por Angelo Medina
Para se dar bem na carreira profissional, não basta somente competência e excelência de resultados a curto prazo. É preciso ter um bom fair play, jogo de cintura, saber lidar com o chefe e gerir a carreira como um todo.
Nesta entrevista ao Vya Estelar, o escritor, jornalista e economista, Max Gehringer, que acaba de lançar o livro, Não Aborde o Seu Chefe no Banheiro, (E. Campus), revela dez mancadas que podem arruinar a sua carreira. Ele diz como preparar um currículo, como proceder numa entrevista, como se comportar no ambiente de trabalho e gerir a carreira. E é claro, como lidar com o seu chefe.
Vya Estelar – Meu chefe, abusando de seu poder e autoridade, me deu um grande bronca? O quê fazer?
Max Gehringer – Se a bronca foi merecida, o melhor é assumir o erro. Se o tom do chefe for de alguns decibéis acima do normal, uma resposta curta e em tom sussurrado normalmente faz com que ele baixe a voz na sentença seguinte. Agora, se o funcionário não tem culpa de nada e o chefe está descarregando em cima dele todas as suas frustrações pessoais, só há um conselho prático: é mais fácil mudar de chefe do que mudar o chefe.
Vya Estelar – Você percebe que o seu chefe não te topa? Tem como reverter esta situação?
Max Gehringer – Só há dois motivos, profissionalmente falando, para um chefe não gostar de um funcionário: ou o funcionário é incompetente demais, ou é competente demais. O segundo caso é o mais grave, porque o chefe fica com inveja e com medo do funcionário, e faz o possível para mantê-lo sob controle. Mas há funcionários que, sem querer, fazem o chefe ficar com raiva deles, de graça. Por exemplo, vestem-se melhor que o chefe. Ou sabem que o chefe não fez faculdade e ficam comentando em voz alta seus MBAs e mestrados. Ou sabem que o chefe só fala português e insistem em usar termos ingleses na conversa. Nada disso é culpa do funcionário, claro, mas é bom não esquecer que sempre prevalece o ponto de vista do chefe.
Vya Estelar – Por que eu não devo abordar o meu chefe no banheiro?
Max Gehringer – Porque, entre outras coisas, ele pode estar com as mãos ocupadas. Mas o conselho é uma metáfora para as coisas simples e perfeitamente evitáveis que podem complicar a carreira de um funcionário. Coisas que a gente faz sem perceber o risco e depois passa o resto da vida se arrependendo de ter feito.
Vya Estelar – Acabei de ser contratado numa empresa, como devo agir no ambiente de trabalho?
Max Gehringer – Observando tudo com visão microscópica. Nunca dando a entender que sabe mais do que o pessoal da casa. Nunca mencionando a empresa anterior como paradigma. Oferecendo-se para colaborar com qualquer um, em tudo o que for necessário. Parece incrível, mas eu diria que nem 20% dos novos contratados procedem assim.
Vya Estelar – Como você vê a figura do puxa-saco?
Max Gehringer – O puxa-saco é assim como o corrupto: ele é só a metade da equação. Só existem puxa-sacos porque existem sacos puxáveis, e há muito mais gente do que parece que adora ter o saco puxado constantemente. Assim, o puxa-saco acaba conseguindo um ambiente favorável para progredir e deixar os profissionais éticos para trás. Gostar de puxa-sacos nenhum de nós gosta, mas eles são como os carrapatos: a única maneira de extingui-los é extinguindo o corpo que lhes fornece pousada. Mas o pior de tudo é que, sim, há puxa-sacos muito competentes. E eles vão longe…
Vya Estelar – Como preparar um currículo?
Max Gehringer – Curto e grosso, com as informações básicas. Porém, mais importante que o currículo em si, é a carta à qual ele é anexado. Uma carta pessoal, que sensibilize o selecionador. Uma vez, eu recebi um currículo com uma carta que começava assim: "Sou entregador de pizza e estou no quarto ano da faculdade…". Mandei contratar o sujeito correndo.
