Você tem ideia do esforço de um bebê para lutar contra a força da gravidade?

por Nicole Witek

Os bebês são levados pela vida a encontrar jeitos, meios extraordinários para brigar contra a poderosa força da gravidade* que os cola ao chão. Para conseguir agarrar um brinquedo, apoiar-se em uma cadeira, para erguer-se nas duas perninhas, virar para olhar para trás e não despencar por causa do peso enorme da cabeça, o bebê usa recursos que seriam verdadeiras proezas para um adulto.

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Se nós conseguimos ficar em pé é só graças a um empuxo vertical e contínuo de nossos músculos e de nossa coluna vertebral, contra a força da gravidade ou – em outras palavras – a força de atração terrestre.

Estar em equilíbrio quer dizer aniquilar essa força, é fazer com que a musculatura funcione, gastando o mínimo de energia, em qualquer direção.

Seria bom considerar novamente e refletir sobre “como”, quando bebês, conseguimos “driblar” a força da gravidade. Observar também em nós, como, gradativamente, da infância até a velhice, saímos do eixo de equilíbrio, furamos essa maravilhosa mecânica, que se adaptou às condições terrestres desde o início.

Nossa vida sedentária é a grande culpada por nos atirar nas dores e na doença.

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Assim, observando os recursos de habilidade e de flexibilidade que os bebês usam durante o dia, podemos entender como hoje – já adultos – chegamos nesse ponto de, sem consciência, ter atitudes e posturas que furam o equilíbrio perfeito que tínhamos conseguido quando nenê.

Antes de lembrar das fases que o levaram a ser “um adulto em pé” e independente, lembre-se primeiro do acordar de um bebê.

Acordar

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Quando o bebê acorda, faz estiramentos gostosos, bocejos, estiramentos de pernas como gato, sorrisos, abertura de peito, respiração profunda e gostosa. E, somente depois disso, é que vem os outros movimentos, inclusive rolar de um lado para o outro, que se tornará rolar para sentar na beira da cama e começar o seu dia.

Lembre dessas etapas, de quando eram graciosos e espontâneos, os movimentos do seu corpo na sua inocência.

Endireitar, se deslocar de bruços, girar da posição de costas para a posição de bruços: 

Você não se lembra, mas erguer a cabeça foi um trabalho perigoso. A partir da posição de bruços, você como bebê, queria enxergar o que acontecia ao seu redor. O peso da cabeça, comparado ao seu corpo, era enorme. Foi uma verdadeira conquista! E quando você quis tirar seu corpo do chão! Que trabalho abdominal, trabalho de quadris, de fortalecimento de toda a musculatura! Você não lembra, mas seus pais ainda falam desse evento.
Demorou mais ou menos uns seis meses: coordenar os movimentos, fortalecer a musculatura para que ela fosse capaz de acompanhar cada fase do crescimento.

Engatinhar
:
Uma vez de quatro, você procurou, tateou e experimentou o melhor jeito de se deslocar. Oscilando para frente e para trás. Até que um belo dia, você começou a se deslocar rapidamente em direção aos orifícios da tomada elétrica.

E mais! Você coordenou todos esses movimentos na diagonal e liberou uma mão. Aconteceu uma integração fantástica em todos os níveis do seu cérebro: neurônios dos dois hemisférios piscando, crepitando para conseguir essa coordenação. Assim, você começou a agarrar alguns objetos, os mais valiosos da casa, esses na mesa de centro da sala, ou abriu as portas e gavetas mais perigosas da casa. Entre utensílios de cozinha, produtos químicos perigosos e tentações diversas, e seus pais não sabiam mais onde olhar… E depois você passou para a fase de sentar, cabeça erguida, costas eretas para levantar e agachar.

Fortalecendo seu equilíbrio, você partiu para a grande conquista, a luta contra a força da gravidade. Empinando o quadril para trás, erguendo o tronco, contraindo os dedos dos pés, enfrentando ou se recolhendo frente ao perigo. Hoje existem até escolas de fisioterapia que separam pessoas em tipos físicos, a partir dos músculos que a pessoa costuma acionar desde a infância.*

Aprendemos e usamos certos recursos desde bebê que serão “hábitos” de funcionamento, que irão se instalar pela vida inteira. E ao crescer, esses hábitos serão cada vez mais fortes!

Os primeiros passos, a conquista da independência. Assim que você conquistou a independência no espaço, um processo que dura geralmente em torno de um ano, passa a explorar o mundo, quer usufruir de toda sua curiosidade para “matar a fome” de viver.

Quando seus pais percebem a sua maturidade, que “já é tempo”, levam-no para a escola, o jardim de infância.

É lá que vão começar todas as restrições de liberdade física, até ser quase “atado” num banco de escola por horas. Que suplício para um corpo que quer movimento!

