por Danilo Baltieri
Caso provoque, após qual período sem uso, o cérebro pode vir a recuperar-se ou melhorar em relação a esses dois problemas?
Resposta: A avaliação dos prejuízos neuropsicológicos relacionados ao consumo crônico de maconha continua desafiando pesquisadores ao redor do mundo. Muitos estudos têm demonstrado prejuízos cognitivos significativos no período inicial de abstinência de maconha, mas têm dificuldades na demonstração de comprometimentos residuais.
Multiplicidade de variáveis confunde resultados
Na verdade, existe uma multiplicidade de variáveis que podem confundir os resultados das pesquisas, como idade de início, tempo de consumo, intensidade de uso da substância, número e tipo de substâncias utilizadas, transtornos psiquiátricos e psicológicos *co-mórbidos, concentração do tetrahidrocanabinol (THC) na maconha consumida, dentre outros.
Estudos com usuários crônicos de substâncias psicoativas têm verificado muitos déficits cognitivos semelhantes aos encontrados em pacientes que sofreram lesões funcionais no lobo frontal do cérebro, como por exemplo, maior impulsividade, dificuldade de mudar um conceito para outro (menor flexibilidade mental), dificuldade para mudar um comportamento depois de iniciado, dificuldade em integrar detalhes isolados ou informações simultâneas, incapacidade para utilizar conhecimentos específicos em uma ação determinada, etc.
Aspectos fundamentais: freqüência e tempo de uso
Seguramente, a freqüência e a duração do uso são aspectos extremamente relevantes a considerar nas avaliações dos dependentes de maconha. Infelizmente, muitos dos relatos dos usuários sobre esses dois itens não são fidedignos, o que acaba por prejudicar os resultados das pesquisas.
Na verdade, apesar das alterações cognitivas provocadas pelo consumo crônico da maconha, como as citadas acima, elas podem ser compensadas por mecanismos neuroadaptativos desenvolvidos entre consumidores crônicos, ou seja, determinadas áreas cerebrais tentam “compensar” falhas de outras áreas comprometidas. Isso é consistente com estudos de ressonância magnética funcional os quais têm demonstrado a ativação de áreas cerebrais compensatórias durante a realização de tarefas cognitivas.
Os prejuízos cognitivos, em termos de memória, atenção e aprendizagem, são mais evidentes durante a prática clinica. No entanto, nos estudos controlados, isso tem sido difícil de demonstrar, tendo em vista as limitações acima mencionadas.
Certamente, existem muitas dúvidas ainda não esclarecidas sobre os efeitos do uso crônico da maconha e sobre a reversibilidade ou não dos déficits. Diante disso, neste momento é muito difícil afirmar algo sobre a reversibilidade dos prejuízos de memória e aprendizagem. O que é possível afirmar é que quanto mais cedo o usuário interromper o consumo da substância, quanto mais cedo ele estiver sob adequado tratamento médico e psicológico e quanto maior o apoio e estímulo dos familiares e amigos para a cessação do consumo da droga e a aderência aos tratamentos, melhor será o prognóstico desse indivíduo.
Por se tratar de tema denso, recomendo a leitura do seguinte artigo científico:
Almeida, P. P., Novaes, M. A., Bressan, R. A., & Lacerda, A. L. (2008). [Review: executive functioning and cannabis use]. Rev Bras Psiquiatr, 30(1), 69-76.
*Mórbido: adjetivo 1 Rubrica: medicina. relativo a ou que revela doença, enfermidade 2 Rubrica: medicina. que origina, que causa doença(s) Ex.: vício m.
3 oriundo de ou que denota desequilíbrio psíquico; que apresenta alguma anormalidade; doentio (Fonte: Dicionário Houaiss)