por Luiz Alberto Py
Está muito difundida entre nós a ideia de que a felicidade depende do sucesso pessoal. Este pensamento contém um equívoco frustrante, pois cria obstáculos quase intransponíveis para nosso convívio com o sentimento de sermos felizes.
Uma das causas mais frequentes dessa vinculação entre realização e felicidade consiste na formulação que os pais inadvertidamente costumam fazer para seus filhos condicionando seu amor por eles ao comportamento deles. É comum ouvirmos os pais dizendo para os filhos que só gostam deles quando eles fazem tal ou qual coisa ou tiram notas altas no colégio, ou afirmando: "Não gosto de você quando age dessa forma". Para a criança, o amor dos pais é o valor mais próximo de felicidade, o que a leva a estabelecer uma associação entre conseguir resultados e ser feliz.
Quando associamos realização pessoal com felicidade, colocamos esta no futuro, pois o sucesso, ou nossas metas e objetivos ficam visualizados em nosso porvir. Uma vez que seja construída alguma formulação como: "Eu serei feliz quando…", ou "No dia em que eu conseguir (…) então serei feliz", estamos pondo nossa felicidade fora do alcance do momento presente. Estaremos quase que proibidos de nos sentirmos felizes enquanto não obtivermos o sucesso proposto. Isto funciona como uma espécie de castigo temporário que nos constrange, determinando que não poderemos saborear o sentimento de felicidade enquanto não cumprirmos determinada meta ou compromisso assumido com nós mesmos.
O problema é que o amanhã nunca chega e a realização, posta no futuro, sempre depende de uma nova conquista, que está sempre mais adiante, como o horizonte, que nunca podemos alcançar ou, para usar um exemplo mais corriqueiro, a cenoura que se amarra na frente do focinho do burro para induzi-lo a caminhar, sem jamais alcançá-la. Nossa felicidade, da mesma forma estará sempre no dia seguinte, no próximo resultado, ou quando finalmente estivermos morrendo. Pensar a felicidade como uma espécie de recompensa por sucessos obtidos desloca-a do nosso presente, do aqui e agora da existência e a transforma num conceito teórico e abstrato.
Também não podemos deixar que as dores e tristezas que fazem parte inevitável da vida de todos nós obstruam a capacidade de ser feliz. Muitas vezes durante a vida a felicidade convive com momentos de sofrimento. Aliás, é certo que quanto mais pessoas amamos, mais momentos de solidária dor atravessaremos, mas isto faz parte do processo de viver plenamente.
Na verdade, a felicidade só existe no momento presente: no ar que nos enche os pulmões e oxigena nosso organismo, na comida que nos alimenta, na água fresca bebida em um momento de sede, na contemplação das maravilhas da natureza de nosso exuberante planeta, no som e no voo dos pássaros, no calor do sol ou no frescor da chuva, na mão que nos acaricia ou na pele que acariciamos, no perturbador encontro com a pessoa amada, que faz o coração pulsar forte e cheio de vida.
Quando nos permitimos viver cada momento de nossas vidas atentos à milagrosa benção que nos foi concedida de podermos estar vivos, conscientes e, além disso, capazes para nos envolver amorosamente com as outras pessoas, então a felicidade estará sempre conosco, independente dos sucessos. E a alegria de eventuais realizações será apenas um ingrediente a mais de uma vida plena e feliz.