por Regina Wielenska
Não sou especialista no tratamento de crianças com desenvolvimento atípico. Mas aprendi uma coisa com meus amigos que atuam nessa área: aprender a sustentar o olhar com o interlocutor é uma habilidade básica, e deve fazer parte das etapas iniciais do treinamento.
Pelo olhar aprendemos muito sobre o mundo das emoções.
As variações de expressões faciais dos primatas são uma área maravilhosa de estudo. Há nuances infinitas de expressão de emoções por meio de gestos, voz, expressões faciais, mesmo num momento da cultura no qual a toxina botulínica impera, imobilizando grupos musculares de quem deseja um rosto liso, sem aquelas rugas que talvez nos informassem o quanto o interlocutor sorriu ou "fechou a cara" ao longo de seus dias.
Devo a ideia dessa pauta a uma pediatra, preocupada com alguns pequenos pacientes que praticamente só encaram de verdade uma tela de LCD. Refeições nas quais uma família esteja reunida têm se tornado incomuns; este é um exemplo de um evento cotidiano potencialmente rico em oportunidades de aprendizagens. Não se trata apenas de comer, mas de comer enquanto cada um se alimenta de valores, informações sobre a subjetividade do outro, um monte de coisas importantes atravessam a sala de jantar, unindo os convivas. A condição essencial é que em cada pessoa haja um par de ouvidos e/ou de olhos antenados no ambiente social.
Acontece que atualmente a situação mais comum, seja no cotidiano das famílias ou mesmo em reuniões de trabalho, situações de romance, no cinema, no teatro, nas salas de aula, quase em qualquer lugar, é que os olhares estejam voltados para um tablete, TV, computador ou celular. Já atendi uma família que se comunicava por mensagem de texto estando na mesma casa. Mães superatarefadas se sentem tranquilas deixando seus pequenos assistindo a vídeos e brincando com um celular ou tablet. Dá para entender as razões pelas quais agem assim.
Tablet demais e olho no olho de menos na vida de uma criança e adolescente podem prejudicar seu desenvolvimento emocional, reduzindo sua capacidade de ser empática e de interpretar as nuances do comportamento das pessoas significativas que a cercam. Não demonizo games e apps, mas isso tudo é como remédio: há doses que curam e outras que intoxicam.