por Patricia Gebrim
Pouco se fala sobre a morte. Como se, ao silenciá-la, pudéssemos negar sua existência. No entanto, quando os ruídos do dia se calam, tudo fica escuro, e o único som que ouvimos são as batidas do nosso coração, vem a nós a súbita consciência de que a vida, ao menos como a conhecemos, tem um fim.
Em algum momento da vida todos nos deparamos com a verdade de que, nesta nossa realidade, nada está destinado a durar para sempre. Mesmo os espiritualistas, que acreditam que a vida possa prosseguir após a morte, precisam render-se ao fato de que esta vida atual enfrentará um fim.
Precisamos aceitar a existência da morte, não necessariamente a morte da alma, mas a morte do ego, dessa personalidade que aprendemos a chamar de Eu. Precisamos aceitar, pois é algo que não podemos evitar. Essa aceitação é um ato de humildade necessário a qualquer um que queira viver bem.
Dessa forma, a primeira grande função da existência da morte é nos ajudar a nos livrarmos da arrogância de acreditarmos ter controle sobre tudo. A morte nos torna humildes, nos iguala a qualquer forma de vida, a morte transforma tudo o que vive em uma mesma poeira que se mistura à terra. A morte nos transforma em algo fertil, que ajuda plantas a florescerem. A morte nos ensina algo lindo :
– Somos todos iguais.
Os orientais sabem, muito melhor do que nós, ocidentais, lidar com a morte. Conseguem vivenciå-la com aceitação e reverência. Muito temos a aprender.
Não importa o tipo de morte com a qual tenhamos que lidar. A morte de uma pessoa querida, a morte de um relacionamento, o fim de um trabalho, a morte de um sonho, de uma crença… A sabedoria está em aceitar, aceitar o inevitável, aquilo que não podemos controlar. Sem aceitação, a dor se torna uma espada constantemente fincada em nosso coração.
Precisamos introduzir a morte no âmbito do que é natural. Fugimos até mesmo de falar sobre ela, e muitas vezes, pessoas que estão percebendo a chegada desse momento em suas vidas, não podem sequer falar sobre o que sentem. Precisam sorrir e fingir que durarão para sempre.
Precisamos aprender a aceitar e facilitar os fins. Um casamento que termina, um amor que se desfaz, um emprego que já não nos faz felizes.
– Por que não podemos aceitar? Deixar ir? Mudar?
Na aceitação das inúmeras mortes que vivenciamos em vida é que nos preparamos para a transformação maior de nossa existência, o ato final. Para morrer em paz, é preciso que tenhamos aprendido a viver em consonância com a realidade, ter sido quem de verdade somos; é preciso que tenhamos tido a coragem de nos mover quando nossa alma assim sinalizar, nos desapegar das falsas seguranças, nos transformar.
A melhor preparação para a morte está em aceitarmos a vida em todas as suas nuances e na escolha de fluir com ela, libertos, em voos plenos de confiança. Confiar na vida faz com que possamos também confiar na morte, pois vida e morte, como claro e escuro, são duas polaridades de uma mesma existência.
Muitos morrem em vida. Nunca permitem a si mesmos serem quem de verdade são. Assim, chegam ao fim desta vida sem ter vivido e a morte os envolve na súbita consciência de que não há como voltar atrás. Mas não precisa ser assim. Assim sendo… Viva. Viva intensamente, consciente de que cada dia é um presente incrível cheio de oportunidades. E deixe ir o que tiver que ir, morra sempre que necessário, de maneira que vida e morte façam uma aliança tão forte que nunca uma possa existir sem a outra.