por Roberto Goldkorn
Desde menino ouço pessoas de "grande" sabedoria dizer para mães e pais de crianças: "Você sabia que seu filho é um espírito velho?"
Confesso que isso sempre me intrigou. Houve época que até me revoltei com esses comentários porque não achava relevância nessa declaração (em que raios isso ajudava os pais daquela criança?). Depois me espantava a falta de resposta para essa pergunta: Como essas pessoas poderiam ter tanta convicção sobre esse mistério da alma humana?
Alguns diziam: É um dom Roberto, é uma intuição Roberto, é outro espírito soprando no ouvido do "médium" Roberto.
O tempo passou e aqui estou eu detectando "espíritos velhos". Semana passada usei esse termo com dois clientes para explicar peculiaridades de seu comportamento ou de seus filhos. Mas como cheguei a repetir as mesmas afirmações que criticava há quarenta anos?
É uma longa história porque é um longo caminho, mas vou poupar meus leitores dessa digressão (que até poderia ser interessante) mas certamente seria demorada.
Felizmente para mim, para a minha coerência e saúde mental, desenvolvi mecanismos analíticos que me dispensam de cair nas categorias de intuitivo, ou de médium (embora respeite e no fundo talvez tenha um pouco de ambos). Sempre busquei fugir daquilo que só eu podia ter acesso, ou só eu sabia, tendo de esperar do outro sua crença cega nos meus poderes. Meu negócio era matar a cobra e mostrar o pau.
Eu trabalho no plano do "irracional" com o máximo de Razão possível, pelo menos busco a verossimilhança.
A Numerologia Aplicada e os conhecimentos das mecânicas da Linha do tempo, permitiram que desenvolvesse alguns mapas onde pudesse ver e localizar a vida do indivíduo em sua temporalidade atemporal.
Pois bem, voltando às minhas próprias perguntas, carregadas de crítica severa: "Como consigo localizar um Espírito Velho"? E qual é a serventia de saber disso?"
Características de um espírito velho
Um Espírito Velho se caracteriza no indivíduo por vários fatores: Sua postura mais conservadora, maiores dificuldades em ser cooptado pelos vícios mundanos e/ou sensoriais, pelas armadilhas da juventude (essas insensatezes que fazemos quando jovens e que às vezes deixam marcas pelo resto de nossas vidas), pela intensidade (e ao mesmo tempo fugacidade) de nossos desejos e, principalmente, pelo seu inventário de perdas!
Em todas essas circunstâncias existe a presença do Nº 9!
Atendi recentemente uma mulher que perdeu o marido (que por sinal era meu cliente e por quem eu nutria imensa admiração) e fiz uma análise Numerológica Familiar: Seus dois filhos pequenos, tinham um 9 em posição proeminente! Além desse fato, a sua maturidade e generosidade diante de tamanha perda, me autorizou a dizer-lhe: "Seus filhos são espíritos velhos!"
O que quer dizer isso? Por que se diz isso a alguém?
Em primeiro lugar para tentar contextualizar a história de família. Às vezes nesses casos a mãe vai virar filha, e sabendo que no currículo dos "espíritos velhos" existem perdas dolorosas, para acentuar o programa do desapego, fica mais fácil entender (e aceitar) o enredo da trama.
Desapego, essa é a chave secreta desses Espiritos Velhos. Sua trajetória é longa, caminharam bastante pelas areias do tempo, mas ainda não se formaram, ainda estão apegados à "universidade". Escolhem (esse é o termo certo para eles) virem experienciar o amor e a perda, para se testar na difícil arte do desapego. Sabem que esse é o teste final. Sabem que são capazes de amar como nenhum outro e sabem também que essa capacidade é seu céu e seu inferno, sua armadilha Cármica!
Amar sem apego, essa é a derradeira lição, a prova de fogo. Era isso que Jesus tentava dizer com "larguem tudo, família etc e me sigam." Mas se me seguirem estão seguindo um "fantasma", o inefável: "O reino do meu pai não é deste mundo".
Saber que existe um espírito velho preso dentro de um corpo de criança pode ser útil para ajudar essa criança e, a esse espírito, a seguir nessa jornada nem sempre confortável. Imagine como deve se sentir um ancião de cem anos trancafiado no corpo de um jovem, presunçoso, cheio de hormônios sexuais, autoconfiante, dono da verdade, sendo sacudido de um lado para o outro nos embalos de sábado à noite?
