Como a pandemia afeta a saúde mental

Estudo publicado na revista The Lancet Psychiatry aponta que 1/3 de ex-pacientes que tiveram Covid-19 desenvolveram transtornos psiquiátricos. E mais: 13 reações comportamentais muito comuns decorrentes da pandemia. 

Há quase um ano, especialistas da Organização Mundial da Saúde (OMS) declararem em tom de alerta que uma crise de saúde mental na população seria inevitável. O fato é que agora os resultados das pesquisas começam a ser publicados já que milhões de pessoas em todo o mundo estão cercadas pela morte e pela doença e forçadas ao isolamento, à pobreza e à apreensão resultantes da pandemia de Covid-19.

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Um estudo publicado na prestigiosa revista The Lancet Psychiatry aponta que um terço de ex-pacientes que contraíram Covid-19 desenvolveram transtornos neurológicos ou psiquiátricos. Isso confirma a declaração de um ano atrás de Devora Kestel, diretora do departamento de saúde mental da OMS. Ela disse: “O isolamento, o medo, a incerteza, o caos econômico – todos eles causam ou podem causar sofrimento psicológico”.

No referido estudo, os pesquisadores analisaram mais de 236 mil registros de saúde de pacientes e constatou que um terço dos pacientes com Covid-19 recebeu um diagnóstico neurológico ou psiquiátrico dentro de seis meses após a infecção.

Um dos coautores do estudo, Max Taquet, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, disse que agora precisamos ver o que acontece depois de seis meses.

Conclusões do estudo:

• 34% dos pacientes com Covid-19 receberam diagnóstico neurológico ou psiquiátrico dentro de seis meses de infecção; Para 13% dessas pessoas, foi o primeiro diagnóstico neurológico ou psiquiátrico registrado;

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• Foram analisados 236.379 registros eletrônicos de saúde, a maioria dos Estados Unidos;

• Os pesquisadores compararam os casos de Covid-19 com casos de gripe e infecção do trato respiratório;

• Os diagnósticos mais comuns foram: ansiedade (17%), transtornos de humor (14%), transtornos de uso indevido de substâncias (7%) e insônia (5%);

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• Diagnósticos neurológicos foram mais raros, mas não incomuns em quem teve Covid grave e foi internado em UTI;

• Pesquisadores analisaram 14 transtornos neurológicos e de saúde mental, como AVC, demência, transtornos de humor, ansiedade, insônia;

• Segundo o estudo, apesar de maiores, os riscos não se limitaram a pacientes com Covid-19 grave.

Principal autor do estudo

O principal autor do estudo, professor Paul Harrison,  Universidade de Oxford, comentou que doenças graves podem afetar o campo psíquico e neurológico e acrescentou: “Estes são dados do mundo real de muitos pacientes. Eles confirmam as altas taxas de diagnósticos psiquiátricos após Covid-19, e mostram que doenças graves que afetam o sistema nervoso (como derrame e demência) também ocorrem. Embora estes últimos sejam muito mais raros, eles são significativos, especialmente naqueles que tiveram a forma grave”.

Para os que não se contaminaram fica o alerta, uma vez que também podem ficar vulneráveis a transtornos psiquiátricos ao longo do período pandêmico.

Saúde mental dos brasileiros

Segundo pesquisa do instituto Ipsos, encomendada pelo Fórum Econômico Mundial e cedida à BBC News Brasil, 53% dos brasileiros declararam que seu bem-estar mental piorou um pouco ou muito no último ano. 

13 reações comportamentais à pandemia:

O que mais acomete as pessoas: medo de ficar doente e morrer e não procurar o serviço de saúde por medo de contaminação

1ª medo de ficar doente e morrer;

2ª evitação de procurar um serviço de saúde por outros motivos, por receio de se contaminar;

3ª preocupação com a obtenção de alimentos, remédios ou suprimentos pessoais;

4ª medo de perder a fonte de renda, por não poder trabalhar, ou ser demitido;

5ª alterações do sono, da concentração nas tarefas diárias, ou aparecimento de pensamentos intrusivos;

6ª  sentimentos de desesperança, tédio, solidão e depressão devido ao isolamento;

7ª raiva, frustração ou irritabilidade pela perda de autonomia e liberdade pessoal;

8ª medo de ser socialmente excluído ou estigmatizado por ter ficado doente;

9ª sentir-se impotente em proteger as pessoas próximas, ou medo de ser separado de familiares por motivo de quarentena/isolamento;

10ª preocupação com a possibilidade de o indivíduo ou de membros de sua família contraírem a Covid-19 ou a transmitirem a outros;

11ª receio pelas crianças em casa não receberem cuidados adequados em caso de necessidade de isolamento;

12ª risco de deterioração de doenças clínicas e de transtornos mentais prévios ou, ainda, do desencadeamento de transtornos mentais;

13ª risco de adoecimento de profissionais de saúde sem ter substituição adequada; 13ª medo, ansiedade ou outras reações de estresse ligadas a notícias falsas, alarmistas ou sensacionalistas, e mesmo ao grande volume de informações circulando.

Coordenador do serviço de atendimento a pacientes com tricotilomania no PRO-AMITI/IPq FMUSP. Supervisor clínico na UNIP. Psicólogo pela Universidade Metodista. Mestre em ciências pela Faculdade de Medicina da USP. Especialização em Terapia Cognitivo-comportamental pelo Ambulim/IPq FMUSP. Especialização em Psicologia Hospitalar pela UNISA