Vya Estelar – Por quê?
Max – Porque ele foi o único que se diferenciou da mesmice geral – aquelas cartas que começavam com "implementei", "economizei", "liderei" e outros verbos na primeira pessoa. Além disso, alguém que está no último ano da faculdade e entrega pizzas num sábado à noite já diz, em uma única frase, que é pró-ativo e não tem problemas para trabalhar sob pressão, sem precisar repetir esses chavões.
Vya Estelar – Como proceder numa entrevista?
Max Gehringer – O maior erro que os entrevistados cometem é a falta de traquejo para lidar com o silêncio. O entrevistador faz uma pergunta simples, o entrevistado dá uma resposta adequada, e aí o entrevistador não diz nada. É quando o entrevistado acha que tem que "acrescentar" mais alguma coisa à resposta e, normalmente, inventa, exagera, ou dramatiza. E aí começa a derrapar.
Vya Estelar – Quais atributos ou talentos um profissional precisa ter ou desenvolver para ser bem sucedido na carreira?
Max Gehringer – Só há um: conseguir resultados práticos de curtíssimo prazo. O resto – escolaridade, liderança e mais uma imensa lista de atributos desejáveis – se assenta sobre o pilar dos resultados. Empresas perdoam tudo num funcionário que extrapola suas metas.
Vya Estelar – O fator sorte conta para você se dar bem?
Max Gehringer – A sorte existe, mas é preciso que o funcionário se prepare para ter sorte. Uma vez, numa múlti em que eu trabalhei, um colega "teve a sorte" de ser escolhido em um programa mundial de treinamento, de seis meses, na Matriz, nos Estados Unidos. Aparentemente, a escolha tinha sido aleatória, já que havia muitos outros candidatos locais iguais ou até melhores que o felizardo. Depois, descobrimos que nosso colega "de sorte" andava mandando alguns e-mails para o Diretor Mundial de RH, que havia apreciado a iniciativa do danadinho. Os e-mails eram inofensivos: falavam da situação da floresta amazônica e coisas do tipo, mas quem tinha a palavra final no processo de seleção era exatamente esse Diretor Mundial de RH. E, na hora do vamos-ver, ele lembrou de nosso colega "de sorte"…
Vya Estelar – Meu colega quer puxar o meu tapete? O quê fazer?
Max Gehringer – Prepare-se. Se o colega é daqueles que vai jantar com o chefe, vá também. Se ele é daqueles que fica até mais tarde para conversar sozinho com o chefe, seja o último a sair. Isso é mais ou menos como luta de boxe: depois do nocaute, não adianta dizer que não esperava o golpe…
Vya Estelar – Qual é o perfil de profissional que as empresas estão procurando hoje em dia?
Max Gehringer – Cada empresa tem o seu padrão. Há coisas meio óbvias, como formação superior, conhecimento de idiomas e de informática, mas uma empresa está também interessada no comportamento do candidato. Para algumas empresas, o candidato com o perfil ideal é o que está disposto a sacrificar seu lazer e sua família em nome do trabalho. Para outras, funcionários assim nem passam pela Portaria. O importante é o candidato se informar sobre a empresa e ver se o seu perfil se encaixa no que a empresa quer. Isso pode ser feito através do site da empresa, ou em conversas com ex-funcionários.
Vya Estelar – Você trata a questão do mau hálito no seu livro. Um profissional competente pode ser demitido exclusivamente por esse quesito, já que você coloca que o mau hálito já arruinou carreiras.
Max Gehringer – Não conheço ninguém que foi dispensado só por isso (ou por ter caspa, ou por não usar desodorante). Mas conheço muita gente que teve a carreira desacelerada por causa dessas coisas, já que empresas não são lá muito a favor de ver alguém que cheire mal representando-as publicamente.
