Por Aurea Caetano
O neurocientista Sidarta Ribeiro, brasileiro, acaba de lançar o livro “O oráculo da Noite: A História e a Ciência do Sonho”. O autor propõe “uma combinação surpreendente de sabedoria ancestral e biologia do século 21 como caminho para recuperar a importância dos sonhos para a mente humana”. (Reinaldo José Lopes, FSP 29/07)
Ribeiro vem há bastante tempo estudando os sonhos, do ponto de vista científico por assim dizer, retomando as ideias propostas inicialmente por Freud acerca de sua importância não apenas para a ampliação da consciência do sonhador mas também para manutenção da saúde. Sabemos hoje que sonhos são parte do funcionamento normal e são essenciais do ponto de vista neurofisiológico.
Um dos primeiro estudos acerca desse tema, o livro “A interpretação dos Sonhos” foi publicado por Freud em 1900; Jung entrou em contato com o livro e a partir do encantamento provocado pela leitura inicia sua correspondência com Freud, em 1906. No ano seguinte, 1907, em um primeiro encontro conversam durante 13 horas ininterruptas, tal o fascínio que os uniu. A relação entre os dois, iniciada a partir deste momento, é aprofundada através de uma intensa correspondência na qual eles se aproximam teórica e pessoalmente e se encerra em 1912 quando Jung publica sua obra então chamada “Metamorfoses e Símbolos da Libido”.
Sonhos: aberturas para o inconsciente
Para Jung, os sonhos são sim “aberturas” para o inconsciente, mas, diz ele: “Para mim, os sonhos são natureza, e não encerram a menor intenção de enganar; dizem o que podem dizer e tão bem quanto o podem” MSR, pg. 226. Ainda de acordo com Jung “O grande mérito de Freud foi o de ter aberto uma pista para a pesquisa e a interpretação do sonho. Ele reconheceu, antes de tudo, que não podemos empreender nenhuma interpretação sem a colaboração do próprio sonhador”. (OC, Vol VIII, par. 539)
Para Ribeiro, os sonhos podem se revelar a mais importante via de acesso ao inconsciente humano e ao potencial criativo da mente. Ao se negar a explorar essa via, a humanidade moderna está deixando de lado uma fonte quase inesgotável de possibilidades para enfrentar os novos desafios, aparentemente insolúveis, que surgiram nos últimos séculos. Reaprender a interpretar os sonhos com as ferramentas científicas seria quase questão de sobrevivência.
Desde os primórdios da humanidade os sonhos têm sido vistos como espécie de oráculos (como nomeia Ribeiro em seu livro). Como todo oráculo, ele não é direto, não diz o que deve ou não ser feito, há que se ter o trabalho de procurar entendê-lo, de utilizar os conteúdos por ele trazidos à consciência para ampliar nosso campo vivencial.
“Sonhários”
Sonhos têm sido utilizados por nós, analistas, como material básico de trabalho. Pedimos a nossos pacientes que anotem seus sonhos, fazendo uma espécie de diário deles, ou sonhários. Juntos, em nossas sessões, os analisamos, amplificamos, procurando compreender o que podem estar dizendo a respeito do processo da pessoa em questão.
Um caminho para interpretar os sonhos
Sonhos poderão funcionar como guias sim, mas, de forma mais ampla, desde que possamos sempre nos perguntar qual o sentido deste sonho, neste momento de vida, neste contexto específico. A elaboração e o trabalho com material onírico é sempre, de forma especial em um contexto terapêutico, relação da consciência com o material que surge do inconsciente e que não é nem bom nem ruim. Apenas é, e há que ser reconhecido desta forma sempre.
O livro de Ribeiro é muito importante, na medida em que traz novamente à consciência coletiva, um material que sempre esteve acessível, mas que para muitos permanecia esquecido e até subvalorizado. E mais ainda, na medida em que contextualiza e mostra de forma acessível, sua neurofisiologia.