vai precisar mostrar qual o seu interesse principal, que não é o sexo, mas principalmente estabelecer uma relação. É claro que o sexo também é desejável, mas a partir de uma conversa como essa, o interesse pode surgir com um outro formato mais propício para começar um relacionamento. No meio da conversa pode surgir um jogo sensual, um diálogo erotizado, mas, além disso, já vai existir uma imagem de parte de quem você é, além do sexo e das carícias.
Quanto a ser passivo, isso é um fato, é o que você prefere, então, em meio a sua busca vai ser aprovado por alguns e rejeitado por outros. E isso faz parte do jogo na busca de um relacionamento.
Temos preferências, valores, gostos, jeitos, que nos aproximam de algumas pessoas e nos afastam de outras. É claro que se nos pegamos muito tempo sozinhos, é bom avaliar se uma determinada característica pode estar dificultando as aproximações. Às vezes não conseguimos fazer isso sozinhos e precisamos da ajuda de amigos e até de um psicoterapeuta para ajudar no autoconhecimento e resolução de conflitos.
Não estou negando que nas relações homossexuais exista uma importância grande da busca pelo sexo, e um sexo bom. E esse fato não é um problema ou defeito, afinal, sexo é uma coisa boa e gostosa e dar valor a essa parte da vida deveria ser natural em qualquer relacionamento, homo, bi ou hetero.
O risco é acreditar que só um sexo bom, com alguém de aparência superbem cuidada pode trazer a satisfação pessoal desejada. Não traz. A menos que o contrato entre os pares seja explícito no sentido de só querer mesmo sexo e prazer sexual daquela relação. Se o objetivo não é esse, estar com um parceiro jovem, malhado, gostoso, pode fazer bem para a autoestima e durante os momentos em que estão transando. Mas quando ficam lado a lado, sem esse estímulo, vem o vazio, porque não existe intimidade, empatia. Prá existir isso, tem quem haver conversa, parceria, conhecimento um do outro, admiração, encantamento. Para isso é preciso tempo e investimento na relação, seja pela Internet, ou por meio de um encontro cara a cara.
Então, avalie se nos espaços onde você está buscando parceiros, existe condição de mostrar um pouco mais de você, além de seu corpo e sua idade. Afinal, se você quer flores, não dá prá ir procurar na farmácia, tem que ir na floricultura. E chegando na floricultura, tem que saber que flores você quer, mas se tiver por lá um surpreendente ramalhete de cores vibrantes, porque não tentar o inesperado?
Agradeço a importante participação de Luciano M. Mendonça Filho, estudante de filosofia da USP, para a realização deste texto.