por Patricia Gebrim
"O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: "Se eu fosse você". A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito… "
Rubem Alves
Ah se eu pudesse voltar atrás o filme da minha vida, quantas coisas faria diferente…
Com a passagem dos anos aprendi que a dor molda a nossa sensibilidade e nos ajuda a perceber um mundo mais sutil, onde cada pequeno ato se torna um diamante cheio de delicadeza.
Quando adoecemos, por exemplo, sentimos o quão importante é o carinho e a presença de um amigo que segure a nossa mão. E então olhamos para trás e nos damos conta de quantas vezes fomos pouco cuidadosos com aqueles a quem amamos, por pura falta de sensibilidade para perceber que podíamos SIM fazer diferença.
Eu queria ter sabido antes o que só estou descobrindo agora.
E queria poder saber agora todas aquelas coisas que só se tornarão claras no futuro.
Hoje li na internet um lindo texto escrito pelo psicanalista Rubem Alves. É incrível como me sinto tocada por esse escritor, não especificamente por seu dom de escrever, se bem que escreva tão divinamente que me deixa quase sem ar. Mas o que me toca fundo é ele ter tanta alma, uma alma que se derrama em meu coração sempre que leio suas palavras.
"O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: "Se eu fosse você". A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção". Rubem Alves
Rubem, você está certo, hoje em dia é coisa rara encontrar um ouvido que não esteja morto. Quantas vezes falamos com pessoas que se dizem amigas, e após quase uma hora de conversa vamos embora, com o peito sangrando, sem que a outra pessoa tenha sequer percebido aquele líquido vermelho e quente brotando da ferida aberta. Não porque tenhamos escondido nada, mas a pessoa estava tão entretida em olhar para si mesma que nem chegou a nos perceber. E não achem que por estar escrevendo isso eu me coloque do lado de fora dessa horrenda maldição.
Quantas vezes não devo ter passado reto por alguém que estava aos pedaços, sem me dar conta, sem nem mesmo ver? Me dói pensar nisso, e peço perdão a todos a quem eu tenha insensivelmente oferecido minha cegueira. Por mais que fiquemos atentos, vez ou outra somos hipnotizados por essa serpente e ficamos lá, cegos, olhando para nós mesmos, com ouvidos surdos e uma pedra sobre nosso coração.
Não quero viver assim. Repetindo a palavra "eu", como um daqueles discos antigos riscados, que subitamente se tornava um prisioneiro irritante de uma mesma parte da música, tornando feio o que poderia ter sido tão belo.
Será que estamos perdendo a sensibilidade? Virando pedra? Me recuso a escolher essa explicação. Prefiro acreditar que o que antes passava despercebido agora se torna mais e mais visível. Prefiro acreditar que estamos despertando desse estado tão triste, dessa auto-hipnose. Prefiro pensar que, ao nos darmos conta dessa distorção, podemos dar o primeiro passo no sentido de fazer escolhas diferentes. Se enxergarmos agora, se percebermos o quanto temos sido egoístas, talvez possamos economizar muitos anos, coisa preciosa nesses tempos em que os relógios correm enlouquecidos para fora de nosso controle.
Podemos mudar, agora. E de repente o milagre acontece. E é lindo. Olhamos nos olhos do outro e… Existe alguém lá! Olhamos mais de perto e percebemos o quanto aquilo que vemos é belo, e torna-se impossível desviar o olhar. Sentimos que algo bate mais forte em nosso peito. Ganhamos um coração? Sim. Um coração. E é ele quem sabe perguntar:
– Como você está ? Está feliz? Algo anda te fazendo sofrer? Existe beleza na sua vida? Posso fazer algo por você?
Fechem os olhos por um instante e sintam a beleza disso.
Podemos perguntar e, de fato, "ouvir a resposta". E levá-la para dentro de nós, para aquele lugar sagrado ao qual não me canso de referir. E mais. Podemos sentir a alegria do outro, a tristeza do outro, e a dor do outro; e descobrimos que não há diferença entre elas e a nossa própria alegria, e tristeza e dor. E ao aliviarmos um pouco a dor do outro, é o nosso peito que fica instantaneamente mais leve, porque nós e o outro somos um.
"Eu e o outro somos um". É muito especial o momento quando percebemos isso. E é assim que vamos libertando o amor. E sendo amor.
Isso talvez faça parte desse grande e lindo plano do Universo, o plano de nos tornarmos, finalmente, humanos.