por Thaís Petroff
“Quanto mais rápido for possível aceitar isso e se adequar, tanto menos sofrimento haverá.”
A grande maioria das mães de primeira viagem (se não todas), quando descobre que está grávida, começa a se organizar com o enxoval do bebê e a pensar no parto. O mais longe que os pensamentos e o planejamento conseguem ir é até o momento do parto, mas, dificilmente passam muito disso. Sim, é lógico, como a futura mamãe não tem nenhuma vivência ainda de um dia a dia com o bebê não tem como entrar em contato com esse futuro. No entanto, saber de algumas coisas com antecedência e já preparar a cabeça pode evitar muito sofrimento.
O que percebo é um choque de realidade muito grande após a chegada do bebê. A mídia vende uma ideia muito cor-de-rosa em relação à maternidade. Ser mãe de filho pequeno é como se passasse um furacão e deixasse tudo ou quase tudo de pernas para o ar para que você tenha que rever cada uma das coisas, escolher um novo lugar para elas, se ainda quer ficar com elas ou não. Não dá para as coisas serem como eram antes. Quanto mais rápido for possível aceitar isso e se adequar, tanto menos sofrimento haverá. Sou mãe, atendo mães, tenho amigas mães e tentar levar a vida como era antes do bebê nascer, é certeza de frustração, irritação, angústia, tristeza e percepção de fracasso.
Tornar-se mãe vai muito além do parir um bebê ou adotar um: é todo um processo de se remodelar internamente para se adaptar à nova situação.
Tempo materno
Você se julgava uma pessoa bastante eficiente. Seus colegas de trabalho e amigos te elogiavam pela sua proatividade e agilidade em fazer as coisas. Você conseguia fazer várias coisas ao mesmo tempo e ao final do dia finalizava uma lista grande de tarefas. E, depois de tudo, ainda tinha energia disponível para sair à noite.
Se você se identifica com esse modus operandi e quer ser uma mãe presente, necessariamente terá que rever essa atitude. Bebês e crianças pequenas demandam atenção, MUITA atenção. Eles precisam de você e, na maior parte das vezes as coisas precisam ser feitas naquele momento, não dá para deixar para depois: o bebê está com fome, fez cocô e a fralda está suja, caiu e se machucou, quer companhia para brincar etc Seu tempo ficará escasso, pois será direcionado a atender as necessidades do seu bebê. De fato são necessidades sim! Diferente de desejos que podem ser procrastinados.
Dizer a todo momento a seu filho de dois anos que agora você está ocupada, além de, a curtíssimo prazo gerar irritação nele e em você, (pois, ele continuará insistindo), a médio e longo prazo gerará nele a percepção de uma mãe indisponível, um sentimento de desamor e de desamparo. Ocupá-lo, deixando-o na frente da TV para distraí-lo terá um resultado muito parecido, além de outros possíveis problemas de aprendizagem no futuro. Por isso, é difícil, mas vale mais diminuir a lista de afazeres do seu dia e baixar sua expectativa na quantidade de coisas que você pode resolver por dia e acompanhar o tempo dele. Sim, se você estiver presente com ele (brincar com ele, passear com ele), ele irá dormir e, nesse tempo, você poderá se dedicar a fazer o almoço, responder e-mails, ligar para alguém etc.
Quanto mais lutar em ter que fazer as coisas no momento em que você quer (como acontecia antes do bebê nascer) maior a sensação de frustração, irritação e fracasso. Sempre há a possibilidade de quando tiver algo realmente urgente e importante para fazer, pedir a alguém que fique um pouco com o bebê até que você finalize sua atividade.
Tempo de mãe precisa ser diferente
A questão a ser revista é que o tempo das coisas muda, enquanto tentarmos manter a mesma cobrança de eficiência de antes, certamente os resultados serão desastrosos. Tempo de mãe é e precisa ser diferente. Ser mãe não combina com tempo acelerado, competitividade, eficácia em entrega de resultados. Se cobrar isso é uma autoviolência e também ao bebê.
É por isso que se você sempre foi uma pessoa muito autônoma e independente, precisará compreender que agora necessita de apoio e auxílio. Sem isso terá que abrir mão de tempo e energia que deveriam ser direcionados ao bebê (e que ele certamente irá reclamar) para fazer outra coisa; além do mais, sem pedir ou receber ajuda, você irá perceber que o tempo para você mesma inexistirá. Esse é um dos piores quadros, pois você ficará exausta e muito triste por não poder fazer mais nada para si mesma e, possivelmente, se frustrará e se irritará com o bebê que continuará a demandar sua atenção.
Não preciso nem dizer que sua energia que antes estava a mil e na maior parte das vezes havia de sobra, agora passará a estar em falta.
Padecer no paraíso
Quer dizer então que ser mãe é “padecer no paraíso”? Dependendo de como você perceber e lidar com a situação, sim! Poderá ser um processo deveras dolorido e sofrido. Entretanto, como algumas mudanças de perspectiva será possível vivenciar esse processo de um modo muito mais saudável, funcional e alegre.
Tornar-se mãe é um processo transformador. Não é à toa que temos 9 meses para nos preparar para o que há por vir. Não se trata somente de transformações no corpo da mãe (que passa justamente de um corpo de mulher para um corpo de mãe; onde mudam as formas, os seios começam a gerar leite etc) mas também transformações na cabeça e percepções dessa pessoa que agora se tornará responsável por outro ser, além de si mesma.
Ser mãe é acolher um outro em seu ventre e posteriormente em sua vida. Dessa maneira, é necessário abrir espaço para que esse outro ser possa caber. Em uma vida tão corrida ou comprometida com “n” compromissos e atividades não há espaço ou lugar para esse que está por vir. Se faz preciso abrir mão de coisas. A melhor maneira para fazer isso é rever as prioridades. Sim, haverá luto, pois a vida de antes terá que morrer para uma nova nascer. Nada mais será como era antes, no entanto, tantas coisas novas surgirão. Se não desapegarmos, ficaremos continuamente comparando passado com presente e sofrendo com isso.
Um excelente chamamento para a reflexão e reorganização das prioridades nesse momento é assistir ao desenho (que não é para crianças, mas sim para adultos) recém-lançado do “Pequeno Príncipe”, no qual este, com muita sapiência, nos leva a rever nossas crenças e valores com relação ao que é realmente importante, nos questionando o quanto as coisas “do mundo dos adultos” precisam de tanto foco, rigidez ou são tão “essenciais”.
Não pretendo com esse texto esgotar a questão da autorreflexão e transformação que a maternidade nos convida a fazer, mas sim apontar o quanto, se não olharmos para as demandas que se desvelam e não nos reciclarmos, perderemos a oportunidade de grandes aprendizados e transformações. Dessa forma, poderemos aflorar uma grande vivência de incapacidade e através desta muito sofrimento.