Por Ceres Alves de Araujo
A autoestima é a qualidade de quem se valoriza, que gosta do seu jeito de ser e de se relacionar e que tem, como consequência, confiança em sua atuação no mundo.
A autoestima não é inata. Ela é adquirida ao longo da vida em função das experiências do indivíduo na sua relação com as pessoas e com os contextos onde vive. Uma boa autoestima dá segurança para os movimentos de afirmação no mundo, em toda a trajetória da existência.
Nos primeiros tempos de vida, a sensação de sentir-se amado, querido, advém do aconchego, da continência, isto é da noção primitiva de um apego seguro com os pais. É o primeiro fator no desenvolvimento de uma boa autoestima. O olhar “coruja” dos pais colore de aspectos positivos os fundamentos da autoimagem do bebê.
À essa continência amorosa dos pais, vão se juntando outros fatores para favorecer o ganho de uma boa autoestima. Na infância, a agilidade, a destreza na coordenação motora, o sentir-se seguro quanto ao equilíbrio, à postura e à locomoção, o prazer associado ao uso do corpo nas atividades de movimentação ampla constituem outro fator para fortalecer uma boa autoapreciação.
Sucesso escolar constitui outro fator importante para a construção da boa autoestima. Sucesso escolar não significa ser o primeiro aluno da classe, mas ser aquele que aprende com facilidade, aquele que vive o prazer na construção do conhecimento e que logo percebe que aplicar-se mais tem como consequência avaliações melhores e dessa maneira aprende disciplina. Ser reconhecido como inteligente e capaz qualifica muito bem a autoestima.
Na pré-adolescência e principalmente na adolescência a esses fatores vem se juntar o êxito social. Passa a ser muito importante ser querido, ser valorizado como amigo, ter muitos amigos, ter habilidades sociais, saber cooperar e saber competir.
Na vida adulta, o sucesso profissional e o êxito nas relações amorosas, passam a ser os dois fatores fundamentais para garantir a autoestima. Além disso, dificilmente um se mantém sem o outro.
Ao longo da trajetória do desenvolvimento, nem sempre tudo acontece de modo que todos esses fatores sejam combinados. Adversidades de ordens diferentes podem ocorrer, como perdas de pessoas significativas, dificuldades motoras, dificuldades escolares, crises econômicas, crises conjugais etc.. Elas podem ocasionar “cicatrizes” na autoestima, mas se forem bem elaboradas podem se transformar em “condecorações”, o que garantirá até mais valor à autoestima. Isso é resiliência, a capacidade que tem o ser humano, de sobrepor-se à adversidade e aprender com ela, tornando-se mais forte ainda.
Porém, existe uma forma de adversidade para o desenvolvimento das pessoas, que pode ser considerada a mais grave de todas, talvez a de dificílima superação: a falta de continência, a falta da colocação de limites por parte dos pais. Nos nossos dias essa negligência dos pais é muito frequente e preocupante. Faz parte da função de pais dar amor, proteção, garantir segurança e colocar limites aos filhos desde o início da vida para que eles cresçam como pessoas civilizadas e que possam se tornar cidadãos respeitáveis.
As crianças sem limites, mantêm-se onipotentes, centradas em seus desejos, exigindo serem atendidas em tudo o que querem de imediato. Não aprendem a lidar com frustrações ou contrariedades, não toleram esperas, não aprendem a levar os outros em consideração. Esses são percebidos apenas como serviçais, reféns de seus desejos.
Essas crianças negligenciadas pelos pais por não terem recebidos os “nãos” organizadores da vida psíquica se transformam em “bebês gigantes” para usar a expressão cunhada por Boris Cyrulnik , pesquisador em Resiliência. Na adolescência e na vida adulta, esses “bebês gigantes” carecem de uma adequada autoestima, pois não se testaram verdadeiramente frente aos confrontos que a vida traz em cada época.
A falta dos limites organizadores na infância e na adolescência impede o desenvolvimento das funções do eu. Em geral, são pessoas frágeis, ainda que externamente se apresentem como imperiosas e arrogantes. São pessoas que não aprenderam a refletir sobre si mesmas, pois não podem admitir em si nenhuma limitação, que projetam fora de si todos os erros, que não assumem responsabilidade por sua ação. Transformam-se em adultos que não conseguem controlar impulsos, nem regular as emoções e tendem a fracassar nas relações interpessoais e nas relações profissionais.
Assim, dar amor, dar continência e dar limites firmes e adequados aos filhos, constituem funções não alienáveis dos pais. Não exercê-las é negligenciar seus filhos, não prepará-los para o mundo onde eles serão testados, postos à prova, exigidos. Uma boa autoestima é característica de uma pessoa bem constituída, forte e segura de suas competências e limitações.