Você tem um ‘Eu ditador’ dentro de você; saiba lidar com ele

por Patricia Gebrim

Quando foi que decidimos construir esse altar enorme onde colocamos o nosso Eu?

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Como vassalos, passamos dias e noites de joelhos, prostrados aos pés dessa "divindade", temendo que seja destronada.

O EU passou a ser a razão de nosso viver, aquilo que temos de mais importante. Não apenas nos ajoelhamos aos seus pés, mas exigimos que todos façam o mesmo, e "ai de quem ousar não nos colocar no topo de sua lista de prioridades"! Correrá o risco de ser decapitado em praça pública, o que é perfeitamente justo, de acordo com nossa visão distorcida e egoica.

Em todo tipo de relacionamento, seja profissional, familiar ou amoroso, esperamos que o nosso EU seja suprido em suas mínimas necessidades, como fazemos ao dar tudo a uma criança mimada, quando não temos energia suficiente para colocar-lhe os limites necessários. Focados no Eu, exigimos, cobramos, nos magoamos quando não nos sentimos devidamente tratados de acordo com o grau de realeza que acreditamos possuir.

Tudo gira em torno de nosso próprio umbigo. Eu, eu, eu, eu! Podemos ser do tipo que não cobra os outros, e sim aquele tipo de pessoa egoísta que mora do outro lado dessa mesma polaridade, daqueles que agem como se os outros não existissem, outra faceta do ditador que simplesmente decide de acordo com o que melhor lhe aprouver

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– Se para obter o que desejo eu tiver que caminhar sobre cabeças alheias, fazer o quê?

E assim seguimos, cegos, guiados por uma visão baseada em um conceito de separatividade, desconsiderando as necessidades das pessoas, sem cuidar de nada nem de ninguém, sem perceber que feliz de "verdade verdadeira" seremos apenas quando os outros forem felizes também. 

Esse assunto, no entanto, é um tanto complicado e cheio de armadilhas. Não adianta dizer a alguém que ainda não chegou a estruturar seu próprio ego, que deve deixar de ser guiado por ele. Para ajudar a compreender isso, pense no ego, no EU, como sendo a riqueza material. Quem nunca teve riqueza, posses, dinheiro; sempre fica desejando lá no fundo possuir aquilo que em sua fantasia poderia resolver todos os seus problemas. Apenas quem de fato conquistou a tão almejada riqueza é que pode compreender suas limitações no que se refere a nos fazer de fato felizes, e aí sim poderá abrir mão da necessidade compulsiva de posses a qualquer custo, uma decisão que só pode vir a partir da própria experiência.

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O mesmo se passa com nosso ego. Uma pessoa que possua um ego fraco, precisará necessariamente passar pela etapa de fortalecê-lo, precisará lutar para se fazer respeitar, precisará desenvolver-se, sentir-se fortalecida, poderosa, e só então, de posse do precioso EU em suas mãos, talvez compreenda que exista em si mesmo uma instância maior que poderá aproximá-la muito mais da felicidade.

Somente quando a pessoa souber que é capaz de se impor, de lutar pelo que quer, de conquistar o que deseja; poderá então abrir mão disso pelo bem do outro, sem se sentir lesada. Poderá então agir a partir do que acredita ser o melhor para o bem de todos, e não a partir apenas do que deseja. Isso é amor. E quando é amor existe generosidade, e isso vem leve, sem peso, sem a sensação de que um sacrifício está sendo feito. Vem com a alegria de criar felicidade para alguém.

A parte de nós que ama, mora além do Eu 

O Eu, o Ego, não é capaz de verdadeiramente amar. Quando muito "se apaixona", em geral pela própria imagem projetada no outro. É aquilo que existe além do Eu  que "ama" o outro como o outro verdadeiramente é. E amando, respeita, liberta e sente-se feliz ao gerar a felicidade da pessoa amada. O foco não está mais em avaliar se o outro é capaz de nos fazer felizes e sim em criar a felicidade para outro alguém.

O verdadeiro amor é doação, não exige nada em troca. Assim, não importa se o outro no final será capaz de retribuir, reconhecer ou validar o que oferecemos. O que importa é que nos tornemos cada vez mais capazes de manifestar a energia amorosa, e ao fazer isso semeamos amor no jardim de nossas vidas. Com sementes tão belas, não é difícil prever o que crescerá no jardim que criamos ao nosso redor. 

Ouçam…

Não podemos controlar as pessoas, as situações, a vida, por mais que tentemos, aceite essa verdade, não podemos controlar!

Não podemos evitar a dor, a traição, o sofrimento. Não podemos nos proteger de ser enganados, rejeitados ou abandonados.

Mas podemos sim nos desapegar desse ditador chamado Eu, nos deitar serenamente no colo de nossa alma e confiar que essa alma sempre nos amará, protegerá e atrairá em nossa direção uma energia parecida com aquela que aprendermos a semear.

E podemos aprender com nossa alma a semear amor, e tanto amor,  que nada em nossa vida crescerá sem que o amor se revele.

Pessoas podem vir e ir, mas continuaremos lá, inteiros, floridos, abençoados e abraçados por nosso eterno jardim.

(Este texto me veio como uma inspiração após assistir a uma palestra da Lama Tsering, a quem agradeço pelos lindos ensinamentos).