O mau hálito é um dos elementos que podem arruinar uma carreira, mas é um dos poucos que podem ser corrigidos rapidamente. O problema é que as pessoas com aquele mau hálito insuportável não se dão conta disso. Aliás, todos nós temos mau hálito, só não sabemos o grau.
Vya Estelar – Como contar isso para quem tem?
Max Gehringer – No meu livro, eu conto como resolvemos um problema aparentemente insolúvel: dizer para um cara muito mal-humorado que ele tinha mau hálito. Fizemos então o seguinte: pedimos para o Nelson dizer para o Vítor que o Vítor tinha mau hálito. O Nelson não queria fazer isso de jeito nenhum, mas nós o convencemos de que só ele tinha ascensão suficiente sobre o Vítor para dar conta da tarefa. A muito custo, o Nelson concordou. E nós o enchemos de estatísticas e dados clínicos sobre o mau hálito. Aí, um dia, o Nelson chegou para o Vitor e disse: "Vitor, você sabia que a maioria das pessoas que têm mau hálito nem sabem disso?". E o Vitor respondeu na lata: "Pô, Nelson, até que enfim você se tocou". E foi assim que nós curamos o mau hálito do Nelson.
Vya Estelar – Qual foi a história corporativa mais estapafúrdia, hilária e inusitada que você já viu?
Max Gehringer – Eu trabalhei em um grupo nacional, fanático por redução de custos. Um dia, precisávamos comprar bonés para os temporários que trabalhariam na fábrica durante a safra de tomate. E o setor de Compras informou à Alta Direção que conseguiria comprar um lote de 250 bonés com um desconto incrível, coisa de 60% abaixo do preço de mercado. Só que tinha um probleminha: os bonés eram todos de tamanho "P", o que quer dizer que dava para enfiar, quando muito, um mamão papaya dentro deles. E a Alta Direção nem teve dúvidas: autorizou a compra e emitiu um comunicado para a área de Recrutamento, informando que "os admitidos deverão ter uma circunferência craniana de, no máximo, 32 centímetros". Ou seja, em nome da suposta economia, deixamos de contratar boas cabeças para contratar cabecinhas de prego…
Vya Estelar – Quais seriam as principais mancadas que podem arruinar uma carreira?
Dez mancadas que podem custar a sua cabeça
Falar mal do chefe – Matematicamente, a extensão do alcance das orelhas do chefe corresponde à soma da área total de todas as paredes da empresa. Até o espelho do banheiro é espião do chefe. Não importa o que o subordinado diga, nem onde, nem a quem, a coisa acabará chegando aos ouvidos do chefe. E de forma bastante ampliada.
Ofuscar o chefe – O chefe acabou de dizer, em uma roda de funcionários, que só conseguiu terminar a faculdade com muito sacrifício, porque era pobre… e o subordinado imediatamente se põe a falar sobre o MBA que fez em Harvard?
Botar a culpa no chefe – Nem sempre o caminho mais fácil é o mais seguro. E esse é o mais inseguro de todos.
Assumir responsabilidades que são do chefe.
Tratar o chefe como amigo íntimo na frente de estranhos.
Interromper o chefe. Não é que chefes não gostem de ser interrompidos. Eles detestam.
"Chefe temos um problema". Temos quem, cara-pálida? Você tem um problema. Tecnicamente, isso se chama "delegar para cima".
"Tenho certeza, chefe, de que você é aberto a críticas, portanto…" Portanto, quem disse isso não entende nada de certezas.
"É urgente?" Se não fosse, por qual outro motivo o chefe estaria pedindo pessoalmente?
"Ah, eu tinha entendido outra coisa". O chefe, até onde se sabe, fala português. E, se não fala, aprender sânscrito para entendê-lo é um problema do subordinado.
"Ah, tem mais um detalhezinho". Chefes detestam detalhes, principalmente aqueles que eles mesmos esqueceram de lembrar.