por Patricia Gebrim
Eu olho para o mundo à minha volta e me pergunto:
– O que seria de mim se eu não tivesse um lado espiritual?
Como eu seria capaz de viver em um mundo que vem se tornando mais e mais quente a cada ano, um mundo à beira de um colapso? Como lidar com a face negra do ser humano, que vez ou outra ainda é capaz de nos surpreender por sua criativa bestialidade? Como lidar com as pequenas dores do dia-a-dia, com as crianças abandonadas, com aquele homem deitado na rua, com os ursos que já não tem focas para comer, com os momentos de falta de amor no seio de minha própria família?
Acreditem… espiritualidade, em minha vida, é tão importante quanto o ar que anima cada célula deste meu corpo tão frágil e mortal. Sendo assim, impossível resistir ao apelo de falar sobre isso com você.
Agora mesmo estou imaginando você, lendo estas linhas aí do outro lado do computador. Você, Sergio, Joana, Hélio, Daniela, Marcos, Marcelo, Carla, Kátia, Pedro, Maria, José. Você, cujo nome não importa, mas que como eu vive em meio a tantos desafios. Você, que passa por suas dores, que sofre perdas. Você, cujo coração, como o meu, fica apertado de vez em quando.
Você que, como eu, sente medo de não ser capaz de sobreviver em um mundo tão assustador, embora tantas vezes fuja dessa sensação inebriando-se. Para não sentir esse medo, muitas vezes você anestesia a si mesmo. Você faz isso mergulhando no seu trabalho, nos seus hobbies, nos esportes, na comida, na bebida, nas drogas, nas baladas, nos relacionamentos, no sexo. Mergulhando nas ilusões. Dormindo. Assistindo televisão.
Eu também faço isso de vez em quando, não ache que estou livre! Sou humana, como você.
Falar em espiritualidade, no entanto, requer certo cuidado. Não estou falando de “religiosidade”. Espiritualidade, no sentido em que estou empregando a palavra, pode aplicar-se até mesmo a uma pessoa cética. Uma pessoa espiritual, em minha forma de ver, é uma pessoa que percebe-se conectada a tudo o que existe, uma pessoa que percebe as infinitas cadeias de inter-relação que compõem a teia da vida. Uma pessoa que sabe que eu e você, que me lê aí do outro lado desta tela, estamos conectados em algum nível, a vida de um afetando a vida do outro.
Para ser bem simples: chamo de espiritualizada uma pessoa que procura agir com ética e bom senso, dando o melhor de si, visando o bem do todo.
Uma pessoa assim espiritualizada sabe que não basta ter uma residência cheia de grades, um automovel blindado, uma ilha separada e protegida do resto do mundo para ser feliz. Mesmo que conseguíssemos criar um lugar assim, o que apagaria de nossas mentes e de nossos corações o fato de sabermos que existem tantas pessoas sofrendo lá fora? Talvez possamos anestesiar nossas mentes e congelar nossos corações, mas será que conseguiremos ser felizes assim?
A espiritualidade nos impede de negar o que acontece ao nosso redor, é verdade.
Na medida em que nos sentimos em unidade com tudo o que existe, em que nos sentimos parte da humanidade, também nos sentimos co-responsáveis pela criação do panorama que vemos ao nosso redor. Nos sentimos co-responsáveis pela destruição, pelas guerras, pelo cinza das cidades, pela dor das crianças. E isso dói, eu sei.
Dói lá no fundo do nosso ser!
Mas só ao sermos capazes de suportar essa dor, só ao nos percebermos como parte daquilo que a vem criando, só então seremos capazes de perceber a nós mesmos também como agentes de cura.
A espiritualidade em mim é também a cura. É o que me abraça quando o ar falta em meus pulmões, quando a tristeza visita meu peito, quando o panorama ensombrece meu coração. A espiritualidade em mim é o que me dá força para, apesar de tudo isso, ser capaz de admirar a beleza do nascer do sol a cada dia. A espiritualidade em mim é que sopra palavras em meu ouvidos, e me faz pensar que dividi-las com você pode fazer alguma diferença.
É a espiritualidade em mim, também, que algumas vezes me eleva, no meio de todo esse caos, me conecta a um lugar da mais profunda paz e me faz sentir que existe um sentido oculto para cada pequeno movimento que ocorra no Universo. E de repente, de maneira surpreendente, só existe esse sentimento de gratidão transbordando de meus dedos, escorrendo em sua direção, agora mesmo. Esse sentimento de que tudo está bem, e que estamos em meio a uma onda de despertar coletivo, e que em breve seremos capazes de nos dar as mãos, em uma grande roda, curando assim todas as nossas aflições.
Mas, não se esqueçam de que sou psicóloga, e que essa é a “minha” forma de ser espiritual. Diferente da forma de um pescador, que agora mesmo está pescando em uma pequena aldeia. Diferente da forma de um político influente votando um projeto de lei. Diferente da “sua” forma, com a vida que você construiu ao seu redor.
Cada um de nós, com suas próprias crenças, em sua própria realidade, pode ser espiritual. Podemos ser éticos, expressar a nossa forma única de ser e procurar nortear nossas ações de forma a beneficiar não só a nós mesmos, mas também as outras pessoas. Se você for capaz de fazer isso, da “sua” própria forma, e prestar atenção ao que isso faz você sentir, compreenderá o que digo e sentirá as bençãos da espiritualidade se derramando, a todo momento, sobre você.
Encontre a sua forma de viver a espiritualidade em sua vida. Todos nós precisamos de você.