por Regina Wielenska
Tenho observado como as pessoas cada vez mais parecem depender fortemente de seus celulares ou tablets.
Fico intrigada com alguns casais que vão jantar fora e ficam calados, cada um com seu aparelho, os dois envolvidos com e-mails, mensagens no Facebook e outras coisas. Para que teriam saído juntos? Mera obrigação, para cumprir tabela? Não tenho respostas. Apenas constato que a comunicação entre eles parece mínima e passam o tempo da refeição principalmente se relacionando com o aparelho.
Talvez a navegação na web seja a salvação honrosa para um convívio insuportável, ainda que obrigatório. Ou será quase o inverso: esses e outros gestos de sutil descaso é que mataram a afetividade que outrora existiu entre os parceiros?
Ontem vi um comercial no qual o pai dirige a perua, acompanhado pela esposa no banco do passageiro. Atrás, na primeira fileira, estão três crianças, cantando em voz alta acompanhando o som ligado em alto volume. Na fileira de trás está o quarto filho, que tenta falar com os pais, mas a cantoria atrapalha. A solução foi ligar para o celular do pai, o qual, mesmo dirigindo, reconhece o número, e atende pelo viva voz (aliás, péssimo exemplo num comercial). O garoto apenas queria que parassem num posto para que ele pudesse ir ao banheiro… Volume extremo, mal dava para ouvir a voz interior…
Há um tempo me senti impelida a falar para meus alunos como eu me sentia enquanto eles teclavam ao celular durante a supervisão de casos. Com seu comportamento deixavam de captar o olhar dos colegas e da supervisora, as expressões faciais se perdiam, eles deixavam de dar opiniões, sua contribuição intelectual diminuía porque ficavam menos sensíveis ao que se estava discutindo. Os jovens se acham “heróis multitarefa’, mas a neurociência parece sugerir que a qualidade do desempenho tende a diminuir se dividimos nossa atenção para muitas coisas simultâneas (foram publicados artigos interessantes com Suzana Herculano-Houzel no caderno Equilíbrio da Folha de São Paulo e outros veículos, exatamente a esse respeito).
Crianças, desde que nascem, iniciam um processo refinado no qual aprendem a dirigir o olhar aos adultos que delas cuidam. É assim que conhecerão o mundo. Uma coisa importante é se tornarem capazes de interpretar expressões faciais, preciosas pistas complementares aos outros comportamentos verbais e não verbais de nossos interlocutores. Precisamos trocar olhares com nossas crianças, para o bem de seu desenvolvimento.
Outra coisa: se eu olho para minha criança enquanto conversamos, por meio de meu modo de agir estou dizendo a ela o quanto prezo nossa convivência próxima. Atenção exclusiva faz um bem enorme ao filho, que se sente importante, validado, especial. Entendo que médicos em plantão remoto precisam a todo custo atender a chamadas. Mas por que pessoas desobedecem a ordens de desligar aparelhos em salas de espetáculo e até aviões, mesmo que isso coloque em risco a segurança do voo? De que vale ir ao cinema para não se divertir com a película? Os músicos não merecem nosso respeito na sala de concerto?
Meu artigo é um pedido: olhem de verdade para aqueles com quem supostamente interagem, abram seus ouvidos e coração para entenderem o que se passa, escolham tarefas relevantes e mergulhem fundo no que fazem. Viver de verdade é para gourmets. Glutões navegam na internet durante o concerto, namoram sem paixão, jantam sem saber o que comem, não conhecem o brilho do olhar de um filho ou o olhar vazio do amigo em depressão