Sim, existe uma pandemia. Sim, gripes sempre existiram. Sim, temos que nos cuidar. Sim, os governos de todos os países estão fazendo o que podem pela saúde pública. Mas… e a saúde individual? Como fica?
Ao acordar hoje pela manhã recebi um WhatsApp da minha filha:
– Mãe me avise quando acordar pois preciso falar com você.
– Ihhh perigo no ar. Assim cedo? Algum neto levou um tombo e foi parar no hospital? Não vai ter aula hoje e a programação mudou?
– Não. Muito pior: mãe, meu irmão (sim, tenho um filho médico) disse que você e o pai devem ficar longe das crianças por causa do surto. Então hoje, eles não irão na sua casa como toda sexta-feira, ok? Até que o surto passe etc, etc.
Segurei o choro. Não que eu não estivesse preparada para isso. Ontem mesmo, li na internet a recomendação de alguns médicos: “as crianças são assintomáticas para o coronavírus, então, como elas mexem em tudo, podem estar doentes e contaminar a casa dos avós”. Claro, só elas não é? Marido e filho médico, que vivem no hospital, não mexem em nada, colocam luvas e máscaras sempre e estão absolutamente isentos de qualquer contaminação assintomática. Adultos em supermercado ou no banco também. Pois é, a lógica impera… Tudo bem, o que vale é a lógica estatística. O que vale é a lógica médica. O que vale é a lógica midiática. Que se dane a lógica formal.
Minha filha acaba de me ligar…
– Mãe, não quero que você fique chateada. Podemos passear na rua com as crianças, se elas encostarem em você, você leva álcool gel, e…
– Chega. O estrago está feito.
Está certo, sou psicóloga e me preocupo com o lado individual e psicológico de quem está no meio de uma pandemia. O governo cuida da saúde pública. Mas eu tenho que me expressar sobre o rombo que o cuidado público imposto, sem sensibilidade, pode causar nas pessoas. Falo na primeira pessoa, claro, talvez esse não seja o sentimento de todas as vovós; talvez muitas me critiquem e digam que minha reação é infantil:
– Como pode uma psicóloga ser tão cega?
Estou triste. Muito triste. Pela primeira vez do alto dos meus 69 anos me senti velha. Senti que a estigmatização começa aí, disfarçada de cuidados com a saúde. Sou uma pessoa saudável, que trabalha, tem hobbies e cuida dos netos com muito prazer. De agora em diante não sei… ou melhor, eu que me prepare para o que me espera. Mas eu vou saber sair dessa. Espero que as outras vovós também!