por Aurea Afonso Caetano
Ainda pensando sobre a verdade ou “de quem é a razão afinal?”- veja texto anterior
Em momentos de discussão ou briga entre casais ou mesmo entre pessoas não tão próximas a questão surge: o que é mais importante, convencer o outro de que estamos com a razão ou deixar para lá e seguir adiante, ser feliz?
Será que é tão fácil resolver essa equação?
Vejamos: é um lindo dia de domingo, vamos fazer um passeio juntos, escolhemos o destino, mas há várias possibilidades de trajeto. Um acha um trajeto melhor, o outro acredita que há um caminho mais adequado; estamos com tempo, não há hora marcada, o intuito é a diversão a partir de uma atividade gostosa. De fato, não faz muito sentido ficar discutindo se meu caminho é melhor que o seu; se pudermos focar no objetivo, qualquer caminho é um caminho bom desde que nos leve aonde desejamos chegar.
Mas… começa a chover, muito! Não sinto que estamos preparados, nossa roupa não é adequada, nem nosso carro (os pneus estão um pouco carecas). Quero voltar, cancelar o passeio; não há para mim outra possibilidade. É claro que nada justifica seguir o plano inicial! Vamos deixar para outro dia! Mas, o outro, o parceiro, vê as coisas de forma bem diferente. A chuva não é tão forte assim, vamos nos molhar, claro, mas qual o problema? Faz parte da diversão, logo nos secaremos! Pneus carecas, como assim? Estão bons ainda, duram uma eternidade. O desconforto torna-se patente, não há mais diálogo, há um duelo! O que fazer?
Eu, que odeio ficar molhada, que já tive um acidente na estrada num dia de chuva, que acho que todo plano pode ser modificado, quero com certeza voltar para casa. O outro para quem nada disso é uma questão, quer continuar. Argumentos dos dois lados não favorecem, em nada, o consenso. Simplesmente não conseguimos compartilhar o mesmo olhar para um fenômeno, carregado de um afeto positivo a princípio, mas que agora tem para um dos parceiros uma conotação negativa.
Todo olhar acerca de um evento é carregado, no mínimo, pela história pregressa da pessoa em questão, mais a expectativa de futuro que essa pessoa tem, mais a vivência compartilhada com o outro/parceiro, mais a situação individual atual. É muito difícil, quase impossível, separar todos esses aspectos e dar uma resposta “isenta”, ou seja, uma resposta que não seja tão carregada, uma resposta mais “limpa”.
Dizer que tenho razão, ou que a verdade está comigo é querer convencer o outro, e a mim mesmo, que há apenas um ponto de vista válido. E é, também, esquecer que nem em mim, nem para mim, há uma única perspectiva possível. Nosso olhar é sempre condicionado pelo que somos!