por Dukce Magalhães
Uma jornada é o espaço compreendido entre o lugar em que começamos e o destino aonde chegamos. A jornada por si mesma não diz nada, não aponta caminhos, não interfere nos rumos, não caracteriza nenhum tipo de atitude, nem define qualquer resultado.
Quem faz tudo isso é o caminhante. Dor ou amor, esperança ou melancolia, são formas de caminhar. Cada passada é a definição de todo o rumo, e vai modificando a própria estrada. Os cenários do caminho são influenciados pelo olhar do caminhante, que por sua vez é orientado pelos passos dados.
Um olhar que é guiado pelos pés e não o contrário, como usamos acreditar. É na experimentação do caminho que moldamos o olhar. Esteja atento caminhante à sua forma de caminhar, pois é isso que vai ficar de toda jornada cumprida.
Onde alguns veem obstáculos, outros percebem pontos elevados de observação. Um caminho torto, cheio de desvios, com longas curvas e voltas sem fim, pode ser experimentado como uma grande aventura por novos cenários.
Nada está errado, tudo que se apresenta no caminho é o certo. O caminhante é que pode resistir ao caminho por suas próprias expectativas de viagem. Nenhum dos buracos da estrada é casual, nenhuma pedra está fora do lugar e nenhum campo flori em vão. Tudo é exatamente como deve ser.
Quem atribui valor ou julga o erro é a consciência daquele que percorre o caminho. Nenhuma de nossas escolhas ficará impune, pois tudo vai agregar experiência e expandir a consciência que passa a observar mais sabiamente. É o que costumamos chamar de maturidade.
Vivenciar o processo da maturidade exige caminhar, seja qual for a estrada que se apresenta à nossa frente. Ao invés de reclamar da estrada, deveríamos explorar seus atributos, conhecer suas atrações e experimentar seus segredos.
Não importa quantos estejam trilhando a mesma estrada, pois cada caminhante vai experimentá-la de uma forma particular, que faz de cada estrada percorrida algo único, inédito e incomunicável. Sim, é possível contar como foi a jornada, mas não será possível comunicar a experiência interior que o caminho provê, pois isso é o inominável, o intraduzível, que só pode ser percebido pelos sentidos mais sutis que se apresentam a cada vivência.
O caminho é o campo decisório da vida. Por vezes olhamos a estrada em dúvida, sem saber para que direção ir, desconhecendo a que destino queremos chegar. É nesses momentos que precisamos voltar nosso olhar para a direção interior. Caminhar em dúvida é ir sempre na direção contrária, pois só há uma direção possível na dúvida, que é seguir em direção a si mesmo.
Ao reconhecermos os anseios de nossa alma, a trilha se abre, o caminho se ilumina. Mas, talvez, ainda não estejamos seguros. Pode não haver mais dúvida, porém a incerteza pode estar presente. A diferença entre dúvida e incerteza é que na primeira situação não sabemos o que fazer e na segunda sabemos, contudo não estamos convictos de qual é a forma mais certa de fazê-lo.
A incerteza precede toda experiência completamente nova. Portanto, a incerteza é um sintoma da mudança de rumos que a estrada está tomando e isso é sempre um progresso. Como nada está errado no caminho, o caminhante só pode estar incerto de suas próprias passadas. Com que andar trilhar o caminho? Pode ser um andar cuidadoso, arrojado, lépido, pesado, temeroso, destemido, há mil formas de caminhar e para cada escolha de passada é criado um caminho.
Percorremos a estrada que criamos com nossas escolhas e ela será sempre certa. Porém, se almejamos percorrer a estrada mais próspera, mais enriquecedora e mais feliz, é preciso tomar desvios, ir por trilhas inexploradas, mudar os passos para alterar a estrada. Pois, se na estrada que temos percorrido não está tudo que almejamos, se não mudarmos de estrada, vamos continuar vivenciando a mesma experiência de caminho.
Na medida em que experimentamos novidades da estrada, acrescentamos trilhas, cenários, vivências, sem perder nada do caminho já percorrido. Pode haver desvios, mas não há retrocessos. Podemos até caminhar em círculos, para aprender a enxergar o que ainda não vimos, mas não será nunca a mesma estrada, pois o caminhante se transforma a cada passo e cria o caminho a cada passada.
E é a partir dessa jornada venturosamente nova que o caminhante vai ganhando o desfrute da certeza. Reconhecer que o caminho em que nos encontramos é o certo, foi feito para nós, por nós mesmos, é o estado da certeza que nos mobiliza a caminhar com maior confiança e a escolher o caminho, pois definimos conscientemente como caminhar.
Quando é que a certeza se transforma em certeza absoluta? Qual a diferença entre estes dois estados de convicção? Certeza é acreditar no caminho, é se dar conta que tudo é o certo. O absoluto é o estado que vem depois de percorrer determinado trecho da estrada. É absoluto porque já está integrado ao ser que caminha. Neste momento caminho e caminhante tornam-se um só. Não há separação e os véus ilusórios se dissolvem. Deste ponto em diante já não é mais uma questão de escolher a estrada, mas de definir em que mundo vamos colocar nossos caminhos.