Um dia a saúde se prescindirá dos hospitais?

Por Ricardo J.A. Leme

O filósofo e pedagogo Ivan Illich convida a pensar uma sociedade em que a educação aconteceria sem escolas e a saúde sem hospitais. Loucura? Absolutamente! Em obra extensa e de clareza surpreendente, o autor aponta caminhos para a construção da inusitada proposta. https://vimeo.com/66948476 – Entrevista com Ivan Illich

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Os ministérios da educação e saúde devem ser alertados para que autores dessa qualidade sejam traduzidos com maior urgência. Afinal não é mais possível negar que saúde se aprende, educação é que cura.

 

Hermes e Asclépio com três de suas filhas e alguém que implora – imagem acima 

Hermes é a divindade grega relacionada ao comércio e seu símbolo é o caduceu; Asclépio é princípio da prática médica, citado após Apolo no Juramento de Hipócrates. Na figura acima, aparece acompanhado de três de suas filhas: Higéia (higiene, limpeza e prevenção), Panacéia (a solução para todos os males, a síntese da saúde) e Meditrina (longevidade). Iaso (recuperação da doença), Agléia (Esplendor, Graça e Beleza) e Aceso (o processo da cura) também são suas filhas, apesar de não retratadas aqui.

Os símbolos auxiliam o humano na lembrança de conceitos e saberes predispostos à corrosão temporal e, portanto, dos valores com os quais se relacionam; no presente caso vem à tona a relação entre a arte e os aspectos mercantis relacionados. Caro amigo, observe o olhar de Asclépio para Hermes assim como a posição de súplica do homem na representação acima e meditemos…

A imagem grita o que palavras apenas balbuciam. Lembre-se ao saborear as belas propagandas oferecidas na atualidade; as maiores inverdades são, geralmente, contadas por personagens bem aparentados, em muitos casos contraexemplos práticos das mensagens propagadas. Já se disse que a mentira repetida muitas vezes se torna verdade; repitamos verdades apenas e que por inanição o que é inverdade deixe de ser.

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Illich, no contundente texto Medical Nemesis, apresenta com lucidez ofuscante os tópicos que esclarecem a tensão saúde-doença, assim como a cri$e de confiança que a medicina moderna atrave$$a. Veja-se ainda o aumento exponencial pela procura de cursos de medicinas integrativas, paliativas, complementares, antroposófica, chinesa, ayurvédica, homeopatia, ortomolecular, nutrição funcional, acupuntura além de técnicas em processo de incorporação pelos órgãos regulamentadores (ANVISA, CFM) como a ozonioterapia, a termografia, e auto-hemoterapia entre inúmeras outras. Lembremos, na perspectiva de “saúde é consciência”, que: cuidar da saúde é simples e barato, correr atrás da doença, complexo e dispendioso.

Segundo Ivan, a emancipação requer vontade e para tal o pensar não pode estar alienado ou anestesiado; a pessoa deve fazer algo para melhorar (ser agente) e não esperar que o terapeuta faça algo por ela (ser paciente). O professor defende que a criação de instituições, hospitais e escolas, que se propõem a “tratar” das pessoas enfraquece a própria natureza das pessoas em relação a seus deveres e autocuidado.

Nas palavras de Illich em 2003 no Journal of Epidemiology & Community Health:

“A habilidade humana em lidar com sua fragilidade, individualidade e capacidade de se relacionar de forma autônoma é fundamental para sua saúde. Na medida em que a pessoa se torna dependente na lida com sua intimidade ela renuncia à sua autonomia e sua saúde declina. O milagre verdadeiro da medicina moderna é diabólico. Ele consiste em fazer não apenas indivíduos, mas populações inteiras sobreviverem em desumanamente baixos níveis de saúde pessoal. Apenas os operadores de sistemas de saúde não sabem que a saúde diminui na mesma medida em que se oferecem mais serviços de saúde, precisamente porque suas estratégias decorrem de sua cegueira à inalienabilidade da saúde.”

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Abaixo, um pouco mais do trabalho desse humano que até pouco esteve entre nós:

A Segunda Crítica Social da Saúde de Ivan Illich

 O estatuto da medicalização e as interpretações de Ivan Illich e Michel Foucault como ferramentas conceituais para o estudo da desmedicalização.

Vamos pensar a respeito?