Por outro lado imagine para esse jovem conviver com uma caverna escura e misteriosa dentro de si, da qual ele terá lampejos ao longo de sua juventude e que irá tirar dele, coisas muito valiosas para seus valores. Não é nada fácil!
Imagine para esse jovem, de repente, começar a sentir nojo de carne vermelha numa família de churrasqueiros?
Detectar precocemente um espírito velho pode fazer a diferença, da mesma forma que detectar cedo uma doença pode contribuir para que o paciente viva uma vida com mais qualidade e quem sabe livre dos efeitos dessa doença. Não estou dizendo que ser um espírito velho é algo comparável a uma doença, mas pode ser dependendo do contexto.
Se encontro esse fator "espírito velho" numa criança, posso orientar os pais a agirem de forma mais "espiritual" diante desses filhos, a aceitarem suas necessidades de silêncio e de reclusão. Posso diminuir a estranheza desses pais quando o filho resolve doar seus brinquedos mais caros às crianças pobres, ou trocar sua ida a Disney a uma férias no Hospital do Câncer para brincar com crianças doentes.
Conheci um pai (machão) amoroso e preocupado com a (ausência de) vida sexual do filho adolescente que o levou a um prostíbulo para ser devidamente iniciado. Ele não imaginava que seu filho era um autêntico 9 e que esse retardo em enfiar o pé na jaca da sexualidade é comum para essa estirpe de seres. Será que isso causou um choque nessa criança/velha?
Houve tempo em que olhava para os olhos das crianças para tentar ver ali a sua idade espiritual. Hoje não faço mais isso; faço contas, e naturalmente quando já é possível, observo o histórico de vida.
Constatar que se trata de um espírito velho, gera (ou deveria gerar) outra pergunta: E daí?
Alguns de conhecimento mais raso, dizem: "Essa será a última encarnação dele". Ouvir isso às vezes me revolta. É uma bobagem tão grande e nada acrescenta de útil a pessoa ou aos seus pais.
Espíritos velhos podem ainda vir várias, muitas vezes… como são velhos caminham devagar, sem afobação e, paradoxalmente, têm dificuldade de largar o osso.
Saber que estamos diante de um desses veneráveis exemplares tem de servir para ajustar o foco de nosso tratamento. Temos de compreender seu ritmo, seu timing, suas prioridades e seus valores.
Muitos se rebelam contra sua solidão, que eles mesmos colocaram na lista para trazer na bagagem, se arrependem no meio da viagem, não imaginavam que seria tão duro. Este é realmente um teste duríssimo: a solidão numa sociedade que exalta o "Amor", as celebrações grupais, a família etc.
O nº 9 optou por retirar-se para o deserto para ali enfrentar seus demônios: matar ou morrer.
Mas arrepender-se também faz parte do pacote. Por isso, não tem essa de "é a última vez que ele ou ela vai encarnar", o caminho é longo, a estrada é deserta, o resto vocês já sabem.
Quando vejo um bando de crianças brincando e uma num canto lendo, ou penas sentada olhando os outros, ou ainda tentando atabalhoadamente se integrar no grupo mas totalmente desajeitada, sei que posso estar diante de um ancião. Quando tento me aproximar, o faço de forma sinuosa, oblíqua, quase como agente secreto. Mas logo encontro as teclas certas e começo a digitar com a criança que carrega a caverna do velho de longas barbas dentro de si.
Um dia essa criança poderá estar acolhendo em seu peito as lágrimas de alguém, estendendo a mão para resgatar um afogado, ouvindo uma confissão desesperada, derramando uma furtiva lágrima de compaixão pela perda de alguém – sendo solidário – porque, afinal de contas, de perdas ele entende… é só olhar no seu currículo de vida, está tudo lá.
Só quem guarda tantas cicatrizes, pode olhar com respeito e admiração as cicatrizes alheias. Isso o nº9 com seus cabelos brancos do pó das estrelas sabe muito bem.
Por isso me detenho com mais cuidado diante desses espíritos quando os encontro pela frente. Eles precisam de ajuda altamente especializada, para chegarem da melhor forma possível, ao seu status de guias da humanidade. Mas até lá talvez tenham de travar uma luta de foice no escuro com seus próprios outros eus, contra as tentações que eles, mais que qualquer outro tipo humano, irão enfrentar e contra nosso mundo de dura aspereza, materialismo beócio e insensibilidade.
O nº 9 não é um espírito superior, é apenas velho, curtido pelo muito chão que impregnou seus passos. É alguém que decidiu um dia combater o mais temido dos inimigos – O AP(EGO)!