Por Elisandra Villela Gasparetto Sé
A preocupação com o cuidado e os cuidadores de pessoas idosas tem marcado todas as sociedades, principalmente no cuidado de idosos fragilizados com doenças crônicas e demências.
Hoje, há um número insuficiente de cuidadores e isso gera polêmica em relação à profissionalização do cuidado e implica no aumento do debate e reflexões em torno da questão.
A preocupação com as questões do cuidado foi marcada nos anos 1980, na qual havia uma relação dependente em que o controle sempre estava nas mãos do cuidador, enquanto o paciente sempre estava na situação de incapacidade.
Nesse aspecto, o contexto do cuidado sempre foi visto por uma ótica negativista. A experiência de cuidar sempre foi vista como algo negativo. E o estresse do cuidador sempre foi o foco central das reflexões no campo da saúde, especialmente na área da enfermagem e medicina.
E tradicionalmente o cuidado sempre foi pautado pelas relações familiares e afetivas, desempenhado pela mulher de classe média, geralmente filha mais velha, solteira, de meia-idade.
Nos anos 1990 houve a necessidade de rever as questões em relação ao cuidado. A partir dentão, amplia-se a visão sobre o cuidado e o cuidador, tornando-a mais abrangente e a atenção se volta também para o trabalho remunerado, levando-se em conta os impactos negativos da tarefa de cuidar e para a dimensão do cuidado contemplando mudanças no contexto do cuidado. Assim, o Estado, a sociedade e o mercado passam a ter um interesse crescente nas configurações das políticas de cuidado que uma visão macroestrutural.
A relação de cuidado é baseada na interdependência e reciprocidade e pode ter impacto negativo e positivo tanto para o cuidador como para quem é cuidado. Portanto, a compreensão das relações de cuidado requer um olhar diferenciado e amplo para esse contexto, seja no âmbito doméstico, público, privado, forma, informal, remunerado ou não.
A palavra “cuidado” sofreu críticas sendo revista principalmente nos estudos sobre a deficiência, passando por revisão no conceito de cuidado. Segundo Debert e Pulhez (2017) a palavra cuidado deveria ser evitada, devido ao conteúdo emocional envolvido. Para o pesquisador Joan Tronto (2007) “o cuidado é definido como uma atividade da própria espécie que inclui tudo o que podemos fazer para manter, continuar e reparar nosso mundo para que possamos viver nele da melhor maneira possível. Esse mundo inclui nossos corpos, nós mesmos e nosso meio ambiente, e tudo que procuramos intervir de forma complexa e autossustentável”.
Nos anos 2000 a ampliação e a redefinição do contexto do cuidado tomou corpo e o termo “Care” passou a ser utilizado em todo o mundo com frequência com o sentido de atenção, solicitude em relação ao outro. Nesta década expandiu-se a noção de “Care” a outrss tarefas que não apenas o de cuidador de idosos, mas também de empregados domésticos, assistentes de enfermagem etc.
Trata-se de uma tendência no campo das pesquisas médicas e gerontológicas continuar esse debate e propor novas definições para a tarefa de cuidar e estabelecer normatizações para a atividade.
O conceito de cuidado ainda é ambíguo e abrangente. É preciso explorar as questões éticas, de gênero, as relações afetivas, a humanização do cuidado, a dependência e independência, a institucionalização e as relações de trabalho.
O desafio atual já está sendo enfrentado, que é o de debater as novas configurações do cuidado, lidar com a questão do cuidado enquanto parte também de um trabalho doméstico e também por vezes um trabalho assistencial, remunerado, formal e profissional.
O cuidado formal não pode ser desprovido de afeição e requer atenção ao investimento emocional nele envolvido além do conhecimento técnico, da qualidade do cuidado e da valorização aos sentimentos do cuidador. As relações de poder são bastante delicadas neste contexto, uma verdadeira corda bamba quando se trata de especializar profissionalmente uma tarefa na qual nasceu no núcleo familiar e ainda sobrevive nessa prática familiar com valores transformados devido ao ônus do cuidado, aos novos padrões de cuidados, diferentes vínculos e à qualidade das nossas vidas na atualidade.
Essa discussão é delicada devido ao receio que se tem de mercantilizar o cuidado, uma vez que o envelhecimento é multidimensional, e para ser cuidado com qualidade de vida na velhice, nunca vai poder desaparecer o sentimento do amor, o lado humanístico das intervenções. O amor é e será sempre o combustível para vida das pessoas, principalmente no futuro.