Gradativamente a força da gravidade vai se expressar num corpo sentado, cujo dono fica entediado por longas horas. Longos anos: do jardim de infância até a escola e depois na vida profissional. Uma sucessão de posições, onde todos os esforços que foram feitos quando você era bebê para escapar da força da gravidade, são aniquilados!

Que tal imitar os bebês para descobrir novamente o caminho espontâneo e mais fácil para ficar em pé ou sentado, para carregar peso sem se machucar e para dormir um sono reparador. Quando o corpo está bem equilibrado, os pés corretamente posicionados, você descobre novamente o caminho do equilíbrio físico e psíquico.

Experimente sua postura natural atual em pé:

– Em pé, pés unidos.

– O corpo totalmente relaxado fica submetido à força da gravidade.

– Se não houver oposição a essa força, o corpo fica “amassado” cada dia um pouco mais, até chegar ao ponto de precisar de ajuda externa, como uma bengala.

Se a pessoa ficar em pé simplesmente, sem corrigir nada, irá sentir e perceber um conjunto de informações sobre a sua posição expressa, o encurvamento para frente: o peso do corpo está dividido sobre os dois pés; o arco interno do pé está achatado para dentro, os tornozelos desabam e aproximam os maléolos (ossos do tornozelo) internos. Os joelhos ficam para dentro, a bacia muda de posição, as virilhas ficam mais profundas, enquanto a coluna fica desabada e as curvas ficam mais acentuadas. O ventre fica proeminente levando a região lombar para frente. O peito desaba, os ombros e pescoço ficam pendurados para frente, acentuando a curva do alto das costas . As *escapulas sobem. As clavículas ficam salientes. Os braços em rotação interna, as palmas das mãos viradas para trás. A nuca fica curta, deixando o queixo apontar para frente e para cima.

Será interessante tomar consciência e sentir todos os detalhes dessa posição durante alguns minutos para perceber o quanto a força da gravidade achata toda a nossa estrutura. Trata-se de um achatamento físico e psíquico ao mesmo tempo.

Vamos experimentar e vivenciar juntos a postura da montanha: Tadasana

Correção para conviver com a gravidade de maneira correta

Ainda relaxado, será interessante empurrar o chão com os pés, como se você quisesse deixar sua pegada no chão, uma pegada profunda.

Ao fazer isso você já estará endireitando a coluna cervical e as pernas já estarão esticadas. Assim o corpo inteiro se organiza para transmitir essa ordem: escapar da força da gravidade.

Observando novamente, você vai constatar algumas transformações:

– O peso do corpo passa para frente do pé;

– O calcanhar tende a se levantar do chão;

– O arco interno do pé acentua-se, fazendo com que o peso passe para a parte externa;

– O tornozelo endireita;

– A perna opera uma leve rotação externa;

– Os joelhos se abrem um pouco;

– A bacia passa em retroversão;

– As virilhas se abrem;

– As curvas da coluna vertebral se apagam;

– A sensação de uma coluna ereta leva à sensação crescimento;

– A caixa torácica se eleva e se abre;

– Os ombros se abaixam e as escápulas se encaixam para baixo;

– Os braços passam em rotação externa: as palmas das mãos se orientam em direção as coxas

– O pescoço se alonga, o queixo se aproxima da garganta;

– Enquanto existe esse impulso para cima, o corpo fica ereto e leve.

Essa sensação pode ser experimentada tanto do ponto de vista físico, como do psíquico. O peso que achamos que carregamos o tempo todo, some, desaparece. Existe assim uma aspiração para cima. Aos poucos o esforço muscular desaparece porque entramos no eixo de equilíbrio onde a verticalidade se expressa livremente. O espírito se sente livre. E quanto essa sensação invade totalmente a mente, nós queremos que essa atitude de leveza e de liberdade dure…

Vamos imitar um bebê para voltar a sentir essas sensações do nosso primeiro passo em equilíbrio, essa grande vitória: o dia em que, eretos, nós andamos pela primeira vez. O dia de nossa independência.

*O campo de gravidade é um campo atrativo aos quais estão submetidos todos os objetos materiais a superfície da Terra e ao redor da terra. Assim podemos observar que num determinado lugar os objetos soltos vão cair em direção ao chão segundo a mesma direção que e chamada de “vertical”. Na superfície da Terra, o campo de gravidade equivale a 9,1 newton por kilograma. A força a qual submetida um objeto por causa da força da gravidade é chamada “peso”. O peso está diretamente ligado à massa.

*Escápulas: (antes chamado de omoplata) é um osso grande e chato, localizado na parte superior das costas

Bibliografia:
Bebe Yogi : le mouvement à l’état de grâce de Sophie Dumoutet
Patrick Tomatis, Revue Française de Yoga, n° 12, « L’étirement postural », juillet 1995, pp