por Roberto Goldkorn
Recentemente o mundo ficou chocado ao descobrir que o avião de uma linha área alemã foi jogado ao solo intencionalmente por um copiloto psicologicamente disfuncional. Por todo canto começaram a surgir descobertas de que o copiloto Andreas Lubitz sofria de transtornos como "depressão" e que já tinha sido diagnosticado, embora tenha ocultado tais diagnósticos.
Muitos experts" mundo afora começaram a dar pitacos sobre depressão e suas variáveis.
Psiquiatras, psicólogos, sociólogos, e até filósofos de esquina emitiram seus pareceres diante do trauma das 150 mortes de inocentes causadas por um "depressivo suicida que não queria morrer sozinho."
Não vou negar que essa tragédia também me deixou perplexo e desamparado, o que se agrava com o fato de estar lidando ao longo da minha vida com clientes e amigos vítimas de depressão na maioria das vezes não diagnosticada.
Hoje estou convencido da opinião dos maiores especialistas de que a depressão como doença é uma questão da química do CÉREBRO em desalinho. Mas também acredito que não seja só isso, da mesma forma que acredito que a depressão por si só tenha sido a motivadora do ato insano do copiloto alemão.
Um jornalista disse furibundo que "todo depressivo é antes de qualquer coisa um frustrado", isso é uma meia-verdade que como tal pode ser mais perniciosa que uma mentira inteira. A frustração pode ser um dos gatilhos para o desarranjo da química neural, mas nunca o único e nem mesmo o mais forte.
Não me proponho a discutir aqui de forma leviana e superficial um tema de altíssima complexidade e que precisa ser enfrentado por uma abordagem multidisciplinar invadindo áreas que fazem tremer de horror mentalidades cientificistas como a espiritualidade.
Mas na busca de entendimento, dei de frente com um texto brilhante que pode nos ajudar a pelo menos, achar o começo da meada para desenrolar esse assunto tão grave e de interesse de tanta gente.
O texto a que me refiro é do meu "guru" Erich Fromm, em seu livro maravilhoso e raro O Medo à Liberdade (Zahar editores):
"… a necessidade de relacionar-se com o mundo exterior a si próprio, a necessidade de evitar a solidão. Sentir-se completamente sozinho e isolado conduz à desintegração mental, tal e qual a fome física conduz à morte. Esse relacionamento com os outros não quer dizer contato físico. Um indivíduo pode ficar só na acepção material, por muitos anos, e ainda assim estar conectado com ideias, valores, ou pelo menos padrões sociais que lhe dão um sentimento de comunhão e de 'relacionamento'. No entanto, ele pode viver entre gente e ainda assim estar possuído de um sentimento de isolamento absoluto, que pode resultar, uma vez transposto, a um certo limite, num estado de insanidade exibido nos distúrbios esquizofrênicos. Essa falta de relacionamento com valores, padrões e símbolos pode ser chamada de solidão moral. Ela é tão intolerável quanto a solidão física, ou melhor, a solidão física só se torna intolerável, quando implica também em solidão moral."
Ora uma das características de alguns tipos de depressão é criar um cordão de isolamento moral entre o sujeito e o resto do mundo, dando lhe a nítida sensação de que todos à sua volta se tornaram "podres" ou contaminados por algum vírus maldito do qual só ele está a salvo. Assim mesmo que exista alguém disposto a amá-lo, ele não terá como receber esse amor "contaminado", mesmo que alguém queira abraçá-lo, ele se sentirá sufocado pelo abraço alienígena, sua impotência moral/emocional pode corroer seu senso de pertencimento, de humanidade e assim descolado do todo social/humano ele não mais se reconhece parte desse todo humano. Claro que isso só acontece em estágios mais agudos e avançados da doença e quando ela está consorciada com outras mazelas mentais ou comportamentais.
Na imensa maioria dos casos os indivíduos ainda são capazes de buscar e aceitar ajuda que pode ser extremante efetiva, e deixar esse momento apenas no baú de lembranças tristes por um lado e alegres pela superação por outro.
Com o advento do diagnóstico e dos gatilhos sociais, o mercado da depressão cresceu imensamente e isso, levou a criação de drogas do bem, eficientes que hoje estão ao alcance da maioria dos afetados.
Porém voltando ao texto do Erich Fromm, ínsito na tecla de que a solidão e isolamento (percepção de) moral podem e devem ser combatidas preventivamente com a mudança ou a agregação de um novo/velho olhar: o espírito! Lembro-me da minha mãe cantando uma "cantiga" que ela ouvia de sua avó, em momentos e que eu me sentia sozinho e com medo (as duas coisas andam juntas). O refrão é mais ou menos assim: "Quem anda com Deus não tem medo de assombração, eu ando com Jesus Cristo no meu coração". Eu me sentia imediatamente confortado e protegido. Embora o tempo tenha me afastado da religião dela, acabou me aproximando da espiritualidade e embora os referenciais não sejam os mesmos, é esse olhar para o mundo espiritual que tem me protegido das assombrações da depressão e de outros fantasmas que apavoram os humanos atuais.
A visão para o alto, pode (juntamente com os remedinhos dos psiquiatras) ajudar a afastar essas assombrações filhas do medo, da escura caverna da solidão e da irrelevância.
Sem querer ser puxa-saco dos meus gurus, termino com o conselho mais sábio que recebi de um deles o Professor Molinero: "O diabo se alimenta do medo, os deuses da oração." Façam bom